Daniela Brik.
Jerusalém, 3 maio (EFE).- O Museu do Holocausto de Jerusalém lançou uma campanha para recuperar os móveis e utensílios dos últimos sobreviventes da barbárie nazista, por ocasião do dia nacional em lembrança às vítimas do genocídio.
Sob o nome de "Recolhendo os fragmentos" a instituição, também conhecida como Yad Vashem, pretende colher documentos pessoais, diários, fotos, artefatos e trabalhos artísticos do período do Holocausto (1939-1945).
Trata-se de recuperar não só os objetos relacionados com a "Shoah" (Holocausto em hebraico), mas as histórias que jazem por trás de cada um deles e que, por enquanto, só os sobreviventes ou seus familiares conhecem.
"Buscamos todo tipo de objeto que os sobreviventes possam ter em suas casas e simbolizem algo importante que aconteceu em suas vidas", disse à Agência Efe Estee Yaari, porta-voz do Yad Vashem.
Por ocasião do dia de lembrança aos seis milhões de judeus mortos no genocídio, realizado no último domingo, o Museu do Holocausto estabeleceu um ponto de recolhimento desses artigos em suas instalações.
Seus responsáveis destacam a urgência de conseguir obter estes vestígios únicos que podem lançar luz sobre um dos períodos mais obscuros da história da humanidade.
"Há pessoas que têm objetos em casa e não tem consciência de seu valor. É importante conservar a história enquanto ainda podemos ter acesso à informação, pois conforme passa o tempo cada vez será mais difícil", ressalta a porta-voz.
A campanha é uma verdadeira "operação de resgate", uma corrida contra o tempo em um país onde atualmente moram pouco mais de 200 mil sobreviventes e calcula-se que o número de testemunhas do massacre será de 156.100 em 2014, e 47 mil em 2025.
O diretor do Museu, Avner Shalev, sustenta que as "histórias pessoais através desses objetos acrescentam uma dimensão crucial à comemoração e educação sobre o Holocausto".
No marco desta cruzada contra o esquecimento, representantes do Yad Vashem irão a várias cidades do país para estabelecer outros lugares de coleta de objetos, que se somarão aos 140 milhões de páginas de documentação e milhares de artefatos relacionados com o Holocausto com os quais conta a instituição.
Um deles é uma carta entregue recentemente por Otto Hershtick, de 90 anos e oriundo de Sighet, uma pequena localidade da Transilvânia (Romênia) onde viviam dez mil judeus, 90% dos quais morreram na "Shoah".
Na carta, à qual ele teve acesso após terminada a disputa, seu pai, mãe e suas duas irmãs lhe deixam escritas suas últimas palavras antes de se verem obrigados pelos nazistas a deixar seu lar e convencidos de que seu destino era a morte nos campos de concentração.
O texto mostra que o chefe da família, Meshulam, não pôde conter a emoção e pediu a sua filha Rajel que escrevesse em seu lugar, que o faz em húngaro e refletindo uma grande angústia e desespero perante o futuro incerto.
Finalmente, a família inteira participa da escrita, incluindo o pai que deixa suas lágrimas sobre os traços da caligrafia hebreia que usa para escrever em iídiche, o idioma dos judeus centro-europeus.
Todos os signatários foram enviados a Auschwitz, onde o pai morreu, e outros campos de concentração.
Otto conseguiu escapar das garras nazistas ao fugir de um campo de trabalhos forçados ao qual os judeus em idade de serviço militar eram enviados, e incorporar-se como partisano em uma patrulha do Exército Vermelho.
Após o fim da guerra, retornou a sua aldeia natal, onde para sua surpresa encontrou sua mãe e irmãs, assim como a empregada romena que guardava zelosamente a carta.
"Quis entregá-la ao Yad Vashem porque tenho a sensação de que a memória do Holocausto está se perdendo. Foram escritas muitas cartas, mas a maioria das pessoas nunca as leu porque não retornaram para suas casas", explica este sobrevivente.
O museu abrigou o ato que abriu o dia solene em lembrança às vítimas do Holocausto, que em Israel acontece uma semana antes da data de seu nascimento como Estado, de acordo com o calendário hebreu. EFE