SÃO PAULO (Reuters) - “Nunca me sonharam” é um documentário sobre um assunto sério e relevante. Entretanto, sua estética, sua trilha sonora onipresente, entre outras coisas, o fazem parecer uma espécie de reclame para ser exibido, em partes, no intervalo de algum telejornal do horário nobre.
Em suas intenções e visual, lembra muito uma série institucional produzida pelo antigo banco Bamerindus veiculada nos intervalos do Jornal Nacional, aos sábados, chamado “Gente que faz”, sobre pessoas comuns e seus grandes feitos. Já este filme poderia ser chamado de “Gente que estuda” e é patrocinado pelo Instituto Unibanco.
Dirigido por Cacau Rhoden, o documentário é nobre em suas intenções. Um grupo de jovens estudantes do ensino médio público do Brasil fala sobre seu presente, sonhos e expectativas para o futuro. O diagnóstico é que não é fácil ser jovem e estudante de escola pública no Brasil de hoje, sendo preciso superar as pressões da sociedade e as dificuldades de um país que não investe na educação.
Até aí, nada de novo. O que o filme procura é dar voz a esses próprios adolescentes, que contarão suas vidas e o que esperam do que está por vir. Isso também, no cinema documental brasileiro recente, não é exatamente uma novidade. João Jardim, com “Pro Dia Nascer Feliz” (2006), e Eduardo Coutinho, com seu póstumo “Últimas Conversas” (2014), abordaram as mesmas questões com um pouco mais de profundidade e complexidade.
Logo no começo do filme, a jovem poeta Mel Duarte, diz: “A gente tem direito de fala, a gente tem direito de escolha”. O documentário tenta materializar esses direitos, mas, estranhamente, a todo momento, entrevistas com adultos especialistas em diversos assuntos entram em cena para chancelar os depoimentos dos estudantes. Essas intervenções não deixam de soar como avalizadores das entrevistas daqueles que são, em tese, os protagonistas.
Entre esses especialistas há alguns que certamente justificam sua aparição. Como o filósofo e professor Renato Janine Ribeiro, o psicanalista e professor Christian Dunker, a antropóloga Regina Novaes, além de uma série de educadores e educadoras do ensino público diretamente ligados ao tema do filme, vários deles envolvidos em projetos sociais. Os únicos que não fazem muito sentido ali são dois economistas – Ricardo Paes de Barros, do Instituto Ayrton Senna e professor do Insper, e Ricardo Henriques, do próprio Instituto Unibanco – cujas falas não vão além daquilo que todo mundo já sabe.
De qualquer forma, mesmo não se sustentando muito como cinema, “Nunca Me Sonharam” cumpre a sua função de levantar um debate e deve funcionar como um elemento fomentador de discussão – especialmente dentro das próprias escolas públicas.
(Por Alysson Oliveira, do Cineweb)
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