Por Pedro Fonseca e Lisandra Paraguassu e Ricardo Brito
(Reuters) -Luiz Inácio Lula da Silva (PT) derrotou o candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno da disputa presidencial, neste domingo, e voltará à Presidência pela terceira vez, impondo uma inédita derrota nas urnas a um ocupante do Palácio do Planalto que buscava um segundo mandato.
Com 99,99% das seções eleitorais apuradas, Lula alcançou 50,90% dos votos válidos, contra 49,10%, sendo declarado vencedor pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na disputa mais acirrada da redemocratização.
Presidente por dois mandados de janeiro de 2003 ao fim de 2010, é a primeira pessoa a conquistar um terceiro mandado presidencial na história democrática do país. Aos 77 anos, completados na última quinta-feira, ele levará o PT de volta ao poder pouco mais de seis anos após o partido de esquerda ter sofrido o impeachment da então presidente Dilma Rousseff e herda um país dividido como nunca.
"A partir de 1º de janeiro de 2023 vou governar para 215 milhões de brasileiros, e não apenas para aqueles que votaram em mim. Não existem dois Brasis. Somos um único país, um único povo, uma grande nação", discursou o petista a apoiadores e jornalistas Lula em um hotel da zona central de São Paulo.
Nem Bolsonaro, nem seus filhos haviam se manifestado sobre o resultado duas horas depois de Lula ser declarado vencedor pela Justiça eleitoral. Uma fonte da campanha bolsonarista disse à Reuters que o presidente não previa se pronunciar ainda na noite de domingo, mantendo o suspense após meses em que o mandatário atacou sem provas o sistema eletrônico de votação e deu declarações dúbias sobre reconhecer os resultados.
O presidente do TSE, Alexandre de Moraes, disse ter conversado com o mandatário sobre o desfecho eleitoral enquanto uma fonte disse a Reuters que Bolsonaro também falou com Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara e importante aliado.
"A vontade da maioria manifestada nas urnas jamais deverá ser contestada e seguiremos em frente na construção de um país soberano, justo e com menos desigualdades", disse Lira, sinalizando descolar de uma eventual contestação do Planalto.
VITÓRIA MAIOR DO QUE O PT
O ajustado resultado deste domingo confirmou a resiliência de Lula contra a ultradireita de Bolsonaro, que além de demonstrar vigor quatro anos depois de chegar ao poder, fez um pesado uso da máquina pública no ano eleitoral, com ao menos 273 bilhões de reais de gastos projetados para este ano e 2023 em medidas como a ampliação do programa Auxílio Brasil e pagamentos a taxistas e caminhoneiros.
O petista voltará à Presidência 12 anos após ter encerrado seu segundo mandato, período em que foi do céu ao inferno. Se deixou a Presidência com 87% de aprovação, passou 580 dias preso condenado por corrupção no âmbito da operação Lava Jato e foi barrado legalmente de concorrer na eleição de 2018 --agora o petista não deve nada à Justiça, uma vez que suas ações na Lava Jato foram anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Em seu primeiro discurso, Lula fez questão de frisar a frente ampla que lhe levou de volta ao poder, a começar pelo vice-presidente eleito e ex-adversário Geraldo Alckmin (PSB) --nome de centro-direita que foi importante para sinalizar o aceno ao centro. Nomes como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), a senadora Simone Tebet (MDB) --terceira colocada no primeiro turno-- e o ex-ministro Henrique Meirelles também endossaram o petista no segundo turno.
A definição da equipe econômica será a primeira pressão que Lula terá de gerir. Investidores e operadores do mercado financeiro repetem que não basta que o petista diga que será responsável com as contas públicas, mas querem a escalação para a Fazenda, assim como um detalhamento do que propõe para substituir o combalido teto de gastos.
Incluído na Constituição em 2016 para limitar o crescimento das despesas públicas à variação da inflação, o teto de gastos foi driblado pelo governo Bolsonaro e é consenso de que necessitará ser substituído. Toda alteração terá de contar com a chancela do Legislativo.
Lula promete manter o Auxílio Brasil em 600 reais e também disse que vai aumentar acima da inflação o valor do salário mínimo, que indexa também boa parte dos gastos previdenciários.
Se seus dois primeiros mandatos coincidiram com o boom das commodities, ajudando-o a reduzir a desigualdade e tirar milhões da pobreza extrema, agora o cenário externo é mais nebuloso, com temor de recessão global e uma guerra em curso na Europa.
O futuro presidente brasileiro também passará por um escrutínio externo no quesito ambiental. O petista prometeu reprimir a mineração ilegal na floresta amazônica e conter o desmatamento que atingiu um pico em 15 anos sob Bolsonaro.
(Por Pedro Fonseca, no Rio de JaneiroEdição de Flávia Marreiro)