Se a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) emergencial já estivesse hoje em vigor, seis Estados já precisariam cortar despesas de pessoal, congelar salários e suspender novas contratações de servidores para melhor a saúde financeira das suas contas. O relatório da proposta, apresentado esta semana aos líderes do Senado, determina o acionamento automático dos gatilhos (como são chamadas as medidas de contenção de despesas) para governos regionais quando as despesas correntes superarem 95% de sua arrecadação.
O texto original enviado pelo governo deixava a aplicação como opcional, ao falar que Estados e municípios "poderiam" acionar os gatilhos nessa situação. O aperto na regra já sofre resistências e pode virar moeda de troca durante as negociações na hora da votação, como ocorreu na reforma da Previdência, que deixou Estados e municípios de fora após a pressão de senadores e deputados, que não queriam assumir o desgaste político para acabar ajudando governadores e prefeitos de legendas adversárias.
Levantamento feito a pedido do Estadão/Broadcast pela pesquisadora Vilma Pinto do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), com dados acumulados no ano até outubro (últimos disponíveis), aponta que Rio Grande do Sul, Sergipe, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro, Pernambuco e Espírito Santo seriam atingidos pela regra, caso já estivesse em vigor.
Considerando dados de 2019, o quadro seria um pouco diferente, com a regra se aplicando a sete Estados: Goiás, Minas Gerais, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Sergipe e Distrito Federal.
Segundo Vilma, as oscilações ocorrem porque a regra considera o curto prazo e tem como referência dados que dependem da atividade econômica, como a arrecadação. "Um efeito de curto prazo de um ano pode não ser um efeito perene", diz a pesquisadora do Ibre, apontada hoje como uma das principais especialistas em contas de Estados e municípios. Para fazer o levantamento com dados atualizados de 2020, Vilma utilizou o Siconfi, sistema em que os próprios Estados e municípios declaram suas informações ao Tesouro Nacional.
A PEC prevê ainda uma situação intermediária, em que Estados e municípios teriam a opção de adotar parte ou a totalidade das medidas quando a relação entre despesa e receita fique entre 85% e 95%. Essa é a situação de 16 Estados, observando dados de 2019, ou 11, considerando 2020. Nesse caso, o governador ou prefeito poderia editar ato com vigência imediata, antes da aprovação pelo Legislativo local, mas com a previsão de que esse texto seja submetido à apreciação dos parlamentares em regime de urgência.
Vilma prevê situação mais difícil em 2021 para os governos regionais, já que o desempenho do PIB deve ser insuficiente para recuperar o tombo na atividade em 2020. Além disso, não há previsão de reforço nas transferências feitas pela União, como ocorreu este ano. "A receita dos Estados em 2021 tende a ser um pouco mais enxuta", diz.
Vácuo
Depois de ser encaminhada a líderes na segunda à noite e sofrer críticas de especialistas consultados devido a problemas graves de redação, o relatório entrou numa espécie de "vácuo existencial", segundo apurou o Estadão, já que a proposta não foi protocolada oficialmente. O texto tem sofrido modificações a toda hora com interferência do Ministério da Economia, que quer reduzir o porcentual de 95% para que a medida de ajuste alcance mais Estados. A equipe econômica não fala abertamente, mas prefere deixar a votação para 2021.
Líder de uma das maiores bancadas no Senado Federal, onde a PEC emergencial está sendo debatida, o senador Otto Alencar (PSD-BA) se mostra cético em relação às chances de avanço nas discussões ainda em 2020. "Este ano não vota mais, não. Acho difícil", afirma.
O presidente do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda dos Estados e representante do Piauí, Rafael Fonteles, disse que de forma geral a PEC emergencial tem "amplo apoio" nos Estados, mas ressaltou que o parecer de Bittar ainda precisará ser analisado pelos secretários.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.