PEQUIM/CHICAGO/SÃO PAULO (Reuters) - A China anunciou nesta sexta-feira que vai impor uma tarifa extra de 5% sobre a soja dos EUA a partir de 1º de setembro e taxas adicionais de 10% sobre trigo, milho e sorgo dos EUA a partir de 15 de dezembro, nas últimas medidas retaliatórias de Pequim contra Washington.
A China também cobrará tarifas extras de 10% sobre a carne bovina e suína dos EUA a partir de 1º de setembro, de acordo com lista publicada pelo Ministério do Comércio em seu site.
As tarifas mais recentes, que seguem os impostos norte-americanos sobre bens chineses no valor de 300 bilhões de dólares, ameaçam prolongar uma guerra comercial entre as duas principais economias do mundo que tem levantado preocupações sobre a desaceleração do crescimento global.
No ano passado, a China impôs tarifas retaliatórias que permanecem em vigor sobre as importações de uma série de produtos agrícolas dos EUA, incluindo soja e carne de porco.
Essas tarifas reduziram a exportação de produtos norte-americanos e levaram a administração Trump a oferecer até 28 bilhões de dólares em ajuda federal para compensar os agricultores norte-americanos por perdas.
"Quase não há compras de soja nos EUA por empresas privadas há um ano", disse Ryan Findlay, CEO da Associação Americana de Soja. "Já é hora de ambas as partes --China e Estados Unidos-- avançarem, pararem com tarifas e encontrarem uma resolução."
"Qualquer escalada na disputa comercial com a China é uma grande preocupação para os produtores de suínos dos Estados Unidos", disse o Conselho Nacional de Produtores de Carne Suína em um comunicado.
A tarifa anterior sobre a carne suína dos EUA tinha sido de 62%.
O Ministério do Comércio da China disse em 5 de agosto que as empresas chinesas pararam de comprar produtos agrícolas dos EUA, acirrando a guerra comercial entre os países.
"Para mim, é totalmente político e psicológico", disse Dan Basse, presidente da consultoria AgResource Co, em Chicago.
"A proibição foi mais destrutiva do que aumentar as tarifas".
BRASIL BENEFICIADO
A disputa comercial entre China e EUA vem beneficiando o Brasil desde o ano passado, quando as exportações brasileiras de soja atingiram recorde de mais de 80 milhões de toneladas, com grandes compras dos chineses.
Neste ano, contudo, o impacto da peste suína africana na China amenizou os efeitos da disputa comercial para a demanda por soja brasileira. Por outro lado, indústrias de carnes brasileiras estão vendendo mais aos chineses, que estão se fiando muito nas importações de proteína animal.
Na avaliação da consultoria Cogo Inteligência em Agronegócio, as tarifas adicionais à soja e carnes norte-americanas só não beneficiam mais o Brasil neste momento porque há limites de oferta.
A comercialização da safra de soja, colhida no primeiro semestre, já está bem avançada, e no caso das carnes, os produtores nacionais levam um tempo para ampliar o alojamento de aves e as criações, algo que deve ocorrer para o próximo ano, considerando que a guerra comercial dá mostras de prosseguir.
"Talvez este ano a coisa fique limitada pela capacidade de volume (de soja), não vai dar para avançar muito. O esmagamento de soja cresceu, em função da exportação de carne", disse à Reuters o sócio da consultoria, Carlos Cogo.
Ele afirmou que há indicações de que a guerra comercial vai prosseguir no próximo ano, o que permitiria ao Brasil mais benefícios, incluindo nas carnes. Ele acredita que a indústria vai expandir as criações, de olho na forte demanda chinesa.
"Creio que essa disputa continua... Isso parece que não é mais guerra comercial, parece que vai ficar por aí... Talvez não haja acordo, e exista uma reacomodação de forças, e o jogo duro do Trump, se ele reeleger, vai permanecer."
Cogo trabalha com previsão de aumento de 7% na produção de soja do Brasil em 2019/20, para 123,5 milhões de toneladas, com a safra se recuperando de uma quebra pela seca em 2019.
Os futuros de soja fecharam em baixa na bolsa de Chicago, após a China dizer que acrescentaria mais 5% à tarifa de 25% que impôs em julho de 2018.
Mas as quedas nos preços em Chicago têm sido compensadas para o produtor brasileiro por maiores prêmios sobre as cotações futuras.
O prêmio subiu cerca de 7% nesta semana, para mais de 1,50 dólar por bushel.
Além do prêmio, a formação de preços em reais vem sendo favorecida por uma alta no dólar, que atingiu nesta sexta-feira o maior patamar em quase um ano, acima de 4,12 reais, com o mercado doméstico sob intensa pressão decorrente do arisco ambiente externo e de reveses do lado da agenda de reformas do governo.
A valorização do dólar, o baixo excedente da soja brasileira e a expectativa de maiores demandas externa e interna têm impulsionado os preços da soja no Brasil. Os valores médios da parcial deste mês, inclusive, já são os maiores deste ano, em termos reais, segundo análise do Centro de Estudos em Economia Aplicada (Cepea).
(Reportagem de Dominique Patton e Tom Daly em Pequim, Humeyra Pamuk em Washington DC e Tom Polansek e Julie Ingwersen em Chicago e Roberto Samora, em São Paulo)