Enquanto olha para o tombo histórico da economia brasileira no trimestre passado pelo retrovisor, o mercado financeiro digere o conteúdo da proposta do Orçamento para 2021 tentando entender se o governo irá manter a responsabilidade fiscal no horizonte à frente. Os dados do Produto Interno Bruto (PIB), a serem conhecidos logo cedo (9h), podem até não vir tão ruins quanto o esperado, mas a previsão das contas do governo para o próximo ano mostram que será um desafio não “furar” o “teto dos gastos”.
A grande questão é que o Renda Brasil, que deve substituir o Bolsa Família, ficou de fora da proposta entregue ontem ao Congresso, em meio ao impasse dentro do governo sobre o formato e os valores do novo programa de transferência de renda. Contudo, em paralelo a isso, o presidente Jair Bolsonaro deve anunciar hoje a prorrogação do auxílio emergencial aos mais vulneráveis aos impactos econômicos da disseminação de coronavírus até o fim do ano, com o benefício fixado em R$ 300. Serão, portanto, mais quatro parcelas.
Mas o mercado sabe que benefício temporário não existe. Para evitar a ideia de descontinuidade justamente entre aqueles que garantiram o melhor índice de popularidade do presidente desde o início do mandato, Bolsonaro defende que o Renda Brasil, vigente a partir do ano que vem, também seja no valor de R$ 300, mas sem eliminar assistências consideradas ineficientes pelo ministro Paulo Guedes, como o abono-salarial, o seguro-defeso (pago a pescadores) e o Farmácia Popular.
Daí, então, que o risco de rompimento do teto em 2021 é alto, uma vez que as despesas devem continuar crescendo, enquanto a receita tende a continuar fragilizada, já que os danos econômicos causados pela pandemia ainda não foram superados. Aliás, os números do PIB devem mostrar com mais precisão como o surto da covid-19 no país afetou a economia doméstica. E a previsão é de que sejam anunciados os piores números de todos os tempos, despencando cerca de 10% em cada uma das duas bases de comparação.
Se confirmada a estimativa, serão os maiores tombos já registrados pelo PIB brasileiro desde o início da série histórica revisada, em 1996, em ambos os confrontos, superando até o declínio da atividade durante a recessão econômica, entre 2015 e 2016, e também na crise financeira global de 2008. Além disso, a economia nacional deve entrar em recessão técnica ao final de junho, ao cair pelo segundo trimestre consecutivo. Trata-se do grande destaque da agenda do dia, que traz ainda a balança comercial em agosto (15h).
Exterior em atividade
Já no exterior, as leituras finais de agosto sobre a atividade industrial na zona do euro e nos Estados Unidos (11h) dão pistas sobre o ritmo da recuperação econômica desde a virada do semestre, após a melhora rápida e acentuada entre maio e junho. O índice dos gerentes de compras (PMI) da região da moeda única confirmou a estimativa preliminar e ficou em 51,7 em agosto, de 51,8 em julho.
A abertura do dado mostra que a Itália registrou a manufatura europeia mais forte, com o PMI ficando em 53,1, enquanto Espanha, França e Grécia registraram leituras abaixo da linha divisória de 50, que indica expansão da atividade. Em reação aos números, o euro seguiu no maior valor em dois anos em relação ao dólar, abaixo de US$ 1,20, beneficiado pela mudança de estratégia do Federal Reserve. A fraqueza da moeda norte-americana favorece as commodities, com destaque para o petróleo e o cobre.
As principais bolsas europeias também avançam, acompanhando o sinal positivo vindo dos índices futuros das bolsas de Nova York, após uma sessão com pouco brilho na Ásia. A Bolsa de Xangai liderou os ganhos, mas ainda assim subiu apenas 0,4%, reagindo ao salto do PMI industrial chinês calculado pelo Caixin, que subiu ao maior nível em quase uma década, a 53,1 em agosto, de 52,8 em julho.
É a quarta vez seguida que indicador, que mede o desempenho da manufatura pequena e privada na China, permanece acima da linha divisória de 50, o que indica expansão da atividade. Segundo o Caixin, o retorno do PMI industrial chinês para os níveis de janeiro de 2011 reflete a forte demanda interna e externa, bem como o aumento da produção, com a recuperação econômica no país pós-pandemia tendo continuidade.
Porém, as infecções por coronavírus continuam aumentando, com a Índia caminhando para se tornar o epicentro mundial de novos casos da doença, reforçando os sinais de que a pandemia ainda está longe de terminar. A proximidade do outono (no hemisfério norte) pode disparar uma segunda onda de contágio por covid-19, turvando o cenário sobre a recuperação global, o que pode provocar turbulência nos ativos de risco.
Por isso, os investidores estão esmiuçando os indicadores econômicos desta semana, em busca de pistas sobre as perspectivas para a atividade, o consumo e o emprego, em um momento em que muitos governos começam a retirar a ajuda emergencial aos cidadãos. Ainda na agenda do dia, também serão conhecidos dados sobre o desemprego e a inflação ao consumidor na zona do euro, além de números sobre o setor imobiliário nos EUA (11h).