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Anistia a usinas de energia frustradas organiza sistema, mas traz descontentamento

Publicado 14.07.2023, 12:58
© Reuters. Linhas de alta tensão são vistos durante o pôr do sol em Brasília
06/06/2022
REUTERS/Ueslei Marcelino

Por Letícia Fucuchima

SÃO PAULO (Reuters) - A definição de uma "anistia" para o grande volume projetos de energia que assinaram compromissos com o setor elétrico e não sairão do papel ajuda a organizar o sistema, mas ainda há dúvidas sobre como o mecanismo vai efetivamente funcionar, avaliam associações que representam geradores de energia.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou na terça-feira desta semana uma espécie de perdão para empreendedores que garantiram outorgas de geração e conexão à rede de transmissão, mas que não iniciaram obras ou não pretendem seguir adiante com os projetos.

A solução é considerada importante para lidar com o boom de usinas "de papel", somando mais de 200 GW, que surgiram com a corrida dos geradores para garantir que seus projetos eólicos e solares -- nem sempre viáveis -- mantivessem descontos tarifários concedidos às fontes renováveis de energia que foram revistos por lei.

A chamada "corrida do ouro" criou gargalos na Aneel, que cuida das outorgas, e no operador ONS, que organiza a fila de acessos à rede de transmissão.

O mecanismo aprovado nesta semana, de adesão voluntária, prevê uma rescisão amigável de outorgas de geração e Contratos de Uso do Sistema de Transmissão (Cust), sem aplicação de multas rescisórias.

Isso deve resolver o impasse que se criou para os geradores, sendo que muitos já haviam até entrado na Justiça para não pagar suas obrigações do Cust, disse Sandro Yamamoto, diretor técnico da associação de energia eólica Abeeólica.

"O gerador não rescindia o contrato porque tinha uma previsão de multa pesadíssima, que equivale a três anos de pagamento do Cust, de pagamento mensal de encargo de transmissão", explicou.

Ele lembrou ainda que as desistências devem abrir espaço na rede de transmissão que estava antes reservado, permitindo que novas usinas, realmente viáveis, possam se conectar às linhas e escoar sua energia.

Em uma primeira consulta realizada, a Aneel identificou interesse expressivo dos geradores em aderir ao "perdão", permitindo a liberação de até 11,8 gigawatts (GW) de montantes do uso do sistema de transmissão.

Yamamoto afirmou, porém, que ainda há questionamentos dos geradores sobre as regras para quem não quer desistir dos projetos, e sim apenas alterar o cronograma para entrada em operação.

"A nossa expectativa era que a Aneel aprovasse uma mudança de cronograma mediante um aporte robusto de garantias... e que o passivo (de pagamento do custo da transmissão) tivesse anistia, isso não ocorreu", disse o diretor da Abeeólica.

"Vamos fazer um balanço de qual é a tendência de mercado, se os empreendedores vão aderir mesmo ou se não vão aderir e seguir uma discussão administrativa ou judicial com a agência".

Já no segmento solar, o perdão também foi comemorado, por trazer mais clareza sobre o tratamento regulatório para o imbróglio.

Mas a associação Absolar apontou dúvidas sobre quem terá prioridade para ocupar o espaço da transmissão que estava antes travado pelos projetos de papel. A entidade defende que os geradores deveriam disputar esses espaços em um leilão, em vez de entrar em uma fila cronológica, como propôs a Aneel.

"Essa possibilidade de realização de um procedimento competitivo não está descartada... A questão é que, conjunturalmente, fica a dúvida se vai sobrar margem para a realização (do leilão) no curto prazo", disse Ricardo Barros, vice-presidente de geração centralizada da Absolar.

© Reuters. Linhas de alta tensão são vistos durante o pôr do sol em Brasília
06/06/2022
REUTERS/Ueslei Marcelino

Já a associação de consumidores de energia Anace avaliou que, apesar de necessária, a solução não pode virar regra, por ser "muito generosa" com empreendedores que assumiram os riscos de seus projetos e não os viabilizaram.

"Os investidores sabiam dos riscos dos projetos de geração e dos custos com os quais teriam de arcar mesmo que desistissem do seu desenvolvimento, mas, na prática, não foram responsabilizados. Tudo acabou em pizza, sem custo ou consequência para o sistema, envolvendo demais agentes e usuários", afirmou o diretor-presidente da Anace, Carlos Faria.

 

(Por Letícia Fucuchima)

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