O tão aguardado Índice de Preços ao Consumidor (IPC) nos EUA para janeiro pode significar diferentes coisas para diferentes mercados.
Uma leitura abaixo das estimativas de 7,3% pode reduzir as expectativas de juros, derreter o rendimento dos treasuries, que estão nas máximas de 2 anos, e acalmar os piores temores de quem aposta em ações, fazendo o S&P 500 e o Dow alçarem voo. Qualquer leitura muito acima das expectativas pode se tornar mais uma dose de criptonita para ações de valor do índice Nasdaq, que já cai quase 10% no ano.
Onde o ouro se encaixa nesses dois extremos é uma grande incógnita.
Gráficos: cortesia de skcharting.com
Mas, dado que o outro é um ativo usado para se proteger da inflação, pode disparar se as pressões de preço saírem do controle, com o IPC ficando em 7,5% ou mais em janeiro.
O problema dessa teoria, como mostram nos últimos meses, é que qualquer alta da inflação gera uma liquidação nos treasuries, bem como uma disparada nos rendimentos da nota de 10 anos do Tesouro americano e do dólar. A combinação dos dois geralmente é uma sentença de morte para o ouro.
Há uma semana, eu perguntei se o ouro, depois de se firmar em US$1800, conseguiria sobreviver ao relatório de empregos nos EUA.
Bem, o ouro sobreviveu ao relatório de empregos, que registrou a criação de 467.000 postos de trabalho, contra as expectativas dos economistas de apenas 125.000.
Após a grande alta do desemprego provocada pela pandemia de coronavírus em 2020, o mercado laboral nos EUA acelerou, com a taxa de desocupação caindo para 3,9% em dezembro e permanecendo a 4% no mês passado, contra a máxima recorde de 14,8% em abril de 2020. Uma taxa de desemprego de 4% ou menos é definida pelo Federal Reserve como “pleno emprego” no país.
A economia dos EUA cresceu 5,7% no ano passado, após uma contração de 3,5% em 2020. Mas a inflação subiu ainda mais rápido, com uma taxa anual de 7% para dezembro, a maior desde 1982.
O Fed tem um duplo mandato de aumentar os níveis de emprego e manter a inflação sob controle. Portanto, uma combinação de altos índices de emprego, inflação e atividade econômica geralmente é a receita para juros maiores. E juros maiores favorecem os treasuries e o dólar, e não o ouro.
O mercado financeiro espera que o Fed eleve as taxas de juros em pelo menos cinco vezes entre as reuniões de março e novembro. O que ainda não se sabe é o tamanho dessas altas. Na semana passada, a expectativa era que o Fed desse o pontapé inicial com uma alta de 25 pontos-base em março.
Se o crescimento do IPC na quinta-feira for muito grande, fará com que o retorno dos treasuries e o dólar disparem primeiro, provocando a queda do ouro, em reação aos dois. O metal amarelo pode levar um ou dois dias para reavaliar sua posição como hedge inflacionário e, a partir de então, pode voltar a subir, em movimentos graduais.
Por quê?
Pois um IPC forte pode levar o Fed a realizar uma alta de 50 pontos-base em março. Isso seria uma verdadeira criptonita para o ouro. Mas essa possível alta de juros só ocorrerá daqui a cinco semanas, e o mais importante agora é saber como ficará o ouro até lá.
Contrariando as diversas previsões de colapso desde o início do ano, devido à expectativa de alta de juros nos EUA, o ouro conseguiu se firmar nos patamares altistas de US$1800 durante a maior parte das últimas cinco semanas. Mesmo após a perda do nível, seu recuo foi curto, até US$1.778,80.
Uma razão para isso são as tensões geopolíticas associadas ao conflito russo-ucraniano, dizem alguns analistas.
No pregão de terça-feira na Comex de Nova York, o contrato futuro do ouro para abril fechou a US$1827,9 por onça.
O pico do dia foi tocado em US$1830,15, tecnicamente um ponto “bastante seguro”, um pouco abaixo dos níveis maiores de resistência identificados para o metal amarelo, de acordo com o analista técnico Sunil Kumar Dixit.
“A recuperação do ouro mostra que ele recobrou força e encontra-se agora acima dos níveis de 50% e 61,8% de Fibonacci a US$1817 e 1825, respectivamente, da retração de US$73 medida na faixa de US$1853-1780.
Isso se deve ao acirramento das tensões entre Rússia e Ucrânia em torno da questão da Otan”.
Os níveis de 50% e 61,8% de Fibonacci já eram considerados posições técnicas de força que poderiam alçar o metal a novas máximas (76,4% a 1836 nesse caso) e retestar o topo deste ano de US$1853, segundo o analista.
“Se o atual movimento de alta ganhar volume suficiente, o ouro deve testar US$1860, que é a próxima resistência crítica e até mesmo retestar US$1860”, complementou Dixit.
“Por outro lado, uma falha em se sustentar acima de US$1817 pode desencadear um recuo para US$1808-1797 muito rapidamente. O ouro precisa desesperadamente de um gatilho para romper US$1830-1835, sem o qual os ursos podem machucar os touros novamente”.
Quanto às expectativas do IPC, segundo ele, uma leitura levemente mais alta em janeiro já está precificada no ouro, ou seja, um crescimento de 7,3% poderia acabar sendo favorável para o metal.
“Uma inflação muito mais alta, aliada ao acirramento dos temores com Rússia-Ucrânia, pode gerar um movimento de alta em direção a US$1853-1877, não imediatamente, mas em algum movimento no futuro.”
Aviso de isenção: Barani Krishnan utiliza diversas visões além da sua para dar diversidade às suas análises de mercado. A bem da neutralidade, ele por vezes apresenta visões e variáveis de mercado contrárias. O analista não possui posições nos ativos e commodities sobre os quais escreve.