A mostra de arte da Caixa Cultural que exibia uma imagem do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), da senadora Damares Alves (Republicanos-DF) e do ex-ministro da Economia Paulo Guedes dentro de uma lata de lixo custou R$ 250 mil à Caixa Econômica Federal, controlada pelo governo.
O valor consta no extrato do contrato publicado no DOU (Diário Oficial da União) em 9 de outubro de 2023.
A contratada pela Caixa foi a antropóloga Iara Machado, da empresa Lhama Arte e Cultura. Em seu perfil no LinkedIn, a produtora cultural divulgou a mostra. O Poder360 tentou contato com ela por meio do seu e-mail. Não houve resposta até a publicação desta reportagem.
A exposição “O Grito”, de autoria da artista Marília Scarabello, foi suspensa pela Caixa na tarde de 2ª feira (23.out) depois de reportagem do Poder360. O banco público disse ter identificado uma “manifestação com viés político” na mostra, o que vai contra as diretrizes da empresa.
Segundo a Caixa, o pagamento da obra será feito em parcelas, “de acordo com cronograma estipulado em contrato”. O último desembolso está previsto para dezembro, quando seria o último mês de exibição da mostra.
A íntegra do contrato não foi enviada pelo banco, embora tenha sido solicitada pelo Poder360 às 20h53 de 2ª feira (23.out), via e-mail.
O regulamento do Programa de Ocupação dos Espaços da Caixa Cultural foi lançado em 28 de abril deste ano e recebeu inscrições até 31 de maio. O edital estabeleceu um limite de patrocínio de R$ 600 mil por cidade (Brasília, Curitiba, Fortaleza, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo).
Ainda segundo o edital, o valor do patrocínio foi definido por “critérios objetivos de avaliação da vantajosidade do projeto” e não está vinculado necessariamente aos custos de execução da obra.
“O montante destinado à presente seleção será definido em função das cotas de patrocínio a serem acordadas com os proponentes dos projetos selecionados e considerará a disponibilidade orçamentária da Caixa para patrocínios culturais, que será determinada anualmente”, diz outro trecho do regulamento. Eis a íntegra (PDF – 231 kB).
Em agosto, a ministra da Cultura, Margareth Menezes, e a presidente da Caixa, Rita Serrano, apresentaram juntas os projetos selecionados para a Caixa Cultural. Ao todo, foram 132, dentre eles, “O Grito” –mostra agora suspensa (leia mais abaixo). O anúncio foi registrado pelas assessorias de imprensa da Caixa e do ministério. Leia aqui (PDF – 231 kB).
“São R$ 30 milhões de investimento apenas nessa seleção até março do ano que vem, possibilitando maior acesso à cultura, além da geração de emprego e renda”, disse a presidente da Caixa na ocasião. Eis a íntegra com a lista de obras selecionados (3 MB).
Eis a íntegra da nota:
“A Caixa informa que a exposição “O grito!” foi selecionada no âmbito do Programa de Ocupação dos espaços da Caixa Cultural 2023/2024, modelo de seleção pública para projetos culturais que são patrocinados para ocupação dos espaços do banco.
“A obra ‘Bandeiras’ compõe a exposição e apresenta uma coleção de imagens do público em geral recebidas pela artista Marília Scarabello, desde 2016, com releituras da bandeira brasileira que retratam os mais diversos imaginários acerca do Brasil, com variadas manifestações de pensamento.
“Considerando que foi identificada na obra em questão manifestação com viés político, o que fere as diretrizes do programa, a Caixa decidiu suspender a referida exposição. A direção do banco informa ainda que determinou apuração de responsabilidade pelos órgãos internos.”
CAIXA CANCELOU OBRA
O banco decidiu suspender a exposição “O Grito” por considerar uma “manifestação com viés político” –vedada pelas diretrizes da empresa.
A exposição estava aberta para o público na Caixa Cultural, em Brasília, desde a última 3ª feira (17.out). A “Coleção Bandeira” é de autoria da artista Marilia Scarabello e está exposta junto a obras de outros artistas. Outra peça mostra o que parece ser Bolsonaro, agachado, sem calças e defecando sobre a bandeira do Brasil.
CAIXA E O CENTRÃO
Desde julho, a presidência da Caixa Econômica Federal e suas principais diretorias têm sido negociadas por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com Lira. O comando do banco foi oferecido pelo Palácio do Planalto para o Centrão quando esse grupo político ingressou no governo em troca de cargos na Esplanada.
O presidente da Câmara foi o chefe político do Centrão que deu o aval principal para as mudanças nos ministérios de Lula, que oficializaram a entrada do PP e do Republicanos na base de apoio do governo, em 6 de setembro. Arthur Lira entregou a Lula em 28 de setembro o nome de Carlos Antônio Fernandes Vieira como possível indicado para presidir a Caixa no lugar de Rita Serrano.
Era esperado que a troca no comando do banco também fosse anunciada um pouco mais cedo, mas a operação foi adiada porque era necessário cumprir requisitos da política de conformidade da instituição financeira.
Havia expectativa de que Lula pudesse tomar uma decisão na volta de sua viagem aos Estados Unidos, onde havia participado da Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), em meados de setembro. Uma entrevista dada por Lira ao jornal Folha de S.Paulo, no entanto, irritou o presidente e as indicações para a Caixa ficaram em banho-maria.
Em 17 de setembro, o deputado disse ao jornal que as indicações políticas para os cargos no banco público passariam pelo seu aval e afirmou que a ideia era contemplar não só o PP, seu partido, mas também outros de seu grupo político, como União Brasil, Republicanos e parte do PL.
Segundo o Poder360 apurou, o reconhecimento público de que as decisões sobre a Caixa seriam tomadas pelo deputado levou Lula a segurar a negociação.