Por Marta Nogueira e Gram Slattery
RIO DE JANEIRO (Reuters) - A Petrobras (SA:PETR4) teve prejuízo líquido de 48,5 bilhões de reais no primeiro trimestre, após grande baixa contábil devido a uma revisão das premissas de longo prazo para o petróleo Brent, registrando uma perda muito maior que os quase 37 bilhões de reais do quarto trimestre de 2015, quando a companhia ainda se recuperava das denúncias de corrupção da Lava Jato.
Também em 2015 pesaram nos resultados da companhia baixas contábeis de dezenas de bilhões de reais relacionadas ao declínio dos preços do petróleo e à perda do grau de investimento naquele ano.
No primeiro trimestre deste ano, a empresa lançou uma baixa contábil de 65,3 bilhões de reais ao reavaliar ativos principalmente de exploração e produção, considerando preços mais baixos do petróleo, devido a uma crise global causada pela pandemia do novo coronavírus, que reduziu a demanda pela commodity.
"Estamos assumindo agora que o preço do Brent de longo prazo será em média 50 dólares/barril, contra 65 dólares/barril anteriormente", afirmou a Petrobras, em seu balanço financeiro trimestral, que projeta o valor médio neste ano de 25 dólares/barril.
A baixa contábil engloba principalmente mudanças no valor recuperável de diversos campos, como em Roncador, Marlim Sul, Polo Norte, Albacora Leste, Polo Berbigão-Sururu, Polo CVIT e Mexilhão, com um impacto total de 57,6 bilhões de reais.
Outros 6,6 bilhões de reais em baixas ocorreram com a hibernação de campos e plataformas em águas rasas, afetando os Polos Norte, Ceará-Mar e Ubarana e os campos de Caioba, Guaricema e Camorim.
A petroleira, que vinha de um lucro líquido de mais de 8 bilhões de reais no quarto trimestre de 2019, após lucrar 4 bilhões de reais de janeiro a março do mesmo ano, teve um resultado operacional acima das expectativas, contudo.
"O prejuízo contábil em nada afeta a saúde e sustentabilidade da Petrobras. Trata-se de situação bastante distinta da vivenciada em 2014-2015 quando a companhia enfrentava duas crises, uma financeira e outra moral, e a baixa de ativos refletia a vulnerabilidade da companhia", disse o presidente da companhia, Roberto Castello Branco, em mensagem aos acionistas.
Ele ressaltou que, agora, a companhia seguirá "em frente com um balanço mais aderente à realidade dos mercados e foco na geração de valor, perseguindo continuamente a obtenção de retornos sobre o capital empregado superiores ao custo do capital".
Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, afirmou que o recado do balanço é claro: "diante do atual cenário, a companhia precisará continuar encontrando soluções (como o aumento da exportação) para atingir seus objetivos".
"Acreditamos que, mesmo o topline e a dinâmica de custos tendo se mantido com o padrão de qualidade da companhia, a comprovação dos desafios futuros e a deflagração da necessidade de uma mudança na dinâmica deste mercado possivelmente pressionem a ação amanhã", afirmou.
MUDANÇA DE HÁBITOS
A Petrobras citou que, como consequência da Covid-19, haverá uma mudança estrutural na economia mundial e ocorrerão mudanças de hábitos dos consumidores, já observados nos dias atuais, que tendem a ser perenes. A empresa justificou a reavaliação do Brent dizendo que elevado nível de estoque de petróleo mundial retardará o reequilíbrio do balanço de oferta e demanda.
Os resultados no primeiro trimestre também foram impactados pela queda do valor do Brent no período e pelas perdas com variação cambial decorrentes da forte desvalorização do real frente ao dólar, explicou a companhia, lembrando que, além dos impactos da Covid-19, o petróleo sofreu pressão no período devido à disputas por mercado entre Arábia Saudita e Rússia.
"Estes fatores foram atenuados por maiores volumes de exportação, maiores margens nos derivados, menores despesas, incluindo gastos gerais e administrativos, exploratórios e tributários, bem como ganhos com hedge", afirmou a Petrobras.
Castello Branco ressaltou que "a recessão global não chegou a impactar significativamente o desempenho da companhia no primeiro trimestre, devendo fazê-lo nos trimestres seguintes".
Ele citou que o fluxo de caixa livre foi de 5,9 bilhões de dólares nos primeiros três meses do ano, muito superior ao do mesmo trimestre de 2019, de 3,1 bilhões de dólares.
No entanto, a empresa informou que houve uma redução das exportações para a China --seu principal cliente--, devido à queda da demanda, causada pelos impactos da Covid-19. O país asiático recebeu no período 48% das exportações da empresa, contra 68% no quarto trimestre.
EXCLUINDO IMPAIRMENT
Desconsiderando os efeitos especiais, principalmente impairment e ágio na recompra de bonds, a empresa registraria um prejuízo menor, de 4,6 bilhões de reais no primeiro trimestre.
Já o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) ajustado seria de 36,9 bilhões de reais, em vez dos 37,5 bilhões de reais registrados.
O Ebitda ajustado teve alta de 36,4% na comparação com o mesmo trimestre do ano passado e avanço de 2,7% em relação ao quarto trimestre, apesar da redução do Brent, principalmente devido ao aumento das exportações, principalmente de petróleo, com níveis recordes em janeiro e fevereiro, quando a queda no Brent ainda era moderada em relação ao mês de março.
"Conseguimos aproveitar a valorização dos nossos petróleo e óleo combustível no mercado externo, graças ao IMO 2020, capturando ótimas margens no óleo combustível", afirmou.
A receita da empresa, por sua vez, foi de 75,5 bilhões de reais entre janeiro e março, alta de 6,5% ante o mesmo período do ano passado.
Na comparação com o quarto trimestre, a receita caiu 7,7%, devido à queda do Brent e ao menor volume de venda de derivados no mercado interno, com destaque para diesel, gasolina e querosene de aviação (QAV).
"Vale ressaltar que, mesmo com a crise e redução da demanda global por óleo e derivados, conseguimos manter a valorização dos nossos produtos no mercado internacional, devido ao seu baixo teor de enxofre", afirmou.
A dívida líquida da companhia aumentou 19,6% em relação ao quarto trimestre, para 380 bilhões de reais.
Em abril, a empresa reviu métricas de endividamento, com impactos decorrentes da pandemia.
(Por Marta Nogueira, Gram Slattery e Roberto Samora, em São Paulo)