Por Pete Vernon
JOHANESBURGO (Reuters) - A África do Sul que vai sediar a Conferência da Aids na semana que vem mudou muito em relação ao "pária da Aids" que fez o mesmo 16 anos atrás, quando o então presidente sul-africano Thabo Mbeki surpreendeu ao minimizar o elo entre o vírus HIV e a doença.
Situada no epicentro da pandemia mundial de Aids, a África do Sul hoje se gaba de ter o maior programa de tratamento do mundo –3,4 milhões de pessoas recebem os medicamentos antirretrovirais (ARV) que permitem aos portadores de HIV viver vidas normais.
O contraste com a era Mbeki, durante a qual o ministro da Saúde louvou a beterraba e a batata africana como remédios para a Aids e centenas de delegados abandonaram a conferência quando o presidente deu a entender que a pobreza poderia ser a principal causa da doença, não poderia ser maior.
Durante sua presidência, Mbeki endossou um movimento alternativo que negava a existência do HIV e resistiu a pressões internas e internacionais para tratar da crise de Aids com seriedade. Em vez disso, ele rejeitou os ARVs, dizendo se tratar de invenções ocidentais com efeitos colaterais nocivos.
"Os pacientes estavam morrendo como moscas. Nós os tratávamos com muito amor e carinho e vitaminas. Não tínhamos nada", contou a doutora Jean Bassett, que fundou o centro de tratamento de HIV da Clínica Witkoppen, em Johanesburgo, em 1996.
Ndlovu foi uma das pacientes tratadas na clínica. Diagnosticada com HIV em 2002, em princípio ela só recebeu vitaminas como forma de tratamento.
"Foram tempos difíceis. Criar um filho estando naquela situação, fiquei muito assustada", disse ela, atualmente com 38 anos.
Ndlovu afirmou que, em seu pior momento, sua contagem CD4 – que indica quão bem o sistema imunológico está funcionando– caiu para menos de 200, o que significa que ela havia contraído Aids.
Ela começou a receber ARVs em 2004, depois que o governo Mbeki iniciou a distribuição relutante de medicamentos para os pacientes de Aids mais doentes na esteira do veredicto de um tribunal em 2003, e se recuperou.
Muitos sul-africanos portadores de HIV não tiveram a mesma sorte. Um estudo de 2008 da Universidade Harvard estimou que a obstrução de Mbeki resultou em pelo menos 330 mil mortes desnecessárias na primeira metade da década.