O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está elaborando um pacote de regras para ressuscitar o transporte de passageiros por trilhos. Uma das principais alternativas em estudo é realizar concessões para construção e operação de ferrovias exclusivas para locomoção humana. A regulamentação funcionará como complemento do Marco das Ferrovias.
A Política do Transporte Ferroviário de Passageiros foi colocada em consulta pública pelo Ministério dos Transportes, que recebe contribuições até esta 3ª feira (9.jan.2024). Mais de 200 sugestões já foram enviadas. A ideia é que o texto final seja publicado via decreto presidencial nos próximos meses.
Além das concessões, o governo pretende usar investimentos dos contratos existentes de ferrovias de carga na forma de contrapartida. Para isso, pode repactuar concessões vigentes para incluir projetos de trens de passageiros como obrigações. Aportes públicos também devem ser feitos para viabilizar trechos menos atrativos economicamente.
O principal desafio é justamente fazer com que os projetos sejam atrativos aos investidores. Para isso, o modelo de concessão proposto inclui a possibilidade das operadoras explorarem comercialmente espaços nas estações e imóveis nos seus entornos e na faixa de domínio da linha férrea. Há até a opção de venda de naming rights (direitos de nome) dos trechos e estações.
Há ainda a receita com tarifas, que será regulada pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). O valor dos bilhetes para os passageiros serão fixados e reajustados observando o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos e a modicidade tarifária.
Além do modelo de concessão, a proposta do governo inclui a possibilidade de um regime de autorização a operadores privados. Ou seja, se uma empresa quiser construir e operar determinada rota não prevista pelo governo, poderá ter autorização para isso. Esse formato não teria leilões nem fixação de tarifas pela ANTT, mas exigiria regras mínimas de prestação de serviço.
A política elaborada pelo governo não traz distinções de trens de média ou alta velocidade, decisão que deve ficar a cargo do investidor.
7 TRECHOS EM ESTUDO
Diversos projetos de trens de passageiros estão em fase de estudo de viabilidade pelo governo. O Poder360 apurou que 7 estão mais avançados. São trechos de, em média, 100 km de extensão ligando grandes municípios e regiões metropolitanas. Ainda não estão definidos os modelos e quais demandarão recursos públicos.
A ideia é ligar cidades polo que contam com ligações deficientes ou sobrecarregadas. A maior ferrovia seria para ligar Sobral a Fortaleza, no Ceará, com mais de 200 km de extensão. As demais seriam no Maranhão, Bahia, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul.
No passado, as primeiras ferrovias do Brasil contavam com trens de passageiros, mas o modelo foi sendo abandonado no final do último século pela falta de demanda de lucratividade. Isso levou à escassez de investimentos em melhorias na malha e nas locomotivas, que foram ficando defasadas. Salvaram-se só rotas em que empresas viram oportunidade de exploração turística, como na Serra Gaúcha e em cidades históricas mineiras.
Atualmente, apenas duas ferrovias fazem transporte regular de passageiros no Brasil: as estradas de ferro EFVM (Vitória a Minas) e EFC (Carajás). Os trajetos são:
- EFVM – diariamente, um trem parte de Belo Horizonte (MG) e outro de Cariacica, na Grande Vitória (ES). O trajeto é feito em 13 horas. Há também um trem adicional que faz o percurso entre as cidades Itabira e Nova Era, ambas em Minas Gerais;
- EFC – um trem sai de São Luís (MA) toda 2ª feira, 5ª e sábado; e de Parauapebas (PA) toda 3ª, 6ª e domingo. O trajeto é feito em 16 horas.
Ambas as ferrovias são concedidas à Vale (BVMF:VALE3) e dedicadas ao transporte de minério de ferro. Os trens para pessoas eram um diferencial da companhia em sua fase estatal. Depois de privatizada em 1997, ficou obrigada pelo contrato de concessão a continuar o serviço.
PROMESSAS ANTIGAS
Nas últimas décadas, as principais promessas de ferrovias para passageiros eram as de trens-bala, como no trecho Rio-São Paulo. Chegou a ser criada uma estatal para elaborar o projeto, que depois passou a ser 100% privado.
Em fevereiro de 2023, a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) deu autorização para a recém-criada TAV Brasil tocar o empreendimento, mas nada saiu do papel até agora.
Trata-se de um modelo ainda mais caro de construir e operar. Também há dúvidas quanto à demanda, o que compromete a viabilidade econômica. O ministro dos Transportes, Renan Filho, já disse não crer que o empreendimento sairá do papel.
Outro antigo projeto, de um trem de passageiros ligando São Paulo a Campinas, está mais perto de sair do papel. Essa será a 1ª de 4 linhas de TICs (Trens Intercidades) que o governo paulista quer implementar nas principais regiões do Estado. A construção será via concessão e já está com o leilão marcado para 29 de fevereiro.
Eis os trechos:
- TIC Eixo Norte – de São Paulo a Campinas (concessão vai à leilão em 29 de fevereiro);
- TIC Eixo Sul – de São Paulo até a região de Santos, no litoral, passando por ABC e Cubatão;
- TIC Eixo Oeste – de São Paulo até a região de Sorocaba, passando por São Roque;
- TIC Eixo Leste – de São Paulo a Pindamonhangaba, passando por São José dos Campos e Taubaté.