Por Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia acatou nesta quinta-feira pedido do procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, e determinou a instauração de inquérito contra o ministro da Educação, Milton Ribeiro, para apurar a suposta liberação de recursos do pasta mediante a atuação de pessoas sem vínculo com o ministério.
A ministra também deferiu os pedidos do PGR para que o ministro e possíveis envolvidos sejam ouvidos, assim como prefeitos que relataram a suposta cobrança de propina para a liberação de recursos, além de determinar a expedição dos autos à Polícia Federal e estabelecer um prazo máximo de 30 dias para diligências pela autoridade policial.
"Há de se investigar e esclarecer, de forma definitiva, a materialidade e a autoria das práticas com elementos objetivos e subsídios informativos definidos nos termos da legislação vigente, para se concluir sobre a autoria, os contornos fáticos e as consequências jurídicas a serem determinadas pelas condutas descritas na notícia de crime informada pela Procuradoria-Geral da República", diz a ministra, na decisão.
"As circunstâncias expostas, que evidenciariam ocorrência de práticas delituosas a serem apuradas com o prosseguimento de ação penal pública incondicionada, tornam indispensável, segundo a manifestação do Ministério Púbico, o aprofundamento da investigação dos noticiados crimes", argumenta Cármen Lúcia na peça.
Na quinta-feira, o procurador-geral encaminhou o pedido de abertura de investigação, a partir de representações protocoladas na PGR, após reportagem do jornal Folha de S.Paulo na segunda-feira.
O jornal divulgou áudio em que o ministro afirma priorizar, após atender localidades com necessidade, prefeituras cujos pedidos de liberação de verba sejam negociados por dois pastores, prática que ocorreria a pedido do presidente Jair Bolsonaro, em vez de seguir critérios objetivos e técnicos. Na gravação, Milton também cita pedidos de apoio supostamente direcionados para construção de igrejas.
No pedido enviado ao STF, Aras mencionou outras reportagens sobre o assunto, incluindo denúncia de um prefeito de que um dos pastores teria pedido "1 quilo de ouro" como pagamento por demanda atendida.
Em nota divulgada na terça-feira, o ministro nega qualquer pedido da parte do presidente da República e afasta a possibilidade de ele determinar a alocação de recursos para favorecer ou prejudicar qualquer município ou Estado.
Em entrevista na quarta-feira, Ribeiro voltou a negar que tenha cometido qualquer irregularidade na liberação de recursos a prefeituras, mas revelou que, após ouvir um comentário e receber uma denúncia anônima, pediu à Controladoria Geral da União (CGU) que investigasse mediações suspeitas envolvendo intermediários entre o ministério e prefeitos.
COVARDIA
Mais tarde, na tradicional transmissão ao vivo por redes sociais que costuma fazer semanalmente, Bolsonaro repetiu seu discurso de que não há corrupção no governo porque foram tomadas providências sobre as denúncias.
Também argumentou que a pedido do próprio ministro o caso foi investigado --primeiro pela CGU e remetido à Polícia federal.
Ele aproveitou, ainda, para parabenizar a ministra do STF pela decisão, afirmando que é de seu interesse --e do ministro-- que os fatos sejam esclarecidos.
O presidente afirmou que fazem uma "covardia" contra o ministro e reclamou, sem citar nomes ou detalhes, de pressão que estaria sendo feita para que ele seja retirado do comando da pasta.
"Eu boto a minha cara no fogo pelo Milton, minha cara toda no fogo pelo Milton", disse Bolsonaro na live.
"Tem gente que fica buzinando, faz chegar para mim: 'manda o Milton embora, já tenho um bom nome para botar aí'... Mas não fala publicamente", relatou o presidente.