Por Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - O ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal e ex-ministro da Justiça Anderson Torres transferiu, nesta terça-feira, a responsabilidade pelas falhas de segurança na capital federal que propiciaram os atos antidemocráticos de 8 de janeiro, em que apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes.
Em depoimento à CPI mista de 8 de janeiro, Torres afirmou que, mesmo sem indicação oficial de que haveria ações radicais naquele fim de semana, assinou um Protocolo de Ações Integradas (PAI) para a segurança da Esplanada na sexta-feira, dia 6 de janeiro, na condição de secretário da Segurança Pública do DF. Em seguida, viajou de férias aos Estados Unidos.
"É importante ainda lembrar que o Protocolo de Ações Integradas previa o fechamento da Esplanada dos Ministérios, e o que posso afirmar, com toda segurança, é que houve falha grave na execução do PAI. Se tivessem cumprido à risca o plano, os atos de vandalismo do dia 8 de janeiro não teriam sido consumados", declarou aos parlamentares nesta terça-feira.
"Não recebi qualquer informação sobre a possibilidade de atos violentos no dia 8. Essa viagem foi programada com antecedência, e as passagens, compradas em 21 de novembro", disse, explicando que comunicou a ausência ao governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), e ao secretário-executivo, que ficaria responsável pela pasta durante sua viagem.
Segundo ele, a secretaria não tem caráter operacional e caberia a outras instituições envolvidas no PAI, como as Polícias Civil e Militar, colorarem o plano em prática.
Ex-ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro, de quem é próximo, Torres foi preso ao retornar dos EUA no dia 14 de janeiro, acusado de omissão e conivência que teriam facilitado os ataques às sedes dos Três Poderes.
Determinada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e chancelada pelo plenário da corte, a prisão de Torres foi revogada em maio com algumas condicionantes, como, entre outras, o uso de tornozeleira eletrônica e recolhimento domiciliar noturno, razão pela qual a CPI precisa encerrar a reunião desta terça antes das 20h.
MINUTA
Em sua fala inicial à CPI, Torres aproveitou para minimizar o teor da chamada "minuta do golpe", rascunho de texto que estabelecia condições para a reversão da vitória eleitoral do agora presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao instituir um Estado de Defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O documento foi descoberto no dia 10 de janeiro, na casa do ex-secretário.
"Basta uma breve leitura para que se perceba ser imprestável para qualquer fim, uma verdadeira aberração jurídica. Esse papel não foi para o lixo por mero descuido. Não sei quem entregou esse documento apócrifo e desconheço as circunstâncias em que foi produzido", disse, acrescentando que sua intenção era descartá-lo.
A relatora da CPI mista, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), no entanto, questionou a versão de Torres de que jogaria a minuta fora.
"Mas ela não estava jogada na sua casa, ela estava guardada, ela estava bem acondicionada", disse a relatora, lembrando que segundo descrição do Ministério Público, "não se trata de documento que seria jogado fora, estando, ao invés, muito bem guardado em uma pasta do governo federal e junto a outros itens de especial singularidade, como fotos de família e imagem religiosa".
Em resposta, Torres afirmou que não encaminhou ou mostrou o documento a ninguém. Deu, ainda, outra explicação para o papel ter sido encontrado pela polícia em sua casa:
"Estava embaixo de um porta-retrato que nós temos e, por isso, ele saiu do meu criado e foi para esse porta-retrato. Provavelmente não anda alguém arrumando a casa e, por isso, não foi destruído", disse o ex-secretário, segundo as notas taquigráficas da reunião da CPI mista.