Por Eduardo Simões
SÃO PAULO (Reuters) - O ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, disse nesta terça-feira que o Artigo 142 da Constituição, que estabelece o papel das Forças Armadas no país, dá margem a diferentes interpretações, ao mesmo tempo que defendeu que a discussão sobre uma mudança constitucional para torná-lo mais claro seja feito em um clima mais sereno, não agora ainda no calor dos ataques aos Três Poderes realizado em 8 de janeiro.
Apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro e defensores de uma intervenção militar no Brasil apontam que o artigo daria aos militares um "poder moderador", interpretação já rechaçada por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a quem cabe interpretar o texto constitucional.
No entanto, defensores de rupturas democráticas frequentemente recorrem a esta interpretação equivocada do artigo para defender suas posições, o que levou a um debate sobre a elaboração de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para esclarecer o artigo e delimitar o papel das Forças Armadas.
"Esse 142 dá margem a interpretações diferentes. Agora, eu acho que nós devemos discutir isso quando as coisas estiverem mais serenadas, mais calmas, mais pacificadas", disse Múcio em entrevista à CNN Brasil quando indagado sobre as discussões em torno de uma PEC sobre o tema.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse, após os ataques de vândalos bolsonaristas radicais às sedes dos Três Poderes, que as Forças Armadas não são o poder moderador que pensam que são.
Na entrevista à emissora, Múcio também voltou a afirmar que os ataques de 8 de janeiro não voltarão a se repetir e disse que a relação do governo com o Exército está tranquila após a troca de comandante realizada na esteira dos ataques de 8 de janeiro.
"Estamos começando um período muito bom na gestão e aquele 8 de janeiro servirá sempre como uma referência para que cada um se sinta obrigado a fazer a sua parte, colaborar com o país, pacificar o país", disse.
"Está tranquilo o Exército, o militar é muito disciplinado, ordeiro, tem consciência das coisas. Na realidade foi apenas uma questão do clima de confiança que dificultava as nossas relações e principalmente as nossas providências, de maneira que isso é uma página virada."
Em 21 de janeiro, Lula demitiu o general Júlio César de Arruda do posto de comandante do Exército em uma medida que Múcio disse ter sido motivada por "fratura no nível de confiança". Para o lugar de Arruda foi nomeado o general Tomás Miguel Ribeiro Paiva.
Múcio também se defendeu de críticas a seu trabalho no ministério, afirmando que Lula o convidou para o cargo para que ele pacificasse as relações com os militares o que, em sua avaliação, está sendo feito.
"Quando o presidente me convidou para fazer o que estou fazendo, ele precisava que fizesse o que estou fazendo. Você repara que você não viu uma nota de um militar, um protesto de um militar nem da ativa, nem da reserva. A parte que me coube fazer, que era a pacificação, foi feita. Não há um protesto de Arma nenhuma, não há um protesto de nenhum militar", disse.
"Nós trabalhamos para que isso aconteça. Evidentemente, o 8 de janeiro maculou todo esse trabalho, mas a tarefa que o presidente me deu lá atrás, em novembro, foi que nós estreitássemos os laços das Forças Armadas com o Poder Executivo, Legislativo e Judiciário. Isso foi feito, está sendo praticado e, se Deus quiser, ao longo do tempo será solidificado."
O ministro comentou ainda a reação de setores do governo que defenderam sua demissão após os ataques de 8 de janeiro e disse não ter projetos políticos.
"Com relação às pessoas que pedem o meu lugar, isso é uma coisa tranquila. Eu não tenho partido, eu não tenho projeto político, o meu tempo de fazer política eu já estou satisfeito com o que fiz, de maneira que isso é uma decisão do presidente, de quem sou amigo sendo do governo ou não sendo do governo", disse.