Por Marcela Ayres e Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - O governo encaminhou ao Congresso nesta terça-feira sua aguardada proposta de reforma tributária, que contempla a união de PIS e Cofins em um único imposto sobre valor agregado (IVA), a chamada Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), cuja alíquota proposta é de 12%.
O projeto de lei, contudo, manteve regimes diferenciados para uma série de situações. De um lado, itens da cesta básica continuaram com desoneração, na contramão de sinalização que já havia sido dada pelo Ministério da Economia em diversas ocasiões. Também permanecem como são hoje as regras para o Simples Nacional, para a Zona Franca de Manaus e para o regime agrícola.
Ficarão isentas da CBS a venda de imóveis residenciais para pessoas físicas, as receitas decorrentes da prestação de serviços de transporte público coletivo e as operações de cooperativas. Além disso, entidades financeiras vão manter a forma de apuração antiga com alíquota de 5,8%.
Em coletiva de imprensa, a assessora especial do ministro da Economia, Vanessa Rahal Canado, afirmou que o governo não desistiu de reonerar a cesta básica, mas que retomará o tema no Renda Brasil, programa de transferência de renda que substituirá o Bolsa Família.
Ela também defendeu que a manutenção de alguns regimes deu-se por questões técnicas ou constitucionais.
Após a entrega do texto aos presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o ministro da Economia, Paulo Guedes, ressaltou que o projeto de lei representa apenas a parte inicial do plano do governo.
"Em vez de mandarmos uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição), mandamos propostas que podem então ser trabalhadas e acopladas", disse Guedes. "Mas mandaremos todas: Imposto de Renda, dividendos, os impostos indiretos, IPI, todos os impostos serão abordados", acrescentou.
O Ministério da Economia sinalizou que os próximos passos da reformulação tributária vão incluir, para o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), uma simplificação e alinhamento ao chamado "excise tax" (imposto seletivo).
Para o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e Pessoa Física (IRPF), haverá redução da tributação sobre empresas e a tributação de dividendos "para menos pejotização e mais investimento".
O ministério ainda indicou, em uma apresentação, mais uma peça da reforma envolvendo a desoneração da folha de salários "para redução do custo de trabalho formal".
O secretário especial da Receita Federal, José Tostes Neto, estimou que entre 20 e 30 dias o governo encaminhará uma ou mais partes restantes da reforma.
"Esperamos concluir nesse período a preparação desses outros pontos", respondeu ele, ao ser questionado sobre como a desoneração da folha seria financiada.
Segundo a pasta, começar a reforma tributária pela extinção do PIS/Cofins mira dar um fim à enorme complexidade que hoje envolve os dois tributos, que acaba impulsionando disputas administrativas e brigas judiciais.
Com a CBS, cada empresa só pagará sobre o valor que agrega ao produto ou ao serviço. O ministério afirmou que a contribuição possibilitará a redução de 52 para 9 campos na nota fiscal e de 70% das obrigações acessórias.
O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional) disse que a mudança proposta é "tímida, decepciona em relação à esperada simplificação e pode gerar aumento da carga tributária" no país.
“Quando se integra o que está espalhado em vários tributos, acaba o disfarce. A proposta do PIS/Cofins apenas começou a expor essa realidade”, disse Kleber Cabral, presidente da entidade. “O governo vai apanhar feito mensageiro que traz más notícias.”
Para o grupo técnico do sindicato, a reforma tributária deveria ser apresentada de forma completa. "Fragmentada, prejudica a análise e traz críticas que seriam, em tese, mitigadas com as outras partes da reforma", afirmou.
CAMINHO NO CONGRESSO
Já tramitam no Congresso propostas de simplificação tributária que também envolvem a criação de um IVA, mas com escopo mais amplo, abarcando também impostos de competência municipal e estadual. São as propostas de emenda à Constituição 45, na Câmara, e 110, do Senado, sendo esta última ainda mais abrangente.
Guedes disse que o governo apoia totalmente o acoplamento de impostos de competência estadual e municipal ao IVA que está propondo nesta terça-feira, embora tenha enviado ao Congresso um projeto prevendo apenas a unificação de tributos federais sobre o consumo.
O ministro defendeu que o projeto do governo não entrou em impostos de Estados e municípios em respeito à federação e ao Congresso.
Vista por muitos como a proposta com mais tempo de maturação, a PEC 45 pretende substituir os federais PIS, Cofins e IPI, além de ICMS (estadual) e ISS (municipal) por apenas um tributo sobre o consumo, com a cobrança sendo integralmente feita no destino.
Tostes, em coletiva, afirmou que se a proposta de projeto de lei for aprovada, ela não inviabiliza tramitação e aprovação das PECs. A CBS entra em vigor seis meses após a publicação da nova lei.
O projeto de lei apresentado nesta terça-feira que trata da sua criação prevê a adoção de uma alíquota uniforme nas operações em 12%, mas isenta de tributação a Zona Franca de Manaus (ZFM) e as Áreas de Livre Comércio (ALC), conforme a íntegra da proposta e a exposição de motivos encaminhada pelo governo federal ao Congresso Nacional.
A CBS, que altera a legislação tributária federal, "incidirá apenas sobre a receita decorrente do faturamento empresarial, ou seja, sobre as operações realizadas com bens e serviços em sentido amplo", segundo a exposição de motivos.
Dessa forma, haverá apuração de forma não cumulativa, superando a controvérsia da tributação incidente da legislação atual, de 1998.
"Em virtude da delimitação da receita sobre a qual incidirá a CBS, pôde-se simplificar enormemente a legislação anterior, pois se tornou desnecessária a especificação de situações em que pessoas jurídicas ou receitas estariam isentas ou não tributadas, cujo objetivo era precisar o amplo conceito de receita", disse o documento.
Na Zona Franca de Manaus e nas áreas de livre comércio, embora a venda não seja tributada, "será permitida a apropriação de créditos da CBS, quais sejam exportações", uma vez que "é desejável sua desoneração completa, e vendas para ZFM e ALC, porque são equiparadas a exportações para diversos efeitos em decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça".
O documento destacou ainda que a nova contribuição "não objetiva gerar aumento de arrecadação em relação aos níveis atuais".
Para importação de bens e serviços por fornecedores estrangeiros e plataformas digitais, a CBS deverá ser recolhida pelo importador.
Na importação feita por pessoa física, os fornecedores estrangeiros e plataformas digitais vão ficar responsáveis pelo recolhimento, precisando fazer um cadastro online simplificado na Receita Federal.
(Com reportagem adicional de Gabriel Ponte)