Por Bernardo Caram
BRASÍLIA (Reuters) - O Ministério da Fazenda mapeou e acompanha com preocupação o lobby de uma série de setores que buscam tratamento favorecido na reforma tributária do consumo, especialmente advogados, agências de viagem e empresas de aviação, locação de veículos e saneamento, relataram à Reuters duas fontes da pasta que acompanham de perto as negociações, reconhecendo dificuldade em limar outras exceções já inseridas no texto anteriormente.
A equipe econômica argumenta que a ampliação de benefícios setoriais forçará um aumento na alíquota geral do novo imposto sobre valor agregado (IVA) que substituirá os atuais tributos sobre bens e serviços, algo que, além de ser indesejável, entra em rota de colisão com a ideia propagada no Senado de criar um teto para a cobrança do tributo, plano também combatido pela Fazenda.
Ao aprovar a proposta em julho, a Câmara incluiu no texto setores que terão um desconto de 60% sobre o valor da alíquota geral do novo imposto, como saúde, educação, agropecuária, e transporte coletivo. Também foram criados regimes favorecidos que serão regulamentados posteriormente, incluindo hotelaria, aviação regional, parques de diversão, bares e restaurantes.
Após a Câmara abrir a porta para as exceções, novos setores passaram a pressionar o relator da proposta no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), sob o argumento de que querem tratamento isonômico para empresas correlatas, segundo as fontes.
Agências de viagem e companhias de locação de veículos, por exemplo, tentam entrar no regime favorecido criado pela Câmara para hotéis e parques. Empresas de aviação comercial em geral, por sua vez, buscam o tratamento diferenciado da área de aviação regional ou a alíquota reduzida do setor de transportes.
Outra preocupação, segundo os relatos, são os advogados, que lideram grupo de profissionais liberais em busca de tratamento favorecido na reforma. De acordo com uma das fontes, a categoria demanda acompanhamento especial por ter trânsito livre com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que é advogado. Procurado, Pacheco não respondeu de imediato.
As companhias de água e saneamento, que hoje são isentas da cobrança do Imposto sobre Serviços (ISS), argumentam que serão prejudicadas pela reforma e também tentam, de acordo com as fontes, entrar em uma exceção.
Desde que chegou ao Senado, a proposta de reforma tributária recebeu mais de 100 emendas de senadores com sugestões de mudança no texto, incluindo as novas exceções, o teto de alíquota e até uma desoneração de folha salarial que, para uma das fontes, tornaria a alíquota geral do tributo sobre o consumo inviável.
“O que o ministério da Fazenda pode fazer é ajudar o Senado a entender custos e benefícios das diferentes alternativas”, disse a segunda autoridade. “Não temos como impor algo ao Congresso.”
TETO DE COBRANÇA
Cálculos divulgados pela Fazenda após a aprovação do texto pela Câmara projetam que a alíquota do imposto, a ser definida posteriormente em lei complementar, deve ficar em 27%, contra os 25% esperados inicialmente pela pasta. A equipe econômica argumenta que o patamar aumentará ainda mais se novas exceções forem incluídas.
Nas últimas semanas, porém, Braga e Pacheco passaram a defender que a Constituição preveja um teto para a alíquota do tributo ou um limite para a carga tributária do país em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). Ainda não há definição formal sobre o tema.
Para uma das autoridades, estabelecer um teto de alíquota geraria “enorme risco fiscal”, já que a proposta prevê que o patamar exato de cobrança será definido apenas posteriormente, quando os detalhes do desenho do novo modelo já serão conhecidos.
A segunda fonte ressaltou que a proposta em tramitação já define que a alíquota será definida de modo a não mudar o volume atual de arrecadação. Ela afirmou que, se necessário, em vez de um teto de alíquota, o texto poderia deixar mais claro o patamar de carga tributária em relação ao PIB que não poderá ser ultrapassado após a reforma.
Apesar de reconhecer ser difícil o Senado retirar do texto exceções já incluídas pela Câmara, um dos técnicos afirmou que a pasta trabalha para alterar ao menos dois trechos considerados “estranhos”. O primeiro é o regime diferenciado para parques temáticos e parques de diversão, que, apesar de baixo impacto fiscal, carrega uma simbologia de favorecimento a um setor não essencial.
O segundo ponto é o dispositivo que autorizou desconto do tributo para a área de segurança. Como mostrou a Reuters, o governo acredita que uma brecha nesse trecho abre margem para que a venda de armas e outros equipamentos de segurança a compradores privados seja beneficiada.