Por Yew Lun Tian e Yimou Lee e Brenda Goh
XANGAI/TAIPÉ (Reuters) - Quando funcionários de um vilarejo chinês abordaram Hou no mês passado, chamando-o para trabalhar na maior fábrica de iPhones do mundo por pelo menos o dobro do salário normal, ele sabia que era arriscado.
Dezenas de milhares de trabalhadores fugiram da fábrica na China nas semanas anteriores e protestos violentos eclodiram devido ao lockdown pela Covid-19 e confusão sobre pagamento de bônus.
Mas Hou, 24, que pediu para ser identificado apenas pelo sobrenome, disse que aceitou o emprego na fábrica de Zhengzhou, pertencente à Foxconn (TW:2354). A companhia é a maior fabricante terceirizada da Apple (BVMF:AAPL34)(NASDAQ:AAPL), e produz 70% dos iPhones globalmente.
Hou disse que lhe prometeram até 30 mil iuans (4.200 dólares) por pouco menos de quatro meses de trabalho - muito acima dos 12 mil a 16 mil iuans que os trabalhadores da Foxconn costumam receber pelo mesmo período.
Ele disse, porém, que não havia negociado um período de 10 dias em quarentena, bem como uma notificação repentina de que os funcionários teriam que trabalhar mais um mês antes de receber os bônus.
Tais queixas, disseram Hou e dois outros trabalhadores, os levaram a confrontar a administração da Foxconn na fábrica -- uma 'cidade' com mais de 200 mil funcionários--, o que levou a protestos que viraram manchetes em todo o mundo.
Além dos desafios de manter as linhas da fábrica operando sob um sistema de circuito fechado exigido pela política de Covid-19-zero da China --o que deixa os trabalhadores isolados do resto do mundo-- a turbulência na Foxconn também expôs problemas de comunicação e desconfiança entre os funcionários da administração da empresa.
"Nada do que eles disseram valeu", disse Hou de sua cidade natal, depois de receber um pagamento de 10 mil iuans que a Foxconn ofereceu na quinta-feira aos manifestantes que concordaram em deixar a unidade.
Hou nunca chegou à linha de produção.
'Minha vida valia mais'
Cinco outros trabalhadores disseram na época que estavam com medo, pois a Foxconn começou a transferir pessoas com Covid-19 para um conjunto habitacional vago sem revelar as infecções, e disse aos trabalhadores para comer nos dormitórios ao invés das cantinas da empresa. Depois, porém, a companhia não conseguiu separar os trabalhadores infectados dos outros.
A Foxconn não comentou as alegações de Hou e outros trabalhadores. A empresa apenas fez referências a declarações que deu anteriormente.
A empresa mais cedo neste mês se desculpou com os trabalhadores por um "erro técnico" relacionado ao pagamento de bônus.
A Foxconn não disse por que estava pagando as pessoas para deixar a instalação logo depois de prometer bônus de contratação.
Se os problemas persistirem até dezembro, o custo de produção à Foxconn e à Apple será de cerca de 10 milhões de iPhones, o equivalente a cortar as entregas de iPhone em 12% no quarto trimestre, disse Christine Wang, analista da KGI Securities.
Os gerentes da Foxconn disseram que a empresa foi pega em uma posição difícil, tendo que acelerar as entregas antes da temporada de final de ano, a mais importante da Apple, enquanto seguia as rígidas diretrizes Covid do governo local.
"Houve pressão de todos, inclusive do governo local", disse um alto funcionário da Foxconn referindo-se às autoridades locais que se apressaram para ajudar a recrutar trabalhadores substitutos.
Um funcionário, Fay, disse que temia pegar Covid-19 e estava angustiado se deveria ficar mais duas semanas para reivindicar um bônus por concluir seu contrato de três meses. Eventualmente, ele disse, se arrastou por um buraco em uma cerca de metal verde.
"No final, decidi que minha vida valia mais."