SÃO PAULO (Reuters) - Ninguém sabe ao certo onde Norman Oppenheimer (Richard Gere) mora. Poderia até ser nas ruas de sua Nova York, mas parece que não. Ele é um sujeito com contatos e generosidade suficientes para compartilhar com amigos e até gente que mal conhece.
O personagem-título de “Norman: Confie em Mim”, primeiro filme em língua inglesa do norte-americano radicado em Israel Joseph Cedar (“Beaufort”), tem como protagonista essa figura que beira o tóxico, com seus excessos de altruísmo, disfarçando seus interesses e ego.
Outrora conhecido com símbolo sexual com filmes como “Gigolô Americano” e “Uma Linda Mulher”, Gere deixa de lado sua persona pelas qualidades físicas para seduzir pela agenda de contatos, alguns nem tão autênticos quanto ele desejaria. No fundo, toda essa fanfarronice mascara uma profunda solidão.
A ascensão de Norman começa quando faz amizade com um proeminente político israelense que está visitando Nova York, Micha Eshel (Lior Ashkenazi). O protagonista compra um caríssimo par de sapatos para o novo amigo. Três anos depois, o político é eleito primeiro-ministro e, surpreendentemente, ainda se lembra do protagonista, a quem não via desde aquele episódio.
O que é ainda mais surpreendente é que Norman ganha um cargo na administração de Eshel. É uma figura praticamente decorativa, mas que ainda assim atrai o interesse de diversas pessoas.
Nesse momento, começam a aparecer novos personagens na vida de Norman, todos com alguma agenda própria: o sobrinho ambicioso (Michael Sheen), um rabino (Steve Buscemi), um magnata (Harris Yulin) e seu assistente (Dan Stevens), e, por fim, uma funcionária diplomática (Charlotte Gainsbourg).
As conexões do protagonista seguem num crescendo até que um escândalo político introduz novos contornos. A partir dessa virada de tom, o filme não consegue mais se recuperar, tomando um caminho acidentado e perdendo parte de seu charme.
Norman, como dizem outros personagens, é um “judeu generoso” e, através dele, Cedar subverte todo o estereótipo pejorativo de personagens judeus mesquinhos, desde o Shylock de “O Mercador de Veneza”, de Shakespeare, até Fagin, de “Oliver Twist”, de Charles Dickens.
Muito do protagonista aqui depende da aura de confiança que ele é capaz de transmitir aos outros personagens. É preciso que eles acreditem nos contatos dessa figura um tanto desalinhada, que nunca tira seu pesado sobretudo ou larga o celular.
O filme só funciona em determinados segmentos pela confiança que Gere é capaz de transmitir, com sua voz pesada e atitudes inesperadas. Norman é exagerado, chega a ser chato em sua insistência, e, ainda assim, as pessoas (ou, pelo menos, a maioria delas) lhe dão atenção.
Do alto de seus quase 70 anos, Gere poderia ter se reinventado como herói de filmes de ação --como seus contemporâneos Liam Neeson e Bruce Willis-- mas foi por um caminho completamente oposto, envolvendo-se com filmes mais calcados em estudos de personagens complexos.
Nem sempre ele acerta, mas aqui, se há uma grande qualidade em “Norman”, é a performance repleta de nuances e compreensão de um personagem nem sempre agradável.
(Por Alysson Oliveira, do Cineweb)
* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb