Por Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) - O Ministério da Economia analisa efetiva limitação do salário do funcionalismo público ao teto constitucional, de 39,2 mil reais, mas a medida sozinha é insuficiente para bancar o Renda Cidadã, novo programa de transferência de renda que o presidente Jair Bolsonaro quer implementar em substituição ao Bolsa Família.
Segundo uma fonte da equipe do ministro Paulo Guedes, a eliminação dos penduricalhos associados ao chamado extrateto faria a União ter um espaço de 2 bilhões de reais a mais para gastar no programa --valor considerado relevante, mas mais pelo seu efeito moral.
Outras medidas aventadas pela equipe econômica para impulsionar o Renda Cidadã via corte de despesas propunham a canalização de recursos hoje destinados a programas considerados pouco eficientes, como o abono salarial e o seguro-defeso.
Mas Bolsonaro vetou as investidas sob o argumento de que não poderia tirar dos pobres para dar aos paupérrimos.
De acordo com a fonte, que tem conhecimento direto do assunto, um cardápio de medidas segue à mesa, incluindo limitações ao abono salarial, já que sua extinção foi vetada.
Ao custo anual de cerca de 19 bilhões de reais, o abono consiste no pagamento de um salário mínimo a cada ano aos trabalhadores formais que ganham até dois salários mínimos, funcionando como uma espécie de 14º na suplementação de renda.
Na reforma da Previdência, o governo já havia tentado direcioná-lo apenas aos que ganham um salário mínimo, mas a proposta não prosperou entre os parlamentares.
Iniciativas pelo lado da receita também foram levantadas dentro do ministério, incluindo o uso de recursos hoje estacionados em fundos públicos e a venda de estatais, disse a fonte. Contudo, para que haja respeito ao teto é necessário que a solução para o Renda Cidadã passe pelo corte de despesas, acrescentou.
Como o projeto orçamentário do próximo ano foi enviado ao Congresso sem margem de sobra em relação ao teto, para o mecanismo seguir de pé novas despesas só podem ser feitas se outras forem cortadas. Não basta, portanto, que o governo identifique fontes de receita para o Renda Cidadã, é preciso também atacar a questão pelo lado dos gastos.
Para o ano que vem, o governo considerou em seu projeto orçamentário um aumento de 5,373 bilhões de reais para o Bolsa Família na comparação com o Orçamento de 2020, a um total de 34,858 bilhões de reais. Cerca de 15,2 milhões de famílias devem ser elegíveis ao recebimento do benefício, contra 13,2 milhões em 2020.
Mas Bolsonaro já ressaltou o desejo de ampliar o universo de beneficiários em cerca de mais 8 milhões, na esteira dos danos à economia deixados pela crise de coronavírus e também atento aos dividendos políticos que o auxílio emergencial lhe rendeu.
Desenhado como uma medida emergencial por conta da pandemia, o auxílio terá um custo total de 321 bilhões de reais até dezembro, beneficiando mais de 60 milhões de pessoas por mês.
Nesta segunda-feira, o senador Marcio Bittar (MDB-AC) afirmou que a ideia do governo é apresentar na quarta-feira pela manhã a solução para o financiamento ao Renda Cidadã, ressaltando que a proposta respeitará o teto.
O senador, que é relator do Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2021 no Congresso e da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Pacto Federativo, havia divulgado na semana passada --acompanhado do presidente, de Guedes e outros ministros-- que o programa seria bancado pela limitação ao pagamento de precatórios pela União e pelo direcionamento de recursos de parte do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica).
As saídas foram duramente criticadas por agentes econômicos e mexeram com o mercado, suscitando questionamentos acerca da falta de sustentabilidade de uma solução envolvendo rolagem de dívida obrigatória, no caso dos precatórios, e de drible ao teto de gastos, no caso do Fundeb.