(Reuters) - O presidente da República em exercício, Hamilton Mourão, usou um pronunciamento em cadeia de rádio e TV neste sábado para criticar representantes dos Três Poderes, defender as Forças Armadas e anunciar uma dura oposição ao "projeto progressista" do futuro governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
O pronunciamento marca o fim do governo do presidente Jair Bolsonaro, que preferiu deixar o país na sexta-feira e assim não passar a faixa presidencial para Lula na cerimônia da posse no domingo, colocando Mourão interinamente na Presidência.
O presidente em exercício fez um rápido balanço de ações positivas do governo que termina e procurou dirigir boa parte do discurso aos bolsonaristas, inclusive, de forma indireta aos mais radicais, que seguem em frente a quartéis pedindo uma ilegal intervenção militar contra a vitória do petista.
"Dirijo-me agora aos apoiadores de nosso governo... Desejo concitá-los a lutar pela preservação da democracia, dos nossos valores, do estado de direito e pela consolidação de uma economia liberal, forte, autônoma e pragmática e que nos últimos tempos foi tão vilipendiada e sabotada por representantes dos Três Poderes da República, pouco identificados com o desafio da promoção do bem comum", disse Mourão.
Com um texto bastante cifrado, o presidente em exercício sugeriu que os últimos acontecimentos levaram à expectativa de que "outros atores públicos" resolvessem o que chamou de "desequilíbrio institucional em curso", numa fala que pode ser entendida como se referindo a um possível papel das Forças Armadas.
"A falta de confiança de parcela significativa da sociedade nas principais instituições públicas decorre da abstenção intencional desses entes do fiel cumprimento dos imperativos constitucionais, gerando a equivocada canalização de aspirações e expectativas para outros atores públicos que, no regime vigente, carecem de lastro legal para o saneamento do desequilíbrio institucional em curso".
Mourão, no entanto, foi explícito em sua defesa das Forças Armadas, dizendo que elas pagaram a conta em meio ao silêncio de algumas lideranças, no que pode ser visto também como uma crítica a Bolsonaro, que em nenhum momento reconheceu publicamente a vitória de Lula nem fez qualquer declaração visando desmobilizar apoiadores que pediam um golpe aos militares.
"Lideranças que deveriam tranquilizar e unir a nação em torno de um projeto de país deixaram com que o silêncio ou o protagonismo inoportuno e deletério criasse um clima de caos e de desagregação social e de forma irresponsável deixaram que as Forças Armadas de todos os brasileiros pagassem a conta, para alguns por inação e para outros por fomentar um pretenso golpe", disse.
Logo depois das eleições, Mourão criticou aqueles que "agora querem que as Forças Armadas deem um golpe e coloquem o país numa situação difícil perante a comunidade internacional".
No início deste mês, ele defendeu a aceitação do resultado eleitoral, mas lamentou que a disputa tenha contado com a participação de Lula.
"Está chegada a hora das pessoas compreenderem que ele foi eleito e que agora ele tem que governar", disse Mourão em entrevista à Gazeta do Sul. "A partir do momento que a gente aceitou participar do jogo com esse jogador, que não poderia participar, tudo poderia acontecer, inclusive que ele vencesse, conforme venceu."
Senador eleito pelo PL do Rio Grande do Sul, Mourão prometeu uma oposição dura ao governo Lula e fez um pedido para que as pessoas retornem "à normalidade da vida", num momento de bastante tensão no país envolvendo bolsonaristas radicais --há uma semana, a polícia localizou e desativou uma bomba perto do aeroporto de Brasília, semanas depois de atos de violência na capital que viu carros e ônibus queimados e uma tentativa de invasão da sede da Polícia Federal.
"Tranquilizemo-nos! Retornemos à normalidade da vida, aos nossos afazeres e ao concerto de nossos lares, com fé e com a certeza de que nossos representantes eleitos farão dura oposição ao projeto progressista do governo de turno, sem, contudo, promover oposição ao Brasil", disse.
(Por Alexandre Caverni)