Por Jeferson Ribeiro
BRASÍLIA (Reuters) - O voto no domingo encerrará a eleição presidencial mais emocional que o país viveu no período recente, marcada pela morte de um candidato à Presidência no meio da disputa, pela espetacular arrancada de outro candidato para chegar ao segundo turno e por uma reta final de radicalização exacerbada.
A presidente Dilma Rousseff, que concorre à reeleição pelo PT, e seu marqueteiro João Santana apostaram forte na emoção no começo da campanha na TV, contando histórias dramáticas com finais felizes de brasileiros que superaram dificuldades e tiveram conquistas graças aos programas do governo.
Quando a propaganda na TV começou, no entanto, era difícil superar a comoção causada pela trágica morte seis dias antes do então candidato do PSB, Eduardo Campos, em um acidente aéreo em Santos.
"Não vamos desistir do Brasil", frase dita por Campos na entrevista ao Jornal Nacional na véspera de sua morte, ecoava em boa parte do eleitorado e impulsionava a subida nas pesquisas de Marina Silva, que o substituiria na cabeça de chapa do PSB.
A ex-senadora saltou de 21 por cento das intenções de voto para 34 por cento em 15 dias, passando Aécio e empatando com Dilma, segundo o Datafolha. E chegou a apresentar uma vantagem de 10 pontos percentuais em relação a Dilma numa eventual disputa de segundo turno.
A decisão de Marina de assumir a candidatura também despertou reações. Inicialmente, não era uma unanimidade no PSB conduzir a ex-senadora, filiada à legenda a menos de um ano, ao lugar de Campos como candidata a presidente. Marina juntou-se ao PSB depois da tentativa fracassada de criar seu partido, a Rede Sustentabilidade
Quando se tornou presidenciável pelo PSB houve uma troca da coordenação da campanha. O então secretário-geral do partido, Carlos Siqueira, hoje presidente da legenda, deixou o posto de coordenador alegando que não trabalharia com "uma hospedeira", que não respeitava o PSB.
Naquele momento, as campanhas de Dilma e Aécio estavam atordoadas com a arrancada de Marina nas pesquisas. Os petistas tentavam refazer a estratégia, montada toda para a polarização com o PSDB, enquanto a campanha tucana entrou em pane, quando as intenções de voto em Aécio caíram a 14 por cento no final de agosto.
Nos primeiros dias de setembro, muito antes da votação de primeiro turno, o coordenador da campanha do PSDB e presidente do DEM, senador José Agripino (RN), chegou a sinalizar que já se pensava numa estratégia de apoio à Marina no segundo turno. Um boato sobre a possível renúncia do tucano à candidatura também circulou no mercado.
Na época, segundo relato de tucanos que integram o comitê de campanha, só Aécio acreditava que poderia chegar ao segundo turno e havia ainda um grande abatimento da parte dele com a morte de Campos.
Do lado do PT, a emoção era de outro tipo.
Além da incerteza que Marina causava nos estrategistas da campanha, havia grande apreensão no governo e na campanha com os vazamentos do depoimento do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, dando conta de um suposto esquema de corrupção que teria beneficiado políticos da base aliada de Dilma no Congresso, governadores aliados e até mesmo um ministro. [nL1N0R62T0]
A denúncia, divulgada pela revista Veja, pegou os petistas de surpresa e causou ainda mais temor sobre o sucesso do projeto de reeleição de Dilma.
"Eu não sei o que dizer. Não sabemos o impacto e o alcance desse denúncia", disse à Reuters um ministro logo após a circulação da revista.
ARTILHARIA PESADA
Após um começo mais focado em propostas e biografias, as campanhas de Aécio e Dilma na TV partiram para o confronto direto com Marina e os ataques à candidata do PSB e ao seu programa de governo se intensificaram.
