Por Leonardo Goy
BRASÍLIA (Reuters) - Um impasse entre a área técnica da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e outras áreas de governo, inclusive o Tesouro Nacional, sobre a dívida da distribuidora Celg D junto a Itaipu tem criado dificuldades ao processo de privatização da empresa goiana, controlada pela Eletrobras (SA:ELET3), que pode ocorrer em 2016.
No fim do ano passado, quando aprovou a venda do controle da Celg Distribuição, a Assembleia Geral Extraordinária de acionistas da Eletrobras condicionou a operação à aprovação, pela Aneel, da proposta de repactuação da dívida da distribuidora goiana, de cerca de 450 milhões de dólares.
O montante, referente à Conta de Itaipu, precisaria ser convertido em moeda nacional, com posterior pagamento em até 120 meses (corrigidos pela taxa Selic), decidiu a assembleia, impondo condição para um negócio que pode atingir no mínimo cerca de 2,8 bilhões de reais, considerando também a parcela detida na companhia pelo Estado de Goiás.
No dia 23 de novembro passado, a Superintendência de Fiscalização Econômica e Financeira da Aneel emitiu ofício no qual afirmava não entender como viável a operação proposta para a Celg, "no que tange principalmente à conversão da dívida de dólares americanos para reais, o que poderia desequilibrar o Fundo de Repasse de Energia de Itaipu, já que ele é gerido na moeda estrangeira, e acarretar, inclusive, prejuízo ao consumidor".
Apesar de a posição da Superintendência não ser conclusiva, pois o tema precisa ser deliberado em reunião colegiada da diretoria da agência, a Eletrobras reforçou o pedido e enviou à Aneel pareceres do Tesouro, do Ministério de Minas e Energia e da Advocacia-Geral da União para sustentar sua posição em favor da repactuação, segundo documentos da Aneel vistos pela Reuters.
O parecer do Tesouro anexado pela Eletrobras defende a operação e lembra que a dívida foi contraída entre 2008 e 2012, período em que a distribuidora esteve inadimplente com a conta de Itaipu.
Nesse período, segundo o Tesouro, foram os consumidores das demais distribuidoras que honraram os débitos da Celg e, nessa época, a taxa média de câmbio era de 1,83 real por dólar, enquanto a repactuação a ser aplicada, nos termos de lei aprovada em novembro passado, é de 2,69 reais.
"Ou seja, os consumidores de Itaipu (das regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul) seriam compensados pela quitação de dívida da Celg D a uma taxa de câmbio ainda superior àquela utilizada anteriormente", diz o Tesouro.
A taxa de câmbio proposta na repactuação, porém, seria inferior à praticada atualmente, em torno de 4 reais por dólar.
Para o Tesouro, a não repactuação da dívida pode ser um empecilho à operação de venda da subsidiária estatal.
"Tendo em vista a atual situação financeira da empresa, a não conclusão do processo de desestatização poderia causar, inclusive, novos atrasos no pagamento das parcelas correntes à conta de comercialização de Itaipu, onerando novamente os demais consumidores da energia de Itaipu", diz a nota do Tesouro anexada ao processo.
A proposta de repactuação da dívida da empresa baseia-se em artigo de lei sancionada no ano passado, fruto da conversão da Medida Provisória 677, que autoriza a Aneel a anuir com repactuação de dívidas setoriais em moeda estrangeira de empresas incluídas no Programa Nacional de Desestatização (PND). Pela lei, a conversão do câmbio deve ser feita com base no primeiro dia útil do ano em que se deu a inclusão da empresa no PND.
Conforme admitiu à Reuters uma fonte do governo, sob a condição de anonimato, o dispositivo legal foi feito "sob medida para a Celg" e permite fixar o câmbio da repactuação à taxa de 2,69 reais.
Segundo essa mesma fonte, entre o fim desta semana e o início da próxima, a Superintendência de Fiscalização Econômica e Financeira da Aneel deverá apresentar sua nota técnica definitiva sobre o assunto, abrindo caminho para que o assunto comece a ser apreciados pela diretoria.
O primeiro passo será a escolha de um relator para o caso, que vai elaborar um relatório a ser submetido ao colegiado.
"O assunto não está redondo e gera questionamentos. O benefício previsto em lei é apenas para a Celg ou para todo o sistema no país? Isso tem de ficar claro", disse a fonte, referindo-se ao artigo da lei que autoriza a Aneel a avaliar a repactuação "que venha a gerar benefícios potenciais à prestação do serviço público de distribuição de energia".