SÃO PAULO (Reuters) - Em seu cinema, o espanhol Fernando León de Aranoa prima pela questão social, como fica claro no filme que o colocou em evidência, “Segunda-Feira ao Sol”, um drama sobre crise e desemprego em seu país protagonizado por Javier Bardem. Em “Um Dia Perfeito”, o cineasta volta sua câmera para outro tipo de crise social: uma guerra e a inércia que provoca.
Este que é seu primeiro filme em inglês –com um elenco multinacional– ambienta-se em algum lugar das Bálcãs, em meados dos anos de 1990, e tem ao centro um grupo de ajuda humanitária que precisa retirar um cadáver obeso que está entalado num poço numa aldeia. Depois disso, ainda é preciso descontaminar a água. Mas, enfim, uma coisa de cada vez.
E a primeira tarefa toma muito tempo. Era para ser algo simples, mas a corda que içaria o cadáver arrebenta, e é não fácil arrumar uma substituta. Cada vez mais complicada, a situação assume ares surreais a cada nova etapa, a cada novo problema. Embora o conflito esteja em vias de terminar, os estragos e a crise que sobram não se resolvem com facilidade.
A equipe de ajuda humanitária é composta por um portorriquenho, Mambrú (Benicio Del Toro), um americano, chamado apenas de B. (Tim (SA:TIMP3) Robbins), e uma francesa, Sophie (Mélanie Thierry), além de contar com a ajuda de um guia/tradutor, Damir (Fedja Stukan).
As situações de crise pessoal acabam rompendo fronteiras com aquelas internacionais e éticas. A chegada de uma nova personagem é mais um complicador –trata-se de Katya, interpretada pela ucraniana Olga Kurylenko, cuja história de amor mal-resolvida com Mambrú solta faíscas.
Trabalhando num roteiro escrito por ele e Diego Farias, a partir de um romance de Paula Farias, León de Aranoa imprime ao filme um tom que vai ao encontro da insanidade da situação e do cenário desolado, combinando com isso o humor do absurdo –o que faz lembrar filmes de guerra como “M*A*S*H*” e “Ardil-22”.
Filmado na Espanha –com Granada, Málaga e Cuenca “se passando” pela região das Balcãs dos anos de 1990– e com trilha sonora pop –incluindo Marilyn Mason, Lou Reed e Ramones, entre outros– “Um Dia Perfeito” investiga o lado absurdo de algo já absurdo por natureza.
Ao contar a história estritamente do ponto de vista dos ocidentais repletos de boa vontade, León de Aranoa abre mão de uma camada em seu filme. O que pensam aqueles que recebem ajuda? Aqueles que não têm como fugir da guerra? A posição da população civil local como coadjuvante no filme espelha exatamente o seu papel dentro de um conflito bélico: incapaz de tomar decisões e à mercê de ajuda, muitas vezes, vinda de fora.
Sem deixar de ser um tributo a homens e mulheres de diversos lugares do mundo que se arriscam pela paz, a história explora aspectos da guerra em tempos de globalização.
A guerra, como mostra o filme, é feita de paradoxos. Numa das cenas, Sophie (Mélanie Thierry) é informada por um militar também estrangeiro de que ela não pode se envolver porque aquele não é um conflito internacional, apesar de todos eles terem passaportes internacionais. Eles precisam esperar que a lei local aja.
É em contradições como essa –algumas exageradas para efeito dramático, mas ainda assim possíveis– que o diretor se apoia. Enfim, a mesma globalização que permite que essas pessoas estejam nesse lugar para ajudar os moradores é o entrave ao seu trabalho, além de um dos paradoxos do mundo contemporâneo.
(Por Alysson Oliveira, do Cineweb)
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