PEQUIM (Reuters) - O surto do coronavírus na China testou os limites da liberdade de expressão nas redes sociais altamente censuradas do país, com uma breve janela de liberdade online que se abriu em janeiro sendo fechada pelas autoridades pouco depois.
Embora a censura na China tenha se intensificado sob o governo do presidente Xi Jinping, questões de transparência em torno do atual surto são especialmente sensíveis após Pequim acorbertar a extensão da epidemia SARS em 2003, alimentando suspeitas e desconfianças, e levando a pedidos oficiais para mais transparência desta vez.
O período de 19 de janeiro a 1º de fevereiro, quando a preocupação pública com o coronavírus explodiu no momento em que a China se preparava para o feriado do Ano Novo Lunar, viu um afrouxamento pouco característico na censura. O burburinho online sobre o surto aumentou, com os internautas bastante livres para criticar as autoridades locais - mas não os líderes do governo central - pela maneira como lidaram com a crise.
Esse afrouxamento chegou ao fim, com os censores na semana passada fechando grupos do WeChat e apagando posts em redes sociais, de acordo com repórteres chineses. As autoridades também repreenderam empresas de tecnologia que não controlaram o discurso online.
"Xi Jinping deixou claro que espera que os esforços para fortalecer 'a orientação da opinião pública' sejam aumentados", disse Fergus Ryan, analista do Instituto de Políticas Estratégicas da Austrália (ASPI), que estuda as mídias sociais chinesas.
"Já vimos cerca de 300 jornalistas enviados para Wuhan e arredores para relatar o surto. É muito provável que a orientação deles seja mostrar uma imagem mais positiva dos esforços do governo, em vez de se envolver em reportagens investigativas ou críticas".
A Administração do Ciberespaço da China (CAC) não respondeu a pedidos de comentários.
A máquina de censura da China foi testada na semana passada quando Li Wenliang, médico chinês que havia sido repreendido por emitir um alerta sobre o coronavírus, morreu da doença, provocando indignação generalizada.
Os meios de comunicação online tiveram permissão para relatar a morte de Li, mas não as repercussões que provocou, e as primeiras discussões nas mídias sociais pedindo que o governo de Wuhan pedisse desculpas ao médico sumiram mais tarde.
Um alerta enviado aos editores que trabalhavam em um canal de notícias chinês online e visto pela Reuters pediu que eles não "comentassem ou especulassem" sobre a morte de Li, não usassem hashtags e deixassem o tópico desaparecer gradualmente da lista de assuntos mais pesquisados.
"BOM AMBIENTE ONLINE"
A breve janela da liberdade de imprensa veio depois que autoridades em Wuhan, onde o surto começou, admitiram que a situação era muito pior do que o previsto e foram fortemente criticadas por sua mudança ao repreender oito pessoas em janeiro por "espalhar boatos" sobre o surgimento do vírus.
Na semana passada, no entanto, a CAC anunciou que havia punido alguns sites, aplicativos e contas de mídia social por publicar conteúdo ilícito sobre o surto, dizendo que queria promover um "bom ambiente online" em meio aos esforços do país para conter a epidemia.
Um alerta divulgado pela CAC na semana passada, que foi visto pela Reuters, pediu a veículos jornalísticos que intensificassem o controle sobre "informações e boatos prejudiciais" relacionados ao vírus.
O órgão também pediu que eles limittasem a divulgar informações da mídia oficial, como a Xinhua e o People's Daily, "para não divulgar nenhuma matéria negativa e não realizar transmissões ao vivo não oficiais do vírus".
Algumas matérias investigativas publicadas por meios de comunicação locais de Wuhan também foram excluídas.
(Reportagem da redação de Pequim)