Por Bernardo Caram e Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - A proposta do governo para o novo arcabouço fiscal terá uma trava para impedir que os gastos federais cresçam mais do que a arrecadação, mas contará também com um limite mínimo para a evolução das despesas, de acordo com documento divulgado pelo Ministério da Fazenda, em regra que contará com metas flexíveis para o resultado primário.
Conforme antecipado pela Reuters, a medida estabelece que as despesas públicas não poderão crescer mais do que 70% da variação das receitas.
A regra de gasto será combinada ao mecanismo da meta de resultado primário -- alvo a ser perseguido pelo governo levando em conta a diferença entre receitas e despesas, sem considerar o gasto com juros da dívida pública.
Em uma inovação, a meta fiscal terá bandas para cumprimento, uma margem de tolerância de 0,25 ponto percentual do PIB para mais ou para menos. Caso essas bandas sejam desrespeitadas em determinado ano, haverá uma limitação mais forte para o crescimento das despesas no exercício seguinte.
Na meta existente hoje, é estabelecido um valor específico a ser cumprido, sem margem de tolerância. Se o governo identifica, ao longo do ano, que poderá descumprir esse objetivo por conta de uma frustração de receita ou aumento de gasto, é obrigado a bloquear verbas de ministérios.
Pela norma proposta, se houver descumprimento da meta, o limite de alta das despesas será reduzido para 50% do crescimento da receita no ano seguinte.
No sentido contrário, resultados primários acima do teto da banda permitirão a utilização do excedente para investimentos públicos. A apresentação do Ministério da Fazenda informa ainda que haverá um piso para investimentos públicos.
Segundo a pasta, com a nova regra haverá uma banda com crescimento real da despesa primária entre 0,6% a 2,5% ao ano em relação ao teto de gastos. Assim como em vigor atualmente, recursos para o Fundeb e o piso da enfermagem ficam excluídos dos limites.
Enquanto busca encerrar 2023 com um déficit fiscal inferior a 1% do PIB, o governo prevê que a nova âncora levará o país ao déficit zero no ano que vem e a um superávit primário de 0,5% do PIB em 2025 e de 1% do PIB em 2026.
PILAR
A apresentação de um novo conjunto de regras para guiar as contas públicas é tratada como pilar central da gestão do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que vem pregando zelo fiscal como forma de abrir caminho para uma redução dos juros no país, impulsionando a economia.
Alvo de críticas do governo por conta do nível da taxa básica de juros, hoje em 13,75% ao ano, o Banco Central ainda não deu sinal sobre quando poderá iniciar o afrouxamento monetário e enfatizou nesta semana que a simples apresentação do arcabouço não impactará diretamente a inflação, sendo necessário a materialização de uma regra fiscal sólida para que haja efeito positivo nas expectativas.
A proposta para no novo arcabouço é debatida desde a campanha eleitoral, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se posicionando contra o teto de gastos, regra em vigor desde 2017 que limita o crescimento das despesas públicas à variação da inflação -- e que foi flexibilizada uma série de vezes pela gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro.
A PEC de Transição, aprovada antes mesmo da posse de Lula para ampliar gastos neste ano, incluiu um dispositivo que determinava ao novo governo enviar ao Congresso uma proposta de arcabouço fiscal até 31 de agosto para substituir o teto.
Pressionado a dar sinais mais claros nessa área, Haddad decidiu antecipar a apresentação da proposta. Na quarta-feira, o texto chegou para avaliação final de Lula, que autorizou a divulgação da proposta.
A proposta ainda será enviada ao Congresso, onde passará por avaliação dos deputados e senadores e poderá ser modificada antes da aprovação. Haddad apresentou a proposta aos presidentes do Senado e da Câmara, assim como a lideranças partidárias, antes da divulgação oficial nesta quinta.