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Programa Desenrola trava com dificuldades técnicas e indefinições com setor privado

Publicado 13.03.2023, 08:52
© Reuters. Haddad e Lula em Brasília
12/01/2023
REUTERS/Adriano Machado/File Photo

Por Bernardo Caram e Marcela Ayres

BRASÍLIA (Reuters) -Entraves nas negociações com o setor privado, dificuldades técnicas e indefinições sobre o desenho final do Desenrola, programa do governo para renegociar dívidas das famílias, atrasaram por prazo indefinido o lançamento da iniciativa, informaram à Reuters seis fontes com conhecimento do assunto.

Uma das principais promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e uma aposta para marcar os primeiros 100 dias de gestão, o Desenrola chegou a ser previsto para fevereiro e, depois, para esta semana, mas atores que participam das tratativas ainda lidam com uma lista de problemas que devem exigir um alargamento do prazo para que o mecanismo seja lançado.

A viabilização do programa, que buscará dar um alívio principalmente às famílias mais pobres em meio à escalada do endividamento que afeta 70 milhões de brasileiros, depende da estruturação de uma plataforma digital confiável que ainda será construída, disse uma fonte familiarizada com as discussões.

Quatro fontes do Ministério da Fazenda afirmaram em anonimato que ainda não há consenso entre as partes envolvidas sobre o desenho e a operação dessa plataforma. Uma delas pontuou que, dentro do programa, está previsto um leilão em bloco das dívidas, ponto "também considerado complexo" por todos.

Duas das autoridades envolvidas na elaboração da medida afirmam que não ainda há condição para lançar o Desenrola em curto prazo com a base necessária para uma renegociação ampla e simples das dívidas. Segundo elas, a Fazenda está empenhada em anunciar uma iniciativa bem estruturada, o que demanda tempo de amadurecimento.

De acordo com outra fonte a par do assunto, que pediu anonimato porque as discussões são privadas, está em debate a criação de um grupo de trabalho com representantes de governo, bancos, credores e birôs de crédito para aparar arestas do programa. Apenas após encontrar as soluções, o Desenrola poderia operar, o que, para essa fonte, deve jogá-lo apenas para o segundo semestre.

"É absolutamente primordial a gente fazer um grupo de trabalho para colocar o entendimento comum e começar um desenho do programa que faça sentido para todas as partes", disse.

"Qual seria a jornada ideal? O cliente entra em um portal? Onde fica esse portal? Como ele fica sabendo do valor que deve e para quem? Isso não está bem desenhado", acrescentou.

Procurado, o Ministério da Fazenda não respondeu de imediato. Na quinta-feira, o chefe da pasta, Fernando Haddad, não deu previsão para o lançamento e atribuiu o atraso à necessidade de desenvolver o sistema operacional.

Essa fonte afirma, no entanto, que a plataforma digital é apenas uma das questões em aberto. Em um dos pontos, segundo ela, o governo avalia estabelecer um teto de juros a ser cobrado dos devedores pelas instituições financeiras, mas o patamar ainda estaria indefinido.

DESENHO DO PROGRAMA

De acordo com uma das fontes da equipe econômica, chegou a ser avaliada uma taxa máxima de 2% ao mês para essas operações, mas o martelo não foi batido. O prazo para o pagamento das parcelas deve ser de cinco anos.

O Desenrola será dividido em duas faixas. A primeira deve atender a dívidas de até 5 mil reais de pessoas com renda de até dois salários mínimos. Esse grupo contará com cerca de 10 bilhões de reais em garantias do governo, o que dará segurança aos bancos e permitirá um patamar mais baixo de juros.

O sistema terá uma espécie de leilão. O governo deve exigir um desconto mínimo nos débitos e abrir espaço para ofertas dos credores. Aqueles que oferecerem as maiores reduções estarão aptos a refinanciar as dívidas com uso da garantia do governo. Quem perder o leilão ainda poderá fazer as renegociações, mas sem esse apoio financeiro do Tesouro.

A segunda faixa do programa não terá limite de renda ou valor para renegociação dos débitos, mas não haverá garantia com recursos públicos, o que ainda gera incerteza sobre a viabilidade das operações para as instituições financeiras, segundo o relato.

A engenharia preliminar do programa prevê que credores, como varejistas e concessionárias de água e energia elétrica, ofereçam descontos sobre as dívidas, que poderiam ser captadas pelas instituições financeiras.

Com isso, o débito seria quitado pelo banco, que passaria a cobrar do devedor, já com os valores renegociados e reduzidos. Essas condições facilitadas ainda estão sendo discutidas. Dívidas bancárias também deverão fazer parte do programa.

O governo também planeja implementar uma data de corte de dívida para participação no programa, ainda indefinida, para evitar que os indivíduos deixem de pagar suas contas atuais.

Haddad disse recentemente que, considerando o público que será amparado pelo fundo garantidor, cerca de 37 milhões de pessoas poderiam renegociar em torno de 50 bilhões de reais em dívidas.

Durante a campanha presidencial no ano passado, a equipe de Lula trabalhava preliminarmente com uma meta mais ousada, de garantir a renegociação de até 95 bilhões de reais, para consumidores com renda de até três salários mínimos.

(Edição de Isabel Versiani, Flávia Marreiro e Maria Carolina Marcello)

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