Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - Servidores do Ibama e de outras carreiras federais ligadas à área do meio ambiente decidiram manter uma paralisação iniciada na semana passada que visa garantir uma reestruturação de carreira e anunciaram que vão retirar equipes do Território Indígena Yanomami, mesmo após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter anunciado um reforço nas ações do governo na região, que passa por crise humanitária.
Uma assembleia do Conselho de Entidades da Ascema Nacional realizada na quarta-feira determinou a ampliação das paralisações após o governo só ter prometido uma nova rodada de reuniões em 1º de fevereiro, mesmo com as categorias cobrando negociações por mais de um ano, de acordo com nota da entidade.
"Diante desse cenário, os servidores reunidos em assembleias nos Estados e no Distrito Federal decidem se concentrar exclusivamente em atividades internas e burocráticas, de escritório, até que o governo reconheça o valor das demandas trabalhistas desta estratégica carreira do serviço público federal e atue com celeridade para concluir as negociações", disse a categoria em nota divulgada nesta quinta-feira.
"Esta decisão inclui também a suspensão das ações de campo na Terra Indígena Yanomami, tendo em vista a permanência das deficiências nas condições de trabalho e os resultados já alcançados na proteção ambiental desde 2023", ressaltou a entidade.
Além do Ibama, a entidade representa servidores do Ministério do Meio Ambiente, do ICMBio e do Serviço Florestal Brasileiro (SFB).
As categorias alegam que há um "descaso" do governo e cobram uma reestruturação da carreira, a solução de impasses trabalhistas, além da realização de um amplo concurso público para as carreiras.
A decisão das categorias é um sério revés para o governo Lula, que na terça-feira anunciou a implementação de uma nova fase de proteção do Território Yanomami, que contará com presença permanente e investimento de 1,2 bilhão de reais em 2024, segundo o ministro da Casa Civil, Rui Costa.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e outros integrantes do alto escalão do governo foram enviados ao território a fim de estruturar ações para debelar a crise.
O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou nesta semana em entrevista à Reutersa que todo o peso do Estado precisa estar presente naquela localidade para expulsar definitivamente os garimpeiros ilegais, ressaltando que apenas a presença da Polícia Federal não é suficiente.
"Só a Polícia Federal não é suficiente... Não se consegue asfixiar (a criminalidade), por si só, com o trabalho da Polícia Federal", disse Rodrigues, em entrevista exclusiva à Reuters horas após participar da reunião de terça comandada por Lula.
"Não só a União, mas (é importante que) municípios e o Estado possam entrar com serviços, com assistência à saúde, com assistência educacional, com meios de produção, com oferta de alternativas econômicas, enfim. É todo um processo que levará, aí sim, a volta à normalidade daquela região", reforçou.
Lideranças indígenas da região afirmam que os garimpeiros ilegais estão começando a retornar após a saída do Exército de uma base avançada na reserva, e a crise humanitária continua, com o aumento de doenças e desnutrição entre seu povo.
O Território Yanomami, uma área do tamanho de Portugal, tem sido invadido por garimpeiros há décadas, mas as incursões mais destrutivas se multiplicaram nos últimos anos, especialmente depois que o então presidente Jair Bolsonaro desmantelou os esforços de proteção ambiental.
A mineração ilegal e o desmatamento exacerbaram uma crise humanitária no território, marcada por desnutrição e doenças como malária, além de abusos sexuais. Os rios foram poluídos e os peixes envenenados pelo mercúrio utilizado pelos garimpeiros, enquanto a fauna de que os yanomami dependem desapareceu.