CIDADE DO VATICANO (Reuters) - O papa Francisco foi criticado nesta segunda-feira por ter dito a jovens russos que se lembrem do fato de serem herdeiros de czares como Pedro, o Grande, que foi usado pelo presidente do país, Vladimir Putin, como exemplo para justificar a invasão da Ucrânia.
Autoridades ucranianas afirmaram que os comentários, feitos por Francisco na sexta-feira em um sermão ao vivo e transmitido por vídeo a jovens católicos reunidos em São Petersburgo, foram “profundamente lamentáveis”.
Francisco primeiro leu o discurso preparado em espanhol, mas no final mudou de improviso para o italiano e disse: “Não esqueçam da sua hereditariedade. São herdeiros da grande Rússia, a grande Rússia dos santos, dos reis, a grande Rússia de Pedro, o Grande, de Catarina II, do grande império russo, de cultura, de tanta cultura, de tanta humanidade. Vocês são herdeiros da grande mãe Rússia. Em frente”.
O Vaticano publicou no sábado o texto do discurso, mas não incluiu o improviso. Um vídeo com o papa fazendo os comentários foi publicado em websites religiosos.
“É exatamente essa propaganda imperialista, os ‘laços espirituais’ e a ‘necessidade’ de salvar ‘a grande Mãe Rússia’ que o Kremlin usa para justificar a morte de milhares de ucranianos e a destruição das cidades e vilarejos ucranianos”, afirmou Oleg Nikolenko, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia, no Facebook (NASDAQ:META).
“É profundamente lamentável que a noção de ser uma grande potência, que contribui em essência para a crônica agressividade da Rússia, seja ecoada pelo papa, consciente ou inconscientemente”, completou.
O website italiano Il Sismografo, que é especializado em assuntos católicos, chamou em editorial as palavras do papa de “estranhas” neste atual momento da história. A publicação lembrou que Catarina anexou a Crimeia em 1783. Ela também protegeu jesuítas em terras controladas pela Rússia depois que o papa Clemente XIV suprimiu a ordem em todo o mundo em 1773. Francisco é um jesuíta.
Tributo ao czar
No ano passado, Putin homenageou Pedro, o Grande, outro líder russo mencionado pelo papa, traçando um paralelo entre suas próprias missões históricas, de recuperar terras russas.
Putin tem tentado justificar as ações russas na Ucrânia propondo uma visão da história que defende que a Ucrânia não possui identidade nacional ou tradição de Estado.
“Isso é realmente revoltante”, afirmou o ex-presidente da Estônia, Toomas Hendrik Ilves, na rede social X, antigamente conhecida como Twitter.
Francisco já classificou as ações russas na Ucrânia como brutais, cruéis e ferozes. Ele também disse que a invasão violou a autodeterminação do país e cita uma “Ucrânia martirizada” em quase toda aparição pública desde o início da invasão, em fevereiro de 2022.
Contudo, ele já cometeu uma série de gafes falando de improviso. No ano passado, referiu-se à ultranacionalista russa Darya Dugina, morta pela explosão de um carro-bomba perto de Moscou, como uma vítima inocente da guerra.
(Reportagem adicional de Ron Popeski)