SÃO PAULO (Reuters) - O sentimento mais suscitado durante a exibição de “Mulheres no Poder” é o de estranheza. Parte dela é prevista pela própria produção, que propõe a inversão de papéis na política nacional, majoritariamente masculina, para discutir a baixa representação feminina nesta e em outras áreas, além de criticar o modus operandi governamental por todo o país, no qual acordos corruptos entre políticos, assessores e lobistas conduzem licitações fraudulentas. O segundo sentimento é o da execução falha, apesar das boas intenções do cineasta Gustavo Acioli.
Em seu segundo longa, o diretor volta a trabalhar com Dira Paes, que esteve em seu debut “Incuráveis”, drama premiado no Festival de Brasília. Ela assina a produção e estrela o filme como a popular senadora Maria Pilar, que tenta ganhar seu espaço em Brasília, garantindo os interesses de uma empreiteira no projeto Brasil Brasileiro, coordenado pela ministra Ivone Feitosa (Stella Miranda), que, por sua vez, também tem sua preferida para a obra.
O problema para ambas é que uma ONG conseguiu mandar uma proposta para realizar a obra e o desconhecimento do valor orçado por eles pode prejudicar os planos dos figurões. Por isso, até as assessoras delas, vividas por Milena Contrucci Jamel e Gabrielle Lopez, são mobilizadas para descobrir a valiosa informação com o advogado da entidade, Stefan (Paulo Tiefenthaler).
Em um cenário onde as mulheres são maioria na Câmara, no Senado e também no lobby, enquanto os homens são relegados a cargos mais baixos, como o motorista e assessor pessoal George (João Velho), um joguete sexual nas mãos de sua patroa Pilar, Acioli faz questão de colocá-las repetindo as velhas práticas dos homens.
O poder e o dinheiro corrompem todos, mas a falta de desenvolvimento de seus personagens prejudica não apenas na empatia do público com eles, mas também na reflexão a que se propõe. Mostrando os bastidores da política, com muita ironia e insinuações, seu texto escorrega na eficiência de sua sátira e no tom de baixo calão – o sexo é sempre proferido, mas nunca realizado, nem em insinuações –, que é mais indelicado do que crítico.
Com isso, poucos coadjuvantes, inclusive bons nomes como Totia Meirelles e o próprio Tiefenthaler, de “A Noite da Virada”, têm chance de apresentar algo além; os que ganham a oportunidade, porém, não conseguem segurá-la. Stella Miranda, de “Qualquer Gato Vira-Lata 2”, ainda repete trejeitos da histérica síndica do sitcom “Toma Lá, da Cá” em sua representação dos velhos coronéis da política. Com mais espaço como protagonista, Dira Paes utiliza todo o seu talento visto recentemente em “Órfãos do Eldorado” e, agora na TV, na novela “Velho Chico” para dar mais camadas à personagem e envolver a plateia em sua trajetória falha.
Como o roteiro começou a ser escrito em 2009 e as filmagens foram realizadas em 2014, “Mulheres no Poder” conta com as coincidências do destino para ser lançado em um timing perfeito: sua estreia um dia depois da votação do impeachment no Senado, para afastar a primeira mulher que chegou à Presidência do Brasil, independentemente das convicções e opiniões do espectador, aparece como um chamariz na bilheteria do cinema. Em certo momento, Maria Pilar afirma que é mais fácil tirar um presidente do poder do que um funcionário público concursado, lembrando que estranheza não falta em Brasília e os últimos dias só provaram isto.
(Por Nayara Reynaud, do Cineweb)
* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb OLBRENT Reuters Brazil Online Report Entertainment News 20160511T185508+0000