Por Nayara Figueiredo
SÃO PAULO (Reuters) - A expectativa de demanda elevada pelo farelo de soja do Brasil, após a quebra que se desenha na safra argentina, e o salto nos preços do subproduto em Chicago já colocam os prêmios para exportação de farelo brasileiro acima das expectativas iniciais, disse a Caramuru, uma das maiores empresas do setor.
O diretor Internacional e de Commodities da companhia, Weslley Sousa, afirmou à Reuters que à medida que as cotações sobem na Bolsa de Chicago, há uma tendência de correção no prêmio das exportações, o que beneficia produtores brasileiros como a Caramuru.
Em meados de fevereiro, os preços externos do farelo de soja tocaram uma máxima desde 2014, a 508,20 dólares/tonelada curta.
"Estimávamos que o contrato de maio/23, com referência porto de Paranaguá, estaria com um desconto e 12 dólares abaixo da cotação de Chicago, mas está apenas cerca de 5 dólares abaixo", disse o executivo.
Apesar de mais firme, o prêmio do farelo no Brasil ainda está negativo em relação a Chicago, enquanto na Argentina está positivo. Essa conjuntura beneficia produtores brasileiros, uma vez que deixa o farelo nacional mais competitivo frente ao argentino, cujo valor está mais alto para compradores em função do impacto da quebra de safra.
"Acreditamos que esse prêmio (no Brasil) pode ficar cada vez mais próximo da cotação de Chicago... estamos vendo um viés de alta para o prêmio... é uma tendência", acrescentou.
Ele explicou que a perspectiva de uma colheita recorde de soja brasileira tende a enfraquecer os valores de todo o complexo da oleaginosa --composto pelo grão, farelo e óleo--, mas os preços estão "comportados" e "nós já sentimos um suporte desses prêmios de farelo para o Brasil", em meio a este cenário de redução de oferta no país vizinho.
A Argentina é a maior exportadora global de óleo e farelo de soja, mas por efeito de uma severa estiagem pode colher menos de 33,5 milhões de toneladas do grão, reduzindo a capacidade de produção e exportação de seus subprodutos.
Dados da Bolsa de Cereais de Buenos Aires (BdeC) divulgados na véspera indicam que, se confirmada, está poderá ser a menor colheita do país desde a temporada de 2007/08, quando atingiu 32 milhões de toneladas. Na safra anterior, os argentinos produziram 43,3 milhões.
Com base em dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês), o diretor da Caramuru disse que a quebra na Argentina deve resultar em uma diminuição de 4 milhões a 5 milhões de toneladas na produção de farelo do país.
"Um impacto dessa magnitude na Argentina tende a trazer demandas extra para o Brasil", afirmou.
Incomum
O especialista sênior em Preços de Grãos e Oleaginosas na S&P Global Commodity Insights, José Roberto Gomes, ponderou que os prêmios para exportação de farelo na Argentina estão maiores que os do Brasil atualmente, algo incomum no mercado, devido à quebra de safra.
"O Brasil, geralmente, apresenta prêmios em níveis superiores aos da Argentina."
Segundo ele, em 1º de março, a Platts, que é parte da S&P Global, considerou o prêmio no Brasil para embarque em abril a 5 dólares por tonelada curta sobre o contrato para maio na Bolsa de Chicago.
"A título de comparação, os atuais prêmios spot no 'cargo market' (mercado de carga) de Up River, na Argentina, estão acima de 20 dólares por tonelada curta sobre os futuros em Chicago, provavelmente refletindo a safra menor e a lentidão nas vendas de produtores locais de soja", disse o especialista.
Interno x externo
O diretor da Caramuru acredita que um incremento na demanda internacional pelo farelo brasileiro virá, mas a capacidade de processamento do país tem uma certa estabilidade, o que não abre espaço para grandes aumentos de produção que poderia trazer alívio para consumidores no Brasil.
"Nós, Caramuru, olhamos mercado interno e exportação. Nosso mercado de carnes do Brasil está bem aquecido. Vai ter mais demanda? Com certeza vai", comentou.
"Vai acontecer uma briga entre o mercado doméstico e exportação", completou sobre a demanda por farelo de soja, que também é um dos principais componentes da indústria de carnes, como ração animal.
Segundo a associação nacional da óleos vegetais Abiove, que representa as tradings, a produção de farelo de soja no Brasil está