Por Lisandra Paraguassu e Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, governadores e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) caminharam juntos do Planalto até a sede do Supremo na noite desta segunda-feira para vistoriar os estragos das invasões a prédios públicos em Brasília, num gesto para simbolizar união na defesa da democracia, enquanto as autoridades ampliaram as prisões de acusados pelos ataques.
"Eles querem golpe, e golpe não vai ter", disse Lula, diante de governadores e representantes de 27 Estados e do Distrito Federal, ministros do Supremo, presidentes da Câmara e do Senado em exercício e do procurador-geral da República.
Mais de 1.500 apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro foram detidos na capital federal desde as invasões e depredações do Planalto e dos prédios do Congresso e do STF por grupos de bolsonaristas radicais que pediam um golpe militar contra o presidente.
Lula, que acusou Bolsonaro de incentivar os ataques, prometeu levar os responsáveis pelo episódio à Justiça.
"Não vamos dar tregua até descobrirmos os responsáveis. Mais cedo ou mais tarde nos vamos descobrir quem está financiado. Tem gente que financiou e tem gente que apoiou", afirmou o presidente depois da caminhada até o STF -- o mais danificado dos prédios atacados pelos bolsonaristas.
Durante a reunião, Lula subiu o tom e criticou a falta de resposta das Forças Armadas aos acampamentos de bolsonaristas que por dois meses estiveram nas portas de quartéis pelo país pedindo uma ilegal intervenção dos militares contra a sua eleição, sem um posicionamento contrário da cúpula militar.
"As pessoas estão livremente reivindicando o golpe na frente dos quartéis, e não foi feito nada por nenhum quartel, nenhum general se moveu para dizer que não pode acontecer isso, é proibido pedir isso", afirmou.
Na manhã desta segunda, um acampamento bolsonarista localizado em frente ao quartel-general do Exército em Brasília foi desmontando após determinação emitida na noite de domingo pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, e cerca de 1.200 manifestantes que estavam no local foram levados de ônibus para uma instalação da Polícia Federal, após cerca de 300 prisões no domingo. A Polícia Militar do DF e o Exército participaram da desmontagem.
De acordo com autoridades, apoiadores de Bolsonaro partiram desse acampamento antes de invadir, danificar e saquear os edifícios-sede dos Três Poderes, no pior ataque às instituições democráticas desde o retorno do Brasil à democracia na década de 1980.
No encontro com Lula no fim do dia, o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB) informou que todos os Estados tiveram ações contra os acampamentos nesta segunda, desmobilizando em várias cidades estruturas que estavam instaladas com maior ou menor grau de organização desde a derrota eleitoral de Bolsonaro para Lula, em outubro.
INTERNADO NA FLÓRIDA
Enquanto isso, Bolsonaro, na Flórida desde 30 de dezembro, foi internado em um hospital de Orlando com uma nova obstrução parcial do intestino. Seu médico disse que o problema não era grave e provavelmente não precisaria de cirurgia --ele publicou uma foto no Twitter.
O ex-presidente, de 67 anos tem um histórico de hospitalizações por problemas intestinais desde que levou uma facada no abdome durante a campanha eleitoral de 2018. Ele já passou por seis cirurgias desde então, quatro delas diretamente ligadas à facada.
Em entrevista à CNN Brasil, Bolsonaro disse que pretendia ficar nos EUA até o fim do mês, mas que vai antecipar a volta devido ao problema de saúde.
Além dos percalços na saúde, o dia para Bolsonaro e seus aliados foi de analisar os impactos das invasões em Brasília para seu futuro político. O ex-presidente, que disse que os ataques "fogem à regra", mas que seguiu chamando os atos que pedem golpe de democráticos, enfrenta diversas investigações no STF e o círculo próximo a ele teme que os ataques tenham aumentado a possibilidade de ele ser alvo de uma ordem de prisão temporária.
O senador Renan Calheiros (MDB-AL) disse à Reuters que pedirá ao ministro do STF Alexandre de Moraes, que comanda os inquéritos contra Bolsonaro, para apurar a eventual participação do ex-presidente nos ataques.
Decano do STF, o ministro Gilmar Mendes disse que Bolsonaro tem responsabilidade política por não ter desestimulado atos de violência que resultaram nas invasões.
Os mercados financeiros mantiveram-se estáveis nesta segunda após uma queda inicial, com o índice de ações de referência da Bovespa com alta discreta de 0,15% e o dólar com alta modesta de 0,4% ante o real. Alguns analistas disseram que a violência de domingo pode fortalecer Lula politicamente.
(Reportagem adicional de Gabriel Araújo, Anthony Boadle e Sérgio Queiroz, em Brasília; e Jamie McGeever, em Orlando)