(O autor é editor de Front Page do Serviço Brasileiro da Reuters. As opiniões expressas são do autor do texto)
Por Alexandre Caverni
SÃO PAULO (Reuters) - A insistência com que todo mundo no governo começou a citar a realização de uma reforma da Previdência sugere que essa mudança estrutural futura pode ser usada como uma moeda de troca para algum tipo de flexibilização no esforço fiscal no curto prazo, na busca da retomada do crescimento econômico.
Esse movimento parece especialmente importante no momento de mudança do comando do Ministério da Fazenda, com a troca de alguém que era visto como umbilicalmente ligado ao ajuste fiscal, Joaquim Levy, por justamente alguém visto como menos comprometido com esse esforço, Nelson Barbosa, e que parece ter derrotado o ex-titular em vários momentos para moderar os cortes de gastos propostos.
Na cerimônia de posse de Barbosa e do novo ministro do Planejamento, Valdir Simão, a presidente Dilma Rousseff defendeu a reforma da Previdência que o governo vem estudando desde o início do ano, e Barbosa afirmou que o governo pretende apresentar ao Congresso uma proposta no primeiro semestre de 2016.
O novo ministro da Fazenda tem citado repetidamente essa reforma, assim como Simão e mesmo o chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, que deixou claro em conversa com jornalistas nesta manhã uma preocupação com essa iniciativa. Para Wagner, o governo ganhará credibilidade se conseguir fazer a reforma da Previdência.
A preocupação faz sentido. Quando o governo enviou ao Congresso o projeto de Lei Orçamentária Anual em agosto, projetava só para o ano que vem um déficit de quase 125 bilhões de reais no Regime Geral da Previdência Social.
Mas o fato de todas as principais figuras do Executivo estarem falando à exaustão da reforma da Previdência não torna mais exequível sua realização.
Basta ver o histórico da mesma nos últimos governos. O tucano Fernando Henrique Cardoso, que possuía uma base muito forte e coesa no Congresso, não teve vida fácil para fazer sua reforma da Previdência.
Já Luiz Inácio Lula da Silva empregou seu enorme capital político de recém-eleito na aprovação de uma reforma relativamente limitada, que precisou de votos dos partidos de oposição, quando não existia nada parecido com o clima político de Fla X Flu que vivemos hoje.
O quadro atual do Congresso Nacional e a conjuntura política apontam para um grau de dificuldade que beira à impossibilidade de se obter êxito na tentativa de fazer uma reforma séria da Previdência. Ainda mais quando, segundo fontes do governo, a ideia é incluir na mesma a imposição de uma idade mínima para a aposentadoria, ponto sempre descartado nas últimas décadas.
Não é só a questão do impeachment. Mesmo se Dilma sobreviver à batalha que trava no Congresso para impedir a abertura de um processo contra ela, e seu consequente afastamento da Presidência, não se imagina que conseguirá isso com a força necessária para tornar a relação Executivo-Legislativo muito mais colaborativa do que os patamares atuais.
Falando mais claramente: para quem trabalha arduamente para impedir que dois terços da Câmara (342 deputados) se posicionem contra a permanência de Dilma no comando do país, difícil imaginar ser possível que o governo atraia para seu lado o apoio de três quintos da mesma Casa (308 deputados), o mínimo necessário para a aprovação de uma emenda à Constituição, num tema tão polêmico e com alto potencial de impopularidade.
Tudo isso posto, uma proposta de reforma da Previdência pode acabar funcionando apenas como uma moeda de troca, mas uma moeda que no final das contas acabe não sendo entregue, mesmo se o desejo do governo for outro.
* Esta coluna foi publicada inicialmente no terminal financeiro Eikon, da Thomson Reuters.