SÃO PAULO (Reuters) - Centrado em um relacionamento homossexual, temática já explorada pela cineasta francesa Catherine Corsini em “La Répétition” (2001), “Um Belo Verão” procura uma abordagem moderna.
Até surgirem os carácteres indicando a mudança da protagonista para a Paris de 1971, as cenas campestres nos primeiros minutos não deixam claro ao espectador desavisado que se trata de um filme de época.
Mesmo a seleção de músicas do período, majoritariamente de intérpretes femininas, de Janis Joplin a Colette Magny, é confrontada com uma canção da banda contemporânea The Rapture, que confere modernidade em uma cena-chave.
O proposital conflito estético que extrapola a trilha sonora só externa os choques que compõem a trama, que capta a efervescência do movimento feminista na França naquele início dos anos 1970 através da paixão arrebatadora da garota do campo Delphine (a cantora de rock e atriz Izïa Higelin) com a urbana e revolucionária Carole (a estrela belga Cécile De France).
A narrativa e o desenvolvimento dos personagens são construídos justamente nas oposições surgidas entre a cidade e o campo, homossexualidade e heterossexualidade, feminismo e submissão, prazer e dever, conformismo social e felicidade pessoal.
A produção exibida no último Festival do Rio e também no Varilux de Cinema Francês, não se estende muito ao apresentar o cotidiano de Delphine em uma fazenda na região de Limousin, onde seu pai (Jean-Henri Compère) a questiona por não arranjar um namorado.
Enquanto isso, ela sofre o fim de seu caso secreto com uma moça, que decidiu se casar com seu noivo, e se esquiva das tímidas investidas do amigo Antoine (Kévin Azaïs, de “Amor à Primeira Briga”). Logo a jovem decide tentar a vida em Paris, onde a agora operária começa a participar das reuniões e ações de um grupo feminista, embora seu interesse esteja, na verdade, na líder Carole.
Apesar de tão progressista, a professora de espanhol que vive com o namorado Manuel (Benjamin Bellecour) teme, a princípio, experimentar pela primeira vez uma nova faceta de sua sexualidade em um relacionamento com uma mulher. Mais consciente e confortável com sua orientação sexual, Delphine, por sua vez, sufoca sua aceitação pessoal pela preocupação pela situação do pai doente, da fazenda familiar e pelo medo da reprovação dos parentes e moradores de sua cidade.
Tal complexidade é um prato cheio para a composição das atrizes principais, com Higelin, de “Samba”, esbanjando química com De France, que, antes de fazer “Além da Vida” (2010) e “O Garoto de Bicicleta” (2011), surgiu em papéis lésbicos marcantes, como em “Albergue Espanhol” (2002).
Não por menos, a atriz belga foi indicada ao César por sua performance como Carole, assim como Noémie Lvovsky, que imprime grande força na pele da mãe de Delphine, representando um tipo de mulher a luta urbana do feminismo não consegue alcançar.
Mesmo com o grande uso de primeiros planos, Corsini filma o sexo entre as protagonistas evitando o choque do vulgar, mas sem se entregar a uma visão pudica da relação das duas. O contraste da fotografia de Jeanne Lapoirie vem da contraposição entre a solaridade das personagens femininas e as sombras que mantêm em segredo a relação delas.
Conhecida pela sua predileção pelo melodrama, como visto em seus únicos lançamentos comerciais aqui, “Partir” (2009) e “3 Mundos” (2012), a diretora atinge a moderação neste longa premiado em Locarno.
Seu olhar afetivo para as personagens supera o roteiro até convencional, escrito por ela em conjunto com Laurette Polmanss, mas não tem êxito em criar uma transição orgânica entre o trecho no campo e o da cidade, com suas diferenças de tom. Neste choque, o romance acaba sobrepondo o drama histórico e social, enquanto toda a série de oposições da história e conflitos internos das protagonistas parece já ditar seus destinos.
(Por Nayara Reynaud, do Cineweb)
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