Por Jeff Mason e Doina Chiacu e Patricia Zengerle
WASHINGTON (Reuters) - A exigência nesta semana do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, a Israel para que melhore as condições humanitárias na Faixa de Gaza e apoie um cessar-fogo atraiu ataques tanto de aliados frustrados, que classificaram a reação como muito tímida, quanto de opositores, para quem o mandatário foi longe demais.
Na quinta-feira, em telefonema ao primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, Biden ameaçou condicionar o apoio dos EUA para a ofensiva israelense na Faixa de Gaza à tomada de atitudes concretas por Israel para proteger trabalhadores de ajuda humanitária e civis.
Foi a primeira vez que Biden, um democrata e um firme defensor de Israel, buscou usar a ajuda norte-americana para influenciar o comportamento militar israelense.
O presidente enfrenta enorme pressão da ala mais à esquerda de seu partido para que faça mais quanto à catástrofe humanitária sofrida pelos palestinos civis em decorrência dos ataques de Israel.
"Não deve haver um cheque em branco. Não devíamos ter um padrão no qual o governo Netanyahu ignora o presidente dos Estados Unidos e mesmo assim precisamos mandar mais 2.000 bombas", disse à Reuters o senador Chris Van Hollen, um democrata.
Membro do Comitê de Relações Exteriores do Senado, Van Hollen afirmou que Biden também deveria ser publicamente mais "vocal" sobre as expectativas dos EUA para a campanha em Gaza e adotar uma nova abordagem no Conselho de Segurança da ONU, em vez de bloquear resoluções contrárias a Israel.
Outros políticos de esquerda fizeram reclamações semelhantes. O senador Bernie Sanders, um independente que concorre eleitoralmente como democrata, disse ao podcast Pod Save America na quinta-feira: "Em um dia o presidente está 'bravo' com o Netanyahu; no outro dia, 'muito bravo'; no outro, 'muito, muito bravo'. E? Ao mesmo tempo há apoio para mais ajuda militar (a Israel) em um projeto de lei suplementar".
Israel disse que aprovou a reabertura da passagem de Erez, para o norte de Gaza, e o uso temporário do porto de Ashdod, no sul de Israel, seguindo exigências dos EUA para aumentar o fornecimento de ajuda humanitária para Gaza.
REPUBLICANOS E FAMÍLIAS DE REFÉNS
Enquanto muitos democratas criticam Biden por não fazer o suficiente, alguns republicanos, em geral mais favoráveis à ajuda militar a Israel, atacaram a nova tática de Biden.
O senador Tom Cotton acusa o presidente de usar a mudança no discurso para aumentar suas chances na eleição deste ano.
"Para ajudá-lo nas pesquisas no Michigan, Joe Biden acaba de fortalecer a posição de negociação do Hamas. Ele efetivamente incentivou o Hamas a aguentar e não soltar os reféns. Vergonhoso", afirmou, pela rede social X.
O Comitê de Regras da Câmara dos Deputados, comandado pelos republicanos, anunciou nesta sexta-feira que vai considerar a aprovação de uma resolução que "se opõe aos esforços de colocar pressão unilateral sobre Israel em relação à Faixa de Gaza, incluindo pedidos para um cessar-fogo imediato".
O deputado Brian Mast, membro do Comitê de Assuntos Externos da Casa, acusou Biden de "tentar agradar os lunáticos da extrema-esquerda exigindo que Israel aceite um cessar-fogo com terroristas".
As famílias dos reféns levados pelo Hamas em 7 de outubro dizem que um cessar-fogo sem a soltura dos cativos pode ser perigoso.
"Um cessar-fogo sem acordo -- ou sem mesmo um acordo parcial --, pode ser a sentença de morte para nosso filho e outros reféns", disse Orna Neutra, mãe de Omer Neutra, em coletiva de imprensa com outras famílias em Nova York.
OPORTUNIDADE NÃO EXPLORADA?
A Casa Branca não explicou como a política dos EUA mudaria caso Israel não atenda às exigências de Biden.
Israel recebeu mais ajuda externa dos EUA do que qualquer outro país desde a Segunda Guerra Mundial, embora a assistência anual tenha sido reduzida por dois anos pelo financiamento e envio de equipamentos militares à Ucrânia desde a invasão russa em 2022.
Tradicionalmente, os Estados Unidos protegem Israel no Conselho de Segurança da ONU e chegaram a vetar três projetos de resolução sobre a guerra em Gaza. Mas também se abstiveram três vezes para permitir que o conselho de 15 membros tomasse medidas -- mais recentemente no mês passado, quando exigiu um cessar-fogo imediato.
Israel entrou em ação logo depois que Biden bateu o pé, observa Kenneth Roth, ex-diretor executivo da Human Rights Watch e agora professor da Escola de Assuntos Públicos e Internacionais da Universidade de Princeton, sugerindo que isso deveria ter ocorrido antes.
"Poucas horas depois de Biden ameaçar suspender a ajuda militar dos EUA a Israel, Netanyahu concorda em abrir uma importante passagem para ajuda humanitária no norte de Gaza, onde a fome é generalizada. Biden sempre teve essa vantagem, mas não a usou", disse.
Questionado pela Reuters na quinta-feira por que Biden havia mudado de posição, o porta-voz da Casa Branca, John Kirby, disse que o presidente havia sido abalado pelo ataque israelense que matou sete trabalhadores humanitários do World Central Kitchen (WCK).
"Acho que algumas mortes contam muito mais do que outras", disse Patrick Gaspard, presidente do think tank de tendência progressista Center for American Progress, comparando a reação de Biden às mortes dos sete trabalhadores humanitários com as milhares de pessoas já mortas na guerra de Gaza.
(Reportagem de Jeff Mason, Patricia Zengerle, Doina Chiacu e Kanishka Singh)