Por Ana Mano e Maximilian Heath
SÃO PAULO (Reuters) - A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) aprovou o cultivo e a venda de trigo geneticamente modificado tolerante à seca no Brasil, um grande impulso para a cultura, já que os temores de abastecimento global de alimentos e o clima seco regional aumentam a atratividade dos transgênicos.
A medida torna o Brasil a segunda nação depois da Argentina a aprovar a variedade de trigo da Bioceres HB4 para cultivo, apresentada pela parceira Tropical Melhoramento e Genética. Outros mercados o aprovaram para consumo.
O Brasil é um dos maiores mercados consumidores e exportadores de alimentos do mundo. Embora o sinal verde não signifique que o país necessariamente cultivará trigo transgênico para produção em breve, isso reflete uma alteração de atitude à medida que as mudanças climáticas e a guerra na Ucrânia aumentam as preocupações com uma crise alimentar global.
O trigo transgênico nunca foi cultivado para fins comerciais devido aos temores dos consumidores sobre eventuais alergias ou toxicidades na cultura básica usada em todo o mundo para pães, massas e doces. Variedades biotecnológicas de milho e soja são comuns no uso para ração animal e biocombustíveis, não para a alimentação humana.
A Bioceres disse em comunicado nesta sexta-feira que a aprovação significa "abrir o mercado brasileiro para a tecnologia", acrescentando que isso ajudará a facilitar a comercialização da variedade na Argentina. Os dois países dominam a produção de trigo da América do Sul.
INDÚSTRIA
A Abimapi, associação que representa fabricantes de biscoitos, massas, pães e bolos no Brasil, disse, por meio da assessoria, que a aprovação do cultivo e comercialização do trigo transgênico no Brasil é positiva por potencialmente permitir o aumento da oferta interna do cereal, o que poderia reduzir os custos da indústria.
A associação era contra a adoção do trigo transgênico anteriormente, mas mudou sua posição depois que uma pesquisa encomendada pela entidade mostrou que mais de 70% dos brasileiros não se importaria de consumir produtos que contenham o cereal.
O Brasil tem cultivado trigo usando grãos convencionais adaptados às condições climáticas locais, mas ainda depende do fornecedor Argentina para importações consideráveis.
O trigo tolerante à seca pode atrair os agricultores do Paraná e Rio Grande do Sul --os dois maiores produtores nacionais-- onde culturas como milho e soja enfrentam escassez de água. Na Argentina, a seca desde o ano passado cortou a safra de trigo pela metade.
A Bioceres disse que seu trigo transgênico "apresentou rendimentos mais altos do que as variedades convencionais em todos os ambientes, com uma melhoria média de rendimento de 43% nos ambientes-alvo".
Em novembro de 2021, o Brasil se tornou o primeiro país a permitir a importação de farinha feita com trigo geneticamente modificado da Argentina. Essa decisão estimulou uma discussão global sobre o trigo geneticamente modificado.
A associação que representa a indústria moageira Abitrigo também elogiou a decisão, dizendo que ela resolve "o risco de conflitos regulatórios" porque a aprovação da importação de farinha foi concedida antes que o uso do trigo HB4 da Bioceres fosse efetivamente liberado no país.
"A aprovação do plantio, importação e comercialização em território nacional do trigo transgênico (HB4) pela CTNBio resolve esta questão, trazendo tranquilidade aos diferentes atores do mercado", afirmou a entidade em nota. "A palavra final ficará com os consumidores."
(Reportagem de Maximilian Heath em Buenos Aires e Ana Mano em São Paulo)