Por Carolina Mandl e Tatiana Bautzer
SÃO PAULO (Reuters) - O SoftBank, cujo fundo de 5 bilhões de dólares para a América Latina está trazendo um volume inédito de recursos para as startups da região, também está cortejando fundos de venture capital locais, um movimento pouco comum para o investidor japonês que está revolucionando a cena tech na região.
A maneira mais comum de investir do SoftBank no mundo todo é colocar dinheiro diretamente nas startups, mas na América Latina ele reservou parte dos recursos para investir em fundos de venture capital.
A indústria de venture capital é relativamente incipiente na América Latina, e os investimentos do Softbank nos fundos ajudariam a estimular a inovação, particularmente no desenvolvimento de startups maiores, que são o principal alvo do Softbank.
Mas executivos da indústria dizem que os recursos do Softbank aplicados em venture capital são atrelados a exigências que vários fundos consideram desfavoráveis.
Fontes com conhecimento do assunto dizem que uma das condições impostas pelo Softbank é um direito de preferência para investir em empresas do portfolio dos fundos que decidam, num estagio posterior, levantar mais recursos ou que sejam colocadas à venda.
Isso poderia colocar o Softbank em vantagem como um potencial investidor líder em rodadas de financiamento futuras e também poderia dar ao conglomerado japonês vantagens em relação a outros investidores do mesmo fundo, segundo as fontes.
As fontes afirmam que o desejo do Softbank de obter vantagens pode provocar conflitos de interesse em relação a outros investidores, que também gostariam de ter o direito de co-investir com o fundo. Dois fundos brasileiros de venture capital rejeitaram as condições propostas pelo Softbank, segundo duas fontes com conhecimento do assunto.
O SoftBank também pede aos fundos que aceitem uma cláusula de não-competição por investimentos em startups menores e dêem prioridade ao conglomerado japonês nessas companhias, segundo uma das fontes.
A indústria de venture capital ainda é pequena na América Latina, com investimentos totais de apenas 2 bilhões de dólares no ano passado, embora este valor signifique o quádruplo do investido em 2016.
No Brasil, a maior economia da América Latina, a indústria de venture capital representa apenas 0,04% do PIB, enquanto nos Estados Unidos chega a 0,43%, e na China, 0.33%, segundo um relatório da McKinsey & Company.
Na primeira metade de 2019, os investimentos de venture capital na região chegaram a 2,6 bilhões de dólares, mais que o triplo dos 780 milhões de dólares do ano anterior, segundo dados da Association for Private Capital Investment in Latin America, conhecida como Lavca. Mais de um terço disso veio da aposta de 1 bilhão de dólares do Softbank numa única empresa, o aplicativo colombiano de entregas Rappi.
O Softbank pretende investir cerca de 500 milhões de dólares do capital do fundo de América Latina em outros fundos de venture capital, mas não informou até agora dados exatos de investimento.
A Reuters publicou em setembro que o Softbank tinha fechado acordos de investimento com dois fundos, o brasileiro Valor Capital e o argentino Kaszek Ventures, que recentemente anunciou ter captado 600 milhões de dólares de investidores. Não está claro se o Valor e o Kaszek aceitaram as condições demandadas pelo Softbank.
Representantes do Valor, Softbank e Kaszek preferiram não comentar o assunto.
AVALIAÇÃO
Não é incomum que investidores em venture capital liderem rodadas sucessivas de financiamento em startups, e que a avaliação da empresa aumente a cada rodada de investimento.
Mas uma das fontes disse que a melhor prática, tanto para investidores que atuam sozinhos como para fundos de venture capital, seria permitir que investidores que ainda não estejam na empresa participem das rodadas e dêem seu aval para as avaliações das empresas.
O fracassado IPO da empresa de gestão de edifícios comerciais WeWork, na qual o Softbank investiu mais de 10 bilhões de dólares, demonstrou como investidores externos discordaram da avaliação de 47 bilhões de dólares atribuída ao WeWork na última rodada de investimento privado.
A professora da Universidade de Columbia Donna Hitscherich vê a demanda de investidores como o Softbank de liderar rodadas sucessivas de financiamento como "uma demanda natural de investidores que apostaram numa empresa desde o início e não querem ser diluídos à medida em que a empresa cresce".
Na América Latina, o Softbank ainda não participou de rodadas sucessivas de financiamento, já que acabou de lançar seu fundo de investimento para a região.
A avaliação do aplicativo de entregas colombiano Rappi triplicou entre a rodada de financiamento liderada pelo fundo DST Global em setembro do ano passado e a de abril deste ano liderada pelo SoftBank.
(Reportagem adicional de Sam Nussey em Toquio)