BRASÍLIA (Reuters) - O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), considerado desafeto do Palácio do Planalto, foi eleito presidente da Câmara dos Deputados neste domingo, já no primeiro turno, e declarou que não será submisso ao governo, mas também não fará oposição.
Com a vitória, após uma das mais duras campanhas pela presidência da Casa, Cunha se torna o segundo na linha da sucessão presidencial, atrás somente do vice-presidente Michel Temer. No cargo, ele também terá papel decisivo na definição da pauta de votações e na decisão sobre outros temas, como a tramitação de processos de cassação de parlamentares e a instalação de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI).
Após a proclamação do resultado, simpatizantes do novo presidente da Câmara gritaram seu nome em plenário e houve queima de fogos comemorando a vitória do lado de fora do Congresso. Ao discursar logo depois de tomar posse, Cunha adotou tom conciliador.
"Estamos aqui para ser o presidente e não somente daqueles que votaram no nosso nome. As disputas se encerram na apuração e todos somos deputados iguais", disse.
"Nunca em nenhum momento nós falamos que seríamos oposição e também falamos que não seremos submissos e não seremos submissos", afirmou.
Apesar do tom mais ameno do que o da campanha, o novo presidente da Câmara voltou a afirmar que houve interferência do governo na disputa, mas disse que queria enviar uma "palavra de tranquilidade" ao Executivo.
"Não há de nossa parte nenhum jugo de retaliação", garantiu. "O Parlamento, pela sua independência, ele sabe reagir (à interferência) e ele reagiu no voto... Passada a disputa, isso é um episódio virado", acrescentou Cunha, que já se comprometeu a colocar em votação o segundo turno da proposta de emenda à Constituição do Orçamento Impositivo. A proposta obriga o governo federal a pagar as emendas parlamentares ao Orçamento, o que já ocorre atualmente por meio de um dispositivo da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
Cunha obteve 267 votos dos 513 deputados, vencendo o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), que tinha preferência do governo e recebeu 136 votos. O deputado Júlio Delgado (PSB-MG) ficou em terceiro com 100 votos e o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) foi votado por 8 colegas. Dois parlamentares votaram em branco.
Líder do PMDB na Câmara, Cunha foi uma aliado por vezes hostil ao governo da presidente Dilma Rousseff, colocando-se frontalmente contra o Executivo na votação de algumas matérias, como no novo marco regulatório dos portos.
Durante a campanha, ele negou que faria uma presidência de oposição, mas pregou a independência do Parlamento em relação ao Executivo, o que foi interpretado por membros do governo como uma ameaça à governabilidade.
"O governo sempre terá pela sua legitimidade a governabilidade, que sua maioria poderá dar no momento que ela for exercida, se for exercida", disse após vencer.
Também durante a disputa, Cunha entrou em choque com o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), e alertou que se o governo decidisse tomar lado na disputa haveria consequências.
Após a sessão que o elegeu, Cunha tentou mais uma vez assegurar que não se tornará um problema para o governo.
"Nós somos responsáveis o suficiente para saber que o país precisa de uma estabilidade política. E que nós não vamos ter estabilidade econômica sem estabilidade política. Não será a presidência da Câmara que vai provocar instabilidade. Não é esse o caso", disse a jornalistas.
PODER DISTRIBUÍDO
Pouco antes do resultado, Cunha disse no plenário durante seu discurso que "é bom para a sociedade e para o Parlamento" que o poder seja distribuído e que faria mal à Casa que o partido que comanda o Executivo, o PT, também comandasse o Legislativo.
E relacionou essa avaliação ao resultado da eleição presidencial, indicando que não teria dado ao PT "hegemonia política".
"Nós sabemos que as eleições, muito diferente das três últimas eleições, não tiveram uma hegemonia eleitoral, foi uma vitória eleitoral e a vitória eleitoral não dá condição para hegemonia política. Só a hegemonia eleitoral tem como consequência a hegemonia política", afirmou, em referência ao PT.
Em seu discurso, Chinaglia tentou evitar o carimbo de candidato oficial, dizendo que a Câmara é independente e não é um Poder subordinado porque ela é que decide as leis.
"O erro de se imaginar que a Câmara dos Deputados possa ser um Poder subordinado é não perceber que é a Câmara que decide as leis. Portanto, é a Câmara que decide a regra, é a Câmara que determina aquilo que os outros Poderes podem ou não podem fazer", disse.
Delgado, que teve 100 votos e era apoiado formalmente pelo PSDB, disse que era o único capaz de garantir a independência da Casa, porque essa é a postura do seu partido, que não se coloca como oposição clássica.
"Foi dito aqui que PT exerce poder central e não poderia exercer o poder aqui na Câmara. Ora, o PMDB exerce a vice-presidência e acabou de eleger o presidente do Senado", contestou o socialista.
Os deputados também elegeram os que ocuparão os demais cargos da Mesa Diretora da Câmara. Na primeira vice-presidência, foi eleito Waldir Maranhão (PP-MA), na segunda vice-presidência, Giacobo (PR-PR), na primeira secretaria, Beto Mansur (PRB-SP), na segunda secretaria, Felipe Bornier (PSD-RJ), na terceira secretaria, Mara Gabrilli, e para a quarta secretaria, Alex Canziani (PTB-PR).
(Por Jeferson Ribeiro e Maria Carolina Marcello, com reportagem de Eduardo Simões em São Paulo)