Por Daria Sito-Sucic
SARAJEVO (Reuters) - Maria Rosa Mayer Muños e seu marido Ludwig Gisch eram um casal argentino que vivia na capital eslovena desde 2017, cada um dirigindo uma empresa e levando uma vida tranquila em um pacato bairro com seus dois filhos.
Isso acabou se revelando uma fachada completa, exposta quando a polícia secreta invadiu sua casa em Liubliana no início de dezembro de 2022 e deteve a dupla, identificando-os como agentes adormecidos russos Artyom Dultsev e Anna Dultseva.
A Agência de Segurança e Inteligência da Eslovênia os encontrou com base em uma dica de uma agência de inteligência estrangeira, disse nesta sexta-feira Vojko Volk, secretário de Estado do gabinete do primeiro-ministro. Ele não especificou de qual país era a agência.
A dupla passou quase 20 meses detida.
Em um julgamento secreto organizado às pressas na quarta-feira, um tribunal esloveno condenou os Dultsevs a um ano e sete meses de prisão após eles se declararem culpados de acusações de espionagem e uso de identidades falsas.
A dupla já havia cumprido a pena e, portanto, seria deportada e proibida de entrar na Eslovênia por cinco anos, informou o tribunal distrital de Ljubljana em seu site. O tribunal não informou quando os dois russos seriam deportados.
No dia seguinte, tudo ficou claro.
Na quinta-feira, os Dultsevs e seus filhos foram levados de avião para Moscou como parte da maior troca de prisioneiros ocidentais e russos desde a Guerra Fria.
Eles foram recebidos pelo presidente Vladimir Putin, que abraçou calorosamente Dultseva e a presenteou com flores.
O primeiro-ministro esloveno Robert Golob estava orgulhoso de seu país de cerca de 2 milhões de habitantes ter participado da troca, dizendo em uma coletiva de imprensa em Ljubljana na sexta-feira:
"A Eslovênia prosperou em tempos históricos. Com isso, a Eslovênia provou mais uma vez que o poder que temos no cenário internacional é significativamente maior do que o nosso tamanho."
A confiança entre os líderes é crucial em situações tão secretas, disse Golob, acrescentando que o presidente dos EUA, Joseph Biden, ligou na quinta-feira para agradecer pessoalmente a ele e à nação eslovena "por essa contribuição fundamental para salvar vidas inocentes das prisões russas".
PRIMEIRAS CONVERSAS SECRETAS COM A RÚSSIA
Volk disse que as conversas sobre a possibilidade de os espiões integrarem um intercâmbio começaram logo após a prisão deles.
"Durante um ano, as conversas sobre isso foram mantidas com o lado russo em total sigilo", disse ele a jornalistas.
Conversas sobre a troca de prisioneiros, nas quais a Alemanha também seria incluída, também foram mantidas com a vice-presidente dos EUA, Kamala Harris, nos bastidores da Conferência de Segurança de Munique, em fevereiro, disse Volk.
Os Dultsevs têm uma menina e um menino de 11 e 8 anos, segundo a mídia eslovena.
Os pais levaram sua vida dupla de forma tão completa que as crianças souberam que eram russas somente após a decolagem do voo, não falavam russo e não sabiam quem era Putin, disse o Kremlin nesta sexta-feira.
"É assim que os 'ilegais' trabalham. Eles fazem tais sacrifícios por dedicação ao seu trabalho", disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, a jornalistas.
As crianças foram colocadas em um orfanato após a detenção de seus pais, mas continuaram a frequentar uma escola internacional em Ljubljana, de acordo com relatos da mídia eslovena.
A Agência de Segurança e Inteligência da Eslovênia descreveu em documentos como os chamados "ilegais" são na verdade espiões que primeiro treinam por anos em sua terra natal, depois deixam a Rússia e abandonam o contato com familiares para que nada os conecte à Rússia.
(Reportagem adicional de Aleksandar Vasovic)