Dilma usou artilharia pesada ao questionar na TV a capacidade de governabilidade de um eventual governo de Marina, citando os ex-presidentes Fernando Collor de Mello e Jânio Quadros, que não concluíram os mandatos, como momentos em que o país escolheu "salvadores da pátria" e "chefes do partido do eu sozinho". Jânio renunciou, e Collor sofreu impeachment. [nL1N0R31E9]
Dias depois, Aécio começou a ligar a imagem de Marina ao PT, dizendo que ela não poderia representar um projeto de mudança se tinha se mantido no partido durante o escândalo do mensalão. [nL1N0R601Z]
A TV foi uma arma eficaz para os adversários da candidata do PSB, porque dispunham de mais tempo para atacá-la. Dilma tinha 11 minutos e 24 segundos de tempo na TV, Aécio contava com 4 minutos e 35 segundos, enquanto Marina tinha apenas 2 minutos e 3 segundos.
Sob fogo cerrado, Marina passou a perder intenções de voto e, em setembro, as pesquisas registravam o estrago causado pelas campanhas de ambos.
Parte da campanha negativa contra Marina baseou-se, principalmente, no programa de governo, que desde o lançamento provocou polêmica.
Um dia após ser lançado, o programa passou por alterações no capítulo sobre lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT), retirando do texto original o apoio a projetos de lei e emendas à Constituição garantindo "o direito ao casamento civil igualitário na Constituição e no Código Civil".
Marina justificou a alteração por um erro de "editoração" do programa, mas o estrago estava feito. E outras propostas passaram a ser atacadas, como a de autonomia legal do Banco Central.
No fim de setembro, pesquisa Datafolha mostrava a perda de força de Marina. Dilma tinha 40 por cento das intenções de voto, enquanto a ex-senadora estava com 25 por cento, e mais próxima de Aécio, que conseguira se recuperar e chegava a 20 por cento. [nL2N0RV357]
Aécio fazia uma campanha pela "onda da razão" a poucos dias da votação, numa tentativa de baixar o tom emocional da campanha, mas a tensão dava sinais de que duraria até a apuração dos votos após o fechamento das urnas.
No sábado antes da votação no dia 5 de outubro, no entanto, o Datafolha mostrou Aécio numericamente à frente de Marina pela primeira vez. Ele tinha 26 por cento dos votos válidos, contra 24 por cento dela.
A abertura das urnas, porém, revelou uma vantagem muito maior para o tucano, que chegou a 33,6 por cento dos votos válidos, contra 21,3 por cento de Marina. Dilma teve 41,6 por cento. [nL2N0S0173]
CAMPO DE GUERRA
Passado o primeiro turno, a decisão de Marina de apoiar Aécio foi cercada de mais suspense do que se previa num primeiro momento. Mas em um evento conjunto em São Paulo, no qual deixou o tradicional coque de lado, a detentora de mais de 22 milhões de votos anunciou o apoio ao tucano.
Se os eleitores achavam que já tinham visto um festival de ataques bem maior do que nas eleições recentes, não tinham ideia do que petistas e tucanos preparavam para o segundo turno.
A radicalização da campanha em dados momentos chegou a lembrar o grau de enfrentamento ocorrido no segundo turno de 1989, disputado por Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Mello.
As campanhas na TV não perdoaram as biografias pessoais dos candidatos, envolveram seus parentes e as estratégias de agressão eletrônica invadiram os debates na TV entre os dois.
Nos dois primeiros encontros, na TV Bandeirantes e no SBT, Dilma e Aécio usaram o confronto direto para trocar ofensas na maior parte do tempo. [nL2N0SA090]
Nas redes sociais, onde os dois exércitos digitais e os militantes não se enfrentar diretamente no primeiro turno, a campanha se tornou rasteira, com difamações espalhadas por ambos os lados. Os dois candidatos se dizem alvos de mentiras e calúnias nesse terreno, onde não há regras.
E esse será o signo da eleição até domingo, quando, tudo indica, a decisão apertada os eleitores só deverão conhecer no final da apuração.