Raquel Godos.
Phoenix (EUA), 29 ago (EFE).- As primárias desta terça-feira nos Estados Unidos têm tudo para ser uma espécie de prévia da dura batalha que será travada nas eleições legislativas de novembro, depois que os democratas conseguiram mobilizar seu voto no Arizona, um estado historicamente republicano, e a Flórida elegeu um dos candidatos mais progressistas deste ciclo eleitoral.
A alta participação nas primárias do Arizona e a surpreendente vitória do candidato democrata, Andrew Gillum, para disputar o governo da Flórida assentaram as bases para as eleições de "meio de mandato", que costumam servir como um termômetro sobre a aprovação da gestão do presidente, neste caso Donald Trump.
No Arizona, a briga pelo assento que o conservador Jeff Flake deixará vacante no Senado será uma das disputas que criará mais expectativa no pleito, já que os democratas veem a aposentadoria do legislador como uma oportunidade única para ganhar em um estado que cada vez se afasta mais da direita.
Para essa batalha, os eleitores do Arizona escolheram Martha McSally, pelos republicanos, e Kirsten Sinema, entre os democratas, duas figuras bastante alinhadas com o 'establishment' de seus respectivos partidos que garantem a chegada de uma mulher por esse estado ao Senado pela primeira vez na história.
"Enquanto muitos 'outsiders' tiveram bom desempenho depois de 2016, os eleitores nas primárias republicanas no Arizona optaram por apoiar McSally", uma candidata mais clássica, explicou à Agência Efe a professora de Ciências Políticas e Administração Pública da Universidade de Fairfield (Conneticut), Gayle Alberda.
No entanto, como apontou a especialista, McSally teve uma retórica "mais à direita" durante sua campanha nas primárias sobre questões como a imigração, o que "poderia prejudicá-la com os eleitores independentes nas eleições gerais, e necessita se aproximar mais do centro nesses temas".
Na Flórida, a inesperada vitória de Gillum, assim como o triunfo de Ron DeSantis, candidato ao governo pelo Partido Republicano e que conta com o apoio do atual presidente, atendem ao "efeito Trump", ou seja, a reação às políticas mais radicais do magnata.
"Em novembro haverá um quase referendo entre os candidatos de Trump, os que são independentes de Washington, e os democratas que realmente são anti-Trump", opinou Steffen Schmidt, professor de Ciência Política da Universidade Estadual de Iowa, em declarações à Efe.
Gillum, impulsionado pelo ex-candidato presidencial Bernie Sanders, vivenciou uma escalada espetacular desde a terceira posição em que as pesquisas prévias às primárias o situavam, atrás inclusive do ex-prefeito de Miami Beach, Philip Levine, que figurava como segundo e que finalmente ficou relegado à terceira posição.
Na Flórida, explicou Alberda, "Gillum pediu que o presidente Trump fosse submetido a um processo de impeachment, enquanto o candidato republicano, DeSantis, vem sendo apoiado por Trump desde o princípio. Para os candidatos republicanos, ser apoiado por Trump parece ter alguma influência em seu sucesso nas urnas".
"Os resultados da corrida ao governo (da Flórida) são interessantes porque evidenciam a fragmentação dos dois partidos políticos. (...) É interessante porque sugere que a agenda progressista está repercutindo entre os eleitores", acrescentou a especialista.
"Ao mesmo tempo, o candidato republicano apoiado por Trump ganhou a primária, o que reflete que os defensores das políticas do magnata continuam sendo politicamente ativos e que as medidas tomadas por Trump e suas mensagens motivam os eleitores", disse Alberda.
A corrida para as legislativas de novembro está ficando mais quente na medida em que faltam pouco mais de dois meses para a votação. As pesquisas indicam que os democratas recuperarão com certa folga a maioria na Câmera de Representantes, e têm esperanças de fazer o mesmo no Senado, que renovará um terço de suas cadeiras.
Se finalmente os democratas assumirem o controle parcial ou total do Congresso, cujas duas câmaras estão agora em mãos republicanas, isto complicaria as coisas para Trump em seus dois últimos anos de mandato, e poderia ser o primeiro passo para que o presidente seja submetido a um processo de impeachment por seu papel na suposta interferência russa nas eleições presidenciais de 2016, um procedimento que deve ser iniciado no Legislativo.