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Como o Covid e o Conflito EUA-China Criaram Problemas na Cadeia de Semicondutores

Publicado 17.03.2021, 09:39
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Esse é o meu primeiro artigo escrevendo para Investing.com. Aqui vou compartilhar muito conteúdo sobre macroeconomia e investimentos globais.

Tenho mais de 10 anos de experiência no mercado financeiro internacional e por muito tempo fiz gestão de portfólios bilionários no JPMorgan (NYSE:JPM) (SA:JPMC34) na Suíça. Portanto, os conteúdos de investimentos que compartilharei aqui com vocês seguirão a linha de visão global, mas que qualquer pessoa pode implementar.

Para esse primeiro artigo, pensei em falar sobre algo muito importante que está acontecendo, mas poucos no Brasil estão cientes: a crise de oferta dos semicondutores.

Os semicondutores (microchips feitos principalmente de silicone) estão por todos os lados: telefones celulares, computadores, aviões, televisões, carros, etc. Em 2020, a demanda global foi de cerca de US$ 440bi (alta de 6.5% versus 2019). E ela tende a aumentar no futuro, com o avanço de indústrias disruptivas (Inteligência Artificial, 5G, Blockchain, Internet das Coisas, computadores quânticos, etc).

Semicondutores são usados para processamento de informações em alta qualidade e velocidade. Portanto, ter acesso a bons semicondutores é do interesse nacional dos países, para se protegerem de qualquer ameaça externa.

Muito embora a indústria já exista desde o fim da Segunda Guerra Mundial, e sua demanda cresce ano após ano, o mundo se encontra atualmente em um cenário de grande falta de semicondutores. A indústria de automóveis, sozinha, está em falta de US$ 60 bilhões em semicondutores, segundo a empresa de consultoria AlixPartners, e esse cenário não deve mudar tão cedo. E um dos grandes culpados foi o coronavírus que desestabilizou as cadeias produtivas e criou uma explosão na demanda por aparelhos eletrônicos.

Então como tudo no mercado, sempre quando há um choque haverá vencedores e perdedores. Portanto, estar ciente de quem sai ganhando nesse desequilíbrio entre oferta e demanda é fundamental para fazer bons investimentos.

A INDÚSTRIA DE SEMICONDUTORES

Semicondutor é um aparelho muito pequeno (menor que um selo de carta, por exemplo) composto de bilhões de componentes, que armazenam, processam e transferem dados. É uma ferramenta poderosíssima e com enorme capacidade tecnológica dentro, fruto de anos de pesquisa e desenvolvimento.

Os semicondutores são utilizados nos mais diversos setores e são peças-chave nas indústrias (principalmente nas que estão revolucionando nosso modo de viver - 5G, IA, IoT, etc). Alguns veículos elétricos, por exemplo, chegam a ter mais de 3’500 semicondutores.

FONTE: US Congressional Research Service

ESTÁGIO ATUAL DA INDÚSTRIA

Da produção global total de cerca de US$ 440bi, os EUA vendem quase a metade (47%), seguido de Coreia do Sul, Japão, Europa, Taiwan e China (essa com somente 5% das vendas - guarde esse número, pois será útil na análise mais abaixo).

Embora os EUA vendem quase metade dos semicondutores mundiais, eles produzem somente 12% em seu território, tornando-os dependentes de fornecedores em outros países, principalmente da Taiwan Semiconductor Manufacturing (NYSE:TSM) (SA:TSMC34) (8a maior empresa do mundo em capitalização de mercado), a maior produtora mundial.

Isso é um problema, pois a China ameaça constantemente reanexar Taiwan, e caso isso acontecesse e a China dificultasse o acesso dos EUA, como os americanos iriam produzir seus aviões militares? Ou como a Apple (NASDAQ:AAPL) (SA:AAPL34) produziria seu poderoso chip A14 usado no iPhone 12? Ou seja, not good.

COVID-19 DESESTABILIZOU A CADEIA PRODUTIVA

Com o Covid-19, a indústria inteira foi chacoalhada. Primeiro, muita gente ficou em casa e a demanda por aparelhos eletrônicos tem subido muito. Segundo, alguns setores pararam a produção por completo e, agora que estão voltando, não encontram fornecedores de semicondutores.

Isso é o que tem acontecido na indústria automobilística, por exemplo. A General Motors (NYSE:GM) (SA:GMCO34) disse que somente em 2021 poderá deixar de lucrar até US$ 2 bi por conta da falta de semis. A Ford (NYSE:F) (SA:FDMO34) também estima nessa mesma magnitude.

Em 2020, com a forte ascensão do coronavírus, muitas montadoras se viram obrigadas a fechar suas linhas de produção durante meses. Montadoras normalmente trabalham com baixos estoques e seus fornecedores conseguem aumentar/reduzir os insumos em tempos relativamente baixos. Mas não é o caso para os fornecedores de semicondutores. Eles já têm demanda forte de várias indústrias. Então, quando as montadoras (que representam somente 12% da demanda agregada por semis) disseram que não iriam precisar mais dos insumos por muito tempo, os produtores de semis realocaram a produção para outras indústrias como eletrônicos e industriais.

FONTE: Semiconductor Industry Association

Então agora que a indústria automobilística reabriu a todo vapor (levada pela forte recuperação econômica americana), as montadoras estão com sérias dificuldades em produzir carros suficientes para atender a demanda. Segundo a IHS Markit, 672 mil carros deixarão de ser produzidos, somente no primeiro trimestre de 2021, por conta disso.

Embora os fornecedores estejam investindo para aumentar a capacidade de produção (TSMC investirá $28bi somente em 2021), a normalização poderá durar meses. Pois para produzir um chip pode durar até 26 semanas e as produtoras estão rodando com 95% da capacidade.

FONTE: Semiconductor Industry Association

TENSÃO GEOPOLÍTICA EUA x CHINA PIORA A SITUAÇÃO

O conflito comercial dos EUA com a China também ajudou a piorar a situação, principalmente quando a administração do presidente Trump proibiu a venda de semicondutores para empresas chinesas, como Huawei e ZTE. Essas empresas começaram a estocar semicondutores para a produção de celulares 5G, entre outros. Ao mesmo tempo, empresas americanas foram proibidas de comprar da empresa produtora chinesa, Semiconductor Manufacturing International (HK:0981) (SMIC).

A situação é tão preocupante (para todos os governos) que o presidente Joe Biden, em fevereiro, assinou uma ordem de urgência para que os EUA encontrem mecanismos para produzir semis em território americano.

A China, por outro, investirá US$1.4tri nos próximos 5 anos para que cerca de 70% da demanda chinesa seja produzida em território chinês, buscando sair da preocupante situação atual (somente 5% da venda mundial é chinesa).

QUEM SÃO OS VENCEDORES DISSO TUDO?

Simples, os fornecedores de semicondutores. Hoje a cadeia produtiva se divide em:

  • Produtores, também chamados de Foundries: TSMC (NYSE:TSM) (SA:TSMC34)

  • Designers, também chamados de Fabless: Qualcomm (NASDAQ:QCOM) (SA:QCOM34), Nvidia (NASDAQ:NVDA) (SA:NVDC34) e AMD (NASDAQ:AMD) (SA:A1MD34)

  • Produtores integrados (IDM), que fazem tanto a produção como design: Intel (NASDAQ:INTC) (SA:ITLC34), Samsung (LON:0593xq)

Nos últimos anos as empresas desse setor têm apresentado fortes retornos, dado a incrível demanda que cresce a cada ano por mais semicondutores de última geração.

No gráfico acima você vê a performance do S&P 500 (laranja) versus SOXX (ETF de semis, azul escuro), TSM (azul claro) e NVDA (amarelo). Impressionante!

Embora retornos passados não dão garantias de lucros futuros, os desequilíbrios da cadeia produtiva devem perdurar por meses, senão anos. Pois mesmo que o coronavírus seja amplamente controlado, a cultura de work from home veio pra ficar, e assim a demanda por eletrônicos deve permanecer aquecida. Enquanto que no lado da oferta, qualquer tentativa de construção de novas fábricas deve demorar entre 3 a 5 anos para ver a oferta aumentar significativamente.

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