Por Farah Master
HONG KONG (Reuters) - Viver sob as rigorosas restrições da Covid-19 da China nos últimos três anos causou tanto estresse e incerteza em Zhang Qi que ela passou a considerar não ter filhos.
Quando a China desmantelou de forma abrupta suas medidas rígidas contra a Covid-19 no mês passado, permitindo que o vírus se espalhasse livremente, a balança inclinou para um "não" definitivo, disse a executiva de comércio eletrônico de Xangai.
Histórias sobre mães e bebês que não puderam consultar médicos porque os hospitais estavam sobrecarregadas por infecções de Covid-19 foram fundamentais para Zhang.
"Ouvi dizer que dar à luz em um hospital público é simplesmente horrível. Eu realmente não cogito ter um bebê", disse a mulher, de 31 anos.
Um vislumbre das cicatrizes causadas pela pandemia na já sombria perspectiva demográfica da China pode vir à tona quando o país relatar seus dados populacionais oficiais de 2022 em 17 de janeiro.
Alguns demógrafos esperam que a população da China em 2022 apresente sua primeira queda desde a Grande Fome em 1961, uma mudança profunda com implicações de longo alcance para a economia global e a ordem mundial.
Os novos nascimentos para 2022 devem cair para mínimas recordes, com queda para menos de 10 milhões em relação aos 10,6 milhões de bebês do ano passado, que já eram 11,5% menores do que em 2020.
"Com esta virada histórica, a China entrou em um longo e irreversível processo de declínio populacional, pela primeira vez na China e na história do mundo", disse Wang Feng, professor de Sociologia da Universidade da Califórnia.
"Em menos de 80 anos, o tamanho da população da China pode ser reduzido em 45%. Será uma China irreconhecível para o mundo".
A população total da China aumentou em 480.000, para 1,4126 bilhão em 2021. A Organização das Nações Unidas (ONU) prevê que a população da China começará a diminuir este ano, o que colocará a Índia como país mais populoso do mundo.
Especialistas da ONU veem a população da China encolhendo em 109 milhões até 2050, mais que o triplo do declínio de sua previsão anterior em 2019.
(Reportagem adicional de Liz Lee, Joe Cash e redação de Pequim; Sophie Yu em Xangai e Angel Woo em Hong Kong)