SÃO PAULO (Reuters) -O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse nesta quinta-feira que a decisão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de acabar com a isenção para encomendas internacionais de até 50 dólares visa garantir isonomia na concorrência entre as varejistas brasileiras e empresas de fora do país.
Em entrevista à GloboNews em Xangai, onde acompanha Lula em visita oficial à China, o ministro afirmou que há muita confusão e desinformação em relação à medida e que há reclamações de companhias brasileiras sobre o que veem como "concorrência desleal", principalmente por parte de varejistas chinesas que vendem para o Brasil via internet.
"Eu tenho visto muita confusão e muita desinformação... o que está se reclamando por parte de algumas empresas é que está havendo uma espécie de concorrência desleal por parte de alguns sites, não de todos", disse Haddad à emissora.
"Então isso está sendo investigado e pode ser coibido. O melhor que pode acontecer para o consumidor e para a economia brasileira é uma isonomia na concorrência. Você tem que ter igualdade de condições de concorrência. Quando isso não tem, prejudica muito a economia", afirmou.
A decisão do governo de acabar com a isenção de encomendas internacionais de até 50 dólares, parte de um esforço para taxar compras feitas em grandes varejistas internacionais, gerou uma onda de críticas e reações nas redes sociais no Brasil.
"NÃO CONHEÇO A SHEIN"
Embora companhias chinesas tenham crescido em popularidade no Brasil, o ministro tem afirmado que a iniciativa não tem foco em empresas específicas.
"Vocês falam da Shein como se eu conhecesse. Eu não conheço a Shein. Único portal que eu conheço é o da Amazon (NASDAQ:AMZN), eu compro um livro todo dia, pelo menos", disse Haddad nesta quinta a jornalistas.
Segundo a Receita Federal, a isenção se aplica "para envios de pessoa física para pessoa física, mas vem sendo amplamente utilizado de forma fraudulenta, para vendas realizadas por empresas estrangeiras".
Em entrevista ao podcast O Assunto, do G1, o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, enfatizou que não haverá nenhum tipo de criação de novo imposto. "O que há, sim, é uma fiscalização e mudança nesse benefício que existia e era usado de maneira irregular", disse ele.
Galípolo falou ainda sobre a intenção de ser publicada uma Medida Provisória para tratar do assunto, o que foi confirmado pela assessoria da pasta.
"Virá uma MP que vai dar mais instrumentos para o processo de fiscalização, e virá uma MP para fechar esse tipo de possibilidade de que se está utilizando hoje como subterfúgio, que é emular como se fosse uma remessa de uma pessoa física para outra pessoa física", disse ele.
Em nova entrevista, Galípolo disse à Globonews que a estimativa de arrecadação do governo com essa medida, de 8 bilhões de reais por ano, já leva em consideração uma possível redução no fluxo de compras por brasileiros em sites estrangeiros.
Perguntando sobre outras frentes de atuação e uma possível medida para tributar grandes empresas de tecnologia, o secretário afirmou que a Fazenda não chegou a anunciar o que pensa nessa área e ressaltou que vai dialogar com o setor e apresentar as conclusões à sociedade.
DÓLAR
Na entrevista, antes de embarcar com Lula para Pequim onde o presidente brasileiro se reunirá com o presidente da China, Xi Jinping, na sexta-feira, Haddad reforçou a defesa feita por Lula mais cedo de um comércio que não passe pelo dólar.
"Nós já fizemos comércio em moedas locais, por crédito recíproco, tem várias modalidades de comércio bilateral que não precisam de uma moeda de um terceiro país para acontecer", disse.
"E o presidente Lula tem o desejo de patrocinar esse tipo de comércio bilateral sem essa necessidade ou com a intermediação de uma outra moeda que faça parte de um bloco de países que estão comercializando muito hoje... vamos pensar em comércio bilateral com moedas locais."
O ministro fez um balanço positivo da visita de Lula à China até aqui, e afirmou que há grande interesse do país asiático de investir no Brasil, em diversas áreas. Ele citou, por exemplo, os setores de telecomunicações e automotivo e o interesse chinês em obras de infraestrutura no Pará e na Bahia.
"Há um desejo muito grande da China investir no Brasil em todas as áreas. Nós tivemos reuniões com empresas voltadas para a infraestrutura... empresas voltadas para comunicação... empresas voltadas para o ramo automobilístico, em especial a questão do carro elétrico", elencou.
Na segunda parte da viagem de Lula ao país asiático, em Pequim, Haddad afirmou que haverá "novidades" em tema como a geopolítica mundial e a busca pela paz.
A China é uma das principais aliadas da Rússia e tem defendido negociações de paz para colocar fim à guerra na Ucrânia, invadida em fevereiro do ano passado por tropas russas. Lula, por sua vez, tem defendido que um grupo de países, que inclua a China, busque intermediar conversas de paz.
(Por Eduardo Simões, Fernando Cardoso e Camila Moreira em São Paulo, Bernardo Caram em Brasília, edição de Alberto Alerigi Jr.)