Senadores da oposição criticaram nesta 3ª feira (12.set.2023) a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) pela constitucionalidade da chamada contribuição assistencial para sindicatos, que, apesar do nome, será uma taxa compulsória. Para os congressistas, a Corte está desrespeitando prerrogativas do Legislativo.
A taxa validada pelo STF trata de uma cobrança que terá um impacto semelhante ao antigo imposto sindical, que vigorou até 2017 e dava mais de R$ 3 bilhões por ano para sindicatos e centrais (leia no infográfico mais abaixo).
Na prática, a decisão do STF ressuscita o antigo imposto sindical por meio de um eufemismo, a contribuição assistencial. Qualquer sindicato (possivelmente todos) poderá convocar uma assembleia a cada ano e, com qualquer número de trabalhadores presentes, determinar que haverá a cobrança –tanto para sindicalizados quanto para não sindicalizados. Em seguida, a decisão será enviada para as empresas do setor, que vão descontar o valor (por exemplo, 1 dia de salário) e repassar para a entidade sindical. Essa cobrança será compulsória. Para não pagar, cada trabalhador terá de ativamente se manifestar e dizer que não tem interesse em fazer a “contribuição assistencial”.
“É uma manobra nefasta, independentemente de direita e de esquerda. Está se tomando dinheiro das pessoas por politicagem”, disse o senador Eduardo Girão (Novo-CE) ao Poder360. “É mais uma vez o Supremo se metendo em algo do Legislativo”.
O senador Marcos Rogério (PL-RO) concorda com o colega e lembra que o Congresso Nacional já decidiu sobre o imposto sindical. A reforma trabalhista, de 2017, extinguiu o tributo. A interpretação havia sido de que nenhuma taxa compulsória poderia ser cobrada dos trabalhadores.
“Trazer de volta o imposto sindical pela via do Judiciário, com todo o respeito, me parece uma usurpação de competência, me parece algo que desafia o Parlamento. O espaço adequado para se discutir essa matéria é o Parlamento”, disse Marcos Rogério ao Poder360. “Eu lamento que essa decisão tenha sido tomada pelo Supremo de maneira a diminuir o papel do Parlamento. Espero que a gente consiga um caminho para contornar essa decisão”.
Na Câmara, a oposição analisa apresentar um projeto de lei que crie um formulário para o trabalhador preencher no momento da contratação. O objetivo seria o profissional indicar no documento se quer ou não pagar a contribuição.
“[A decisão do STF] é uma forma de burlar a legislação, o que nós aprovamos aqui extinguindo o imposto sindical, essa excrescência que obriga que o trabalhador sustente esses satélites do PT, sindicatos que nada contribuem”, afirmou o líder da Oposição na Câmara, Carlos Jordy (PL-RJ).
Como se observa no quadro a seguir, o valor arrecadado por sindicatos e centrais passou de R$ 3 bilhões em 2017. Depois, sem o imposto sindical, essa fonte de recursos fáceis secou. Agora, deve voltar com a contribuição assistencial.
O líder da Oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), também criticou a decisão do STF. Para ele, a taxa cobrada dos trabalhadores irá impulsionar manifestações de esquerda.
“Decisão atropela o que foi decidido pelo congresso em 2017, que determinava prévia e individual anuência do trabalhador o desconto e traz de volta famigerado imposto sindical”, afirmou o senador em seu perfil no X (ex-Twitter). “Agora vamos assistir manifestações ‘espontâneas’ das esquerdas nas ruas. [O] Parlamento precisa fazer o seu papel.”
O líder do PSDB no Senado, Izalci Lucas (DF), também usou a rede social para falar sobre o tema. “O STF não pode penalizar o trabalhador, passando a cobrar imposto sindical. Além de prejudicar quem trabalha, isso é uma extrapolação de competência do Judiciário”, escreveu o congressista na 2ª feira (11.set).
ENTENDA O CASO
A decisão do STF analisou os chamados embargos de declaração apresentados pelo Sindicato de Metalúrgicos da Grande Curitiba (PR) contra um julgamento de 2018 sobre o tema. Na época, a Corte havia decidido que seria inconstitucional a cobrança, por acordo, convenção coletiva ou sentença normativa, de contribuição compulsória a funcionários não sindicalizados.
Naquele momento, a Corte estendeu o entendimento a outro tipo de taxa, a contribuição assistencial –adotada para remunerar atividades que o sindicato pratica para beneficiar o trabalhador durante negociações com as empresas empregadoras. Ou seja, também definiu que essa contribuição não poderia ser obrigatória. É essa contribuição que agora foi considerada constitucional e passará a ser cobrada.
Em 2017, o então presidente da República, Michel Temer, sancionou uma reforma trabalhista que extinguiu o imposto sindical. A interpretação havia sido de que nenhuma taxa compulsória poderia ser cobrada dos trabalhadores. Antes, todos os empregados, sindicalizados ou não, eram obrigados a pagar o que era conhecido como imposto sindical e equivalia a 1 dia de trabalho por ano.
A nova lei aprovada por Temer diz que a contribuição tem de ser autorizada “previa e expressamente” pelo trabalhador. O ministro do Trabalho à época, declarou o seguinte na cerimônia de sanção da lei, em 13 de julho de 2017: “Se queremos prestigiar a convenção coletiva, nós precisamos de organizações sindicais fortes. Elas precisam ter uma forma de custeio, mas não pode ser obrigatório. Tem que ser voluntário”.
Agora, o cenário se inverteu por causa da decisão do STF. Os magistrados passaram a entender que a Constituição permite que sindicatos possam cobrar a contribuição assistencial de maneira compulsória de todos os trabalhadores, sindicalizados ou não sindicalizados.
A mudança no entendimento do STF sobre a cobrança do imposto sindical é o oposto do que senadores e deputados aprovaram na lei 13.467, de 2017. Agora, está invertido o ônus sobre a cobrança: quem não quiser pagar terá de se manifestar, caso contrário, terá o dinheiro descontado automaticamente do salário.
Advogados tributaristas dizem que a instituição de uma cobrança a todos os trabalhadores para financiar sindicatos pode causar insegurança jurídica se não for modulada. Caso o novo entendimento pela contribuição prevaleça, o padrão será haver um desconto no salário de todos os trabalhadores, sindicalizados ou não.
Os defensores da cobrança compulsória da contribuição assistencial dizem ser errado chamar ou comparar essa taxa com o “imposto sindical”, pois cada trabalhador poderá, se assim desejar, rejeitar o pagamento. O problema é que cada trabalhador terá de se lembrar anualmente de fazer essa manifestação de maneira expressa antes de ser cobrado.
A modalidade de cobrança inverte o ônus da operação. Remete ao sistema que vigorou alguns anos no Brasil para cartões de crédito. Bancos e operadoras em geral mandavam cartões para a casa das pessoas, dizendo que haveria uma cobrança de anuidade pelo uso do produto depois de um prazo definido (1 mês, por exemplo). Muita gente não percebia e achava que era de graça. Começava a usar e depois se surpreendia com o dinheiro descontado de sua conta. A Justiça acabou sendo acionada e hoje é proibido enviar cartões de crédito não solicitados. Ou seja, só quem tem desejo de pagar pelo produto é que se manifesta –e não o contrário, quando o consumidor muitas vezes era lesado.
Agora, com a contribuição assistencial compulsória ocorre uma situação similar: o trabalhador terá de perceber que será cobrado e, com a antecedência devida, pedir para não pagar.