Por Letícia Fucuchima
SÃO PAULO (Reuters) - Os ânimos entre a Câmara dos Deputados e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) voltaram a se acirrar na terça-feira, com parlamentares subindo o tom e fazendo fortes críticas a posicionamentos do diretor da Aneel Hélvio Guerra, enquanto aprovavam urgência na apreciação de um projeto que susta regras elaboradas na agência.
Em sessão do plenário, parlamentares se disseram indignados com falas recentes de Guerra sobre o Congresso "ser movido por lobbies" e cobraram retratação. O deputado Danilo Forte (União-CE) afirmou ter apresentado um requerimento para que o diretor da Aneel seja convidado a dar explicações.
"Apresentei hoje um requerimento de convite a Hélvio para participar de audiência na Comissão de Minas e Energia, onde vamos arguir esse comportamento vil e vamos indiciá-lo daqueles crimes cometidos por essa irresponsabilidade", disse Forte.
O primeiro vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira (Republicanos-SP), afirmou que o tema é "muito sensível" e foi objeto de discussão em reunião de líderes, com a presença do presidente da Casa, Arthur Lira.
"Nós estamos avaliando as providências jurídicas e cabíveis", disse Pereira.
As declarações foram feitas durante votação do regime de urgência do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 65/23, que susta trechos de uma resolução da Aneel relacionada à micro e minigeração distribuída de energia elétrica.
A urgência para o PDL, que considera as novas regras prejudiciais por acabar com a isenção de alguns custos aos detentores de pequenos sistemas de geração, foi aprovada por 319 votos, contra 106 contrários.
Congresso e Aneel vêm trocando farpas em uma série de temas, com alguns parlamentares alegando que decisões da agência estão usurpando a competência do Congresso ao entrar na esfera legislativa.
No ano passado, deputados tentaram reverter aumentos nas contas de luz aprovados pela Aneel, sendo que os reajustes haviam seguido os ritos usuais para esse tipo de processo. Também entraram na discussão de temas bastante técnicos, como a mudança do chamado "sinal locacional", um realinhamento dos custos de transmissão de energia que afeta geradores e consumidores de formas diferentes.
Procurado, Guerra preferiu não comentar. Fortes ainda não retornou ao contato da reportagem.
INTERFERÊNCIA NAS AGÊNCIAS
O novo embate entre Câmara e Aneel ocorre em meio a temores sobre um possível enfraquecimento dos poderes das agências reguladoras por causa de uma emenda apresentada à Medida Provisória 1154, que reestruturou a organização ministerial no início do governo Lula.
A emenda 54, de autoria de Danilo Forte, prevê a criação de conselhos temáticos ligados aos ministérios para editar atos normativos que hoje cabem às agências reguladoras.
Esses conselhos promoveriam interação entre "representantes de ministérios, das agências, dos setores regulados da atividade econômica, da academia e dos consumidores". Na véspera, Forte disse que a proposta não promove "extinção das agências, nem enfraquecimento", mas "combate à cooptação das agências pelo grandes players do mercado".
A emenda foi mal recebida por várias associações de atividades econômicas reguladas, como infraestrutura e energia, que viram nela uma "tentativa de interferência política", ao divulgar um comunicado conjunto na terça-feira.
Entidades como Abradee (distribuição de energia), IBP (petróleo), Ibram (mineração) e CBIC (construção) lançaram manifesto no qual avaliam a proposta como "gravíssima", por representar uma "afronta ao processo regulatório em vigor e uma real ameaça à sustentabilidade" dos serviços regulados e "comprometer a captação de investimentos nacionais e internacionais".
(Por Letícia Fucuchima)