Por Bernardo Caram
BRASÍLIA (Reuters) -O governo vem adiando a apresentação da Medida Provisória para regulamentar e tributar as apostas esportivas online, o que também atrasa a entrada em vigor de ações de combate a fraudes no setor, em meio a um escândalo envolvendo suspeita de manipulação de resultados no futebol brasileiro.
Apenas após a publicação da MP o governo passará a editar normas específicas para coibir manipulações. Repasses de recursos para iniciativas de enfrentamento às fraudes também dependem da entrada em vigor do texto.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou no início de março que o governo editaria a medida para tributar jogos de aposta na internet e regulamentar o setor. Duas semanas depois, ele previu o envio da MP ao Congresso no início de abril.
Linhas gerais do texto chegaram a ser apresentadas pela Fazenda a deputados, mas não houve formalização. No início de maio, Haddad informou que a medida havia sido remetida à Casa Civil, a quem cabe fazer a publicação, e passou a estimar que o envio ao Congresso ocorreria após o retorno do presidente Luiz Inácio Lula da Silva da viagem à Inglaterra.
O Ministério da Fazenda disse em nota nesta quinta-feira que a MP já estava na Casa Civil, mas depois reformulou a afirmação para apontar que o texto foi encaminhado aos cinco ministérios coautores da iniciativa, que ainda farão avaliação dos dispositivos para depois enviar a medida à Casa Civil.
A nota afirma que o governo está “finalizando” o texto, sem especificar prazo de envio.
A pasta disse que a medida vai garantir mais confiança e segurança aos apostadores “graças à transparência das regras e à fiscalização”, acrescentando que os ministérios poderão editar portarias para criar mecanismos que coíbam casos de manipulação de resultados.
De acordo com o ministério, 2,55% dessa arrecadação serão destinados ao Fundo Nacional de Segurança Pública para ações de combate à manipulação de resultados, à lavagem de dinheiro e outros atos de natureza penal. Serão destinados ainda 0,82% para a educação básica, 1,63% para os clubes esportivos, 10% à seguridade social e 1% para o Ministério dos Esportes.
Na nota desta quinta-feira, a Fazenda também informou que empresas de apostas online serão taxadas em 16% da receita líquida dos jogos, ante 15% previstos anteriormente. Essa alíquota, a ser incluída na MP, incidirá sobre o “gross gaming revenue”, receita obtida com todos os jogos feitos, subtraídos os prêmios pagos aos jogadores.
Quando ainda previa uma cobrança de 15%, a pasta estimava que o ganho anual de arrecadação com a medida poderia superar 12 bilhões de reais.
Para os apostadores, a cobrança sobre os prêmios é de 30% de Imposto de Renda, excluído o valor correspondente à faixa de isenção existente hoje no tributo.
Segundo a Fazenda, será criada uma secretaria dentro da estrutura da pasta, que será responsável pela análise de documentos e aprovação do credenciamento das empresas no país. Companhias não habilitadas serão classificadas como ilegais e estarão proibidas de realizar qualquer tipo de publicidade.
Com a legalização das apostas esportivas a partir de 2018, o setor cresceu em popularidade no Brasil, com empresas assumindo patrocínio de clubes esportivos, além de veicularem publicidade em canais de TV e redes sociais de influenciadores digitais -- tudo em meio a um vácuo de regulamentação.
SETE JOGADORES INDICIADOS
O boom agora vai estar sob holofotes por ser alvo de inquérito da Polícia Federal, que vai apurar o suposto esquema de manipulação para beneficiar apostadores revelado pelo Ministério Público de Goiás, que indiciou 16 pessoas, incluindo sete jogadores profissionais. O órgão disse que os supostos crimes ocorreram em 13 partidas, incluindo oito do Campeonato Brasileiro de 2022. Jogadores de clubes como Santos, Juventude e Cuiabá estão entre os acusados.
Nos documentos, os promotores alegaram que uma quadrilha criminosa pagou jogadores para cometer infrações. O grupo então apostava nesses jogos e ganhava pagamentos quando as manipulações ocorriam.
O presidente do Instituto Brasileiro Jogo Legal, Magnho José, afirma que que quanto mais o país demorar a regular o setor mais problemas o governo enfrentará. Ele defende que as empresas suspendam as apostas ligadas a condutas individuais de jogadores até que haja regras e maturidade suficiente do mercado.
“As casas de apostas deveriam dar uma resposta e tirar da grade de ofertas as opções de apostas em escanteios, laterais, cartões amarelos e vermelhos e pênaltis para evitar a conduta individualizada e minimizar as possibilidades de fraude e manipulações”, disse.
(Por Bernardo Caram; edição de Isabel Versiani e Flávia Marreiro)