Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - Fabricantes chinesas têm acelerado significativamente as vendas de equipamentos de energia solar no Brasil, enquanto elétricas orientais se preparam para avançar também na geração com a fonte renovável no país, em movimentos alinhados à estratégia de Pequim de dominar a cadeia da tecnologia, disseram especialistas e empresas à Reuters.
Uma feira do setor realizada em São Paulo nesta semana, a InterSolar, dava sinais claros dessa expansão, com a presença de uma série de fornecedores da China e também de um grande público de potenciais clientes, atraídos pela constante queda de preços dos painéis fotovoltaicos.
A importação de módulos solares pelo Brasil cresceu 24% no primeiro semestre, para o equivalente 1,26 gigawatt, o que é mais de um terço da capacidade hoje instalada da fonte no país, com as chinesas Jinko, BYD, JA Solar e Trina e a sino-canadense Canadian Solar dominando os negócios, apontou a consultoria Greener, que também viu queda de mais de 30% no preço dos sistemas desde 2018.
"O Brasil está certamente entre os cinco mercados globalmente mais atraentes para nós", disse à Reuters o diretor-geral da Trina Solar para América Latina e Caribe, Álvaro García-Maltrás, que vê o país como o mais importante na região desde que o México cancelou um leilão de renováveis e sinalizou mudanças em suas políticas sob o governo Andrés Manuel López Obrador.
A Trina, que tem meta de alcançar uma participação de 20% nas vendas de painéis no Brasil neste ano, contra cerca de 2% no ano passado, ainda tem uma unidade de negócios que investe em projetos de geração, segmento que também tem avaliado.
"Somos muito ativos em países como México, Chile, e temos esse braço no Brasil. Aqui chegamos um pouco mais tarde que em outro mercados, precisamos de mais tempo para isso. Mas os chineses estão interessados nessa parte do mundo. Com o mercado chinês ficando menor, você vai ver aumento dos investidores de lá no Brasil e outros países vizinhos", acrescentou Álvaro.
Com amplo predomínio na cadeia global de energia solar, a China reduziu o ritmo de expansão neste ano --foram instalados no país 11,4 GW em nova capacidade da fonte no primeiro semestre de 2019, ante 24 GW nos mesmos seis meses de 2018 e um recorde de 53 GW no ano de 2017.
Ainda assim, os números impressionam --a matriz elétrica do Brasil soma cerca de 166 GW, consideradas todas fontes-- e a China avalia que pode ir além de apenas fornecer painéis, após as empresas locais acumularem elevados conhecimentos sobre a fonte nos últimos anos, disse à Reuters Larissa Wachholz, sócia da consultoria Vallya.
"Ainda tem muito chão pela frente. A presença deles no Brasil está hoje mais como fornecedor de painel, mas essa é a parte mais barata da cadeia. Eles querem ter uma presença mais efetiva em outros elos, que tragam margens maiores", explicou.
Ela apontou, no entanto, que diversos fatores têm segurado esse avanço por enquanto, incluindo a fraqueza da economia brasileira, que não deu espaço para a contratação de projetos solares de grande porte nos últimos anos, o que tem feito algumas empresas avaliarem aquisições para entrar no setor.
A gigante chinesa CGN Energy, por exemplo, fechou recentemente a compra de usinas solares da italiana Enel (MI:ENEI) e eólicas do fundo britânico Actis no Nordeste, o que já colocou a empresa como líder em capacidade de geração solar no Brasil.
Com o negócio, a CGN entrou no país já com 330 MW solares, ultrapassando a Enel, que ficou com 284 MW, a Atlas, da Actis, com 255 MW, e a francesa Engie (SA:EGIE3) (251 MW), embora ainda seja a única chinesa na lista, segundo dados da consultoria ePowerBay.
"Não tenho dúvida de que esse é um dos setores em que há maior potencial para associação sino-brasileira... certamente as empresas, outras empresas, estão olhando o mercado em busca de grandes projetos", adicionou Larrisa, apontando que o movimento poderia ser liderado por gigantes que já estão no Brasil, como China Three Gorges, State Grid e State Power Investment Corp.
Procurada, a CTG disse que "está constantemente avaliando oportunidades de mercado" no Brasil, inclusive em energia solar e eólica, enquanto a SPIC disse que olha negócios hidrelétricos, eólicos e solares", incluindo "aquisição de ativos operacionais e projetos greenfield".
A State Grid controla a CPFL (SA:CPFE3), que disse à Reuters neste mês que pretende ampliar em investimentos em geração eólica e solar por meio da controlada CPFL Renováveis.
DOMÍNIO NA INDÚSTRIA
Alguns fornecedores de equipamentos solares como Canadian Solar e BYD chegaram a abrir fábricas de componentes no Brasil, mas as vendas ainda são puxadas pelas importações, mais baratas.
A BYD, por exemplo, trabalha com entre 60% e 70% de importações, disse o diretor de Marketing e Sustentabilidade Adalberto Maluf, que projetou que ela deve fechar o ano com 1,5 gigawatt instalado no Brasil, crescimento de 100% ante 2018.
"Hoje, das 10 maiores fabricantes, 9 são chinesas", afirmou ele, que não vê mudanças no predomínio do país na cadeia produtiva.
Os módulos importados ainda são mais baratos que os montados localmente mesmo com as taxas, dados os elevados impostos no Brasil, afirmou ele, pontuando que as vendas do produto local geralmente são associadas a financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
"Por enquanto, as placas importadas são mais competitivas", disse o presidente no Brasil da empresa francesa de geração renovável Voltalia, Robert Klein.
Ele apontou, no entanto, que os painéis solares hoje têm participação menos relevante no investimento total dos projetos, respondendo por cerca de 30%, contra 60% anos atrás, e que alguns outros componentes têm maior fabricação no Brasil, como inversores e os "trackers"-- utilizados para permitir que as placas sigam o movimento do sol.