SÃO PAULO (Reuters) -O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu nesta terça-feira que o aborto seja discutido como uma questão de saúde pública, apesar de reiterar sua oposição pessoal ao procedimento, argumentando que não se pode obrigar uma menina a ter uma criança gerada por um estupro.
"Eu, Luiz Inácio Lula da Silva, sou contra o aborto. Para ficar bem claro. Agora, enquanto chefe de Estado, o aborto tem que ser tratado como questão de saúde pública", disse Lula em entrevista à rádio CBN.
"Você não pode continuar permitindo que a madame vá fazer um aborto em Paris e que a coitada morra em casa tentando furar o útero com uma agulha de tricô. Esse é que é o drama que nós estamos vivendo", acrescentou.
Na entrevista, Lula foi questionado sobre a pauta de costumes no Congresso Nacional, que inclui a investida de deputados conservadores e ligados a igrejas evangélicas para avançar com um projeto de lei que equipara o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, mesmo nos casos em que o aborto é permitido pela legislação brasileira, como para vítimas de estupro.
A Câmara dos Deputados aprovou na semana passada a urgência para tramitação da proposta, o que significa que ela irá diretamente a plenário sem passar antes por comissões temáticas da Casa, abreviando o debate sobre a proposta no Parlamento.
Diante da forte reação contrária à medida por parte da opinião pública, o projeto de lei perdeu força na Câmara e aliados do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), que patrocinou a votação da urgência para a proposta, têm dito que não há prazo para que ela seja votada.
Na entrevista à CBN, Lula negou ter subestimado a tramitação de pauta sobre costumes e afirmou que este não é o debate mais importante para o país no momento.
"Nós não tínhamos no Brasil a experiência de uma extrema-direita ativista como nós temos hoje. E uma extrema-direita pouco pragmática na política", disse Lula. "Essas pautas de costumes, eu até nem gosto de discutir isso, porque isso não tem nada a ver com o que nós estamos vivendo".
O presidente disse ainda ser "crime hediondo" obrigar uma criança que foi estuprada a ter o filho do estuprador.
"Não tem nada a ver ficar discutindo aborto legal, aborto ilegal. O que nós temos que discutir é o seguinte: quem está abortando, na verdade, são meninas de 12, 13, 14 anos. É crime hediondo um cidadão estuprar uma menina de 10, 12 anos e depois querer que ela tenha um filho."
(Por Fernando Cardoso e Eduardo SimõesEdição de Tatiana Ramil e Pedro Fonseca)