Por Tannur Anders
JOANESBURGO (Reuters) - Um inquérito com o objetivo de determinar a responsabilidade por um incêndio em Joanesburgo que matou 77 pessoas começou nesta quinta-feira, expondo as condições de vida das vítimas e revelando as gangues que se apropriam de prédios abandonados e os alugam.
Um dos piores desastres já registrados no centro econômico da África do Sul, o incêndio aconteceu em 31 de agosto em um edifício em ruínas, lotado de migrantes, a maioria deles estrangeiros. Muitas das vítimas foram queimadas ao ponto de seus corpos ficarem impossíveis de ser reconhecidos.
Lucas Thipe, um comandante de pelotão do corpo de bombeiros da cidade de Joanesburgo, contou sua experiência no inquérito.
O incêndio se apresentou de forma “anormal”, com chamas violentas escapando pelas janelas, obrigando os serviços de emergência a iniciarem o combate ao incêndio pelo exterior do edifício.
“Enquanto estávamos ocupados tentando entrar, uma senhora veio até mim, ela estava gritando... ela queria entrar no prédio, ela tinha um bebê lá dentro”, disse Thipe.
“Então liguei para a equipe, mandei eles passarem com uma linha de ataque de fogo... nas escadas, quando eles entraram, viram uma pilha de corpos, eles viram cerca de quatro corpos.”
Os moradores disseram quando o desastre ocorreu que o edifício tinha sido tomado por grupos criminosos que cobram taxas aos ocupantes, explorando-os, mas também oferecendo habitação mais acessível àqueles que de outra forma poderiam ficar desalojados.
“Quando um edifício é 'sequestrado', torna-se uma bomba-relógio”, disse ao inquérito o chefe interino dos Serviços de Gestão de Emergências da cidade de Joanesburgo, Rapulane Monageng.
Ele listou uma série de riscos para incêndio identificados até agora: rotas de fuga de emergência bloqueadas, escadas convertidas em salas improvisadas e madeira trazida de fora para salas divisórias para criar barracos de madeira improvisados no térreo, onde cerca de 200 pessoas estavam amontoadas, disse.
Também ficou evidente a falta de extintores de incêndio e o desvio de água dos equipamentos de supressão de incêndio para uso doméstico.
Os moradores desses edifícios dependem de ligações elétricas ilegais, fogões a gás e -- quando ocorrem os apagões de energia no país -- de velas, o que aumenta o risco de incêndios.
Joanesburgo é uma das cidades mais desiguais do mundo, com pobreza generalizada, desemprego e uma crise habitacional de longa data. A cidade tem cerca de 15 mil moradores de rua, segundo o governo de Gauteng, província que inclui a cidade.
As autoridades da cidade de Joanesburgo tinham alugado o edifício posteriormente destruído a uma instituição de caridade que fornece abrigo para mulheres em 2016. Mas a instituição de caridade ficou sem dinheiro e parou de funcionar, disseram os residentes.
(Reportagem de Tannur Anders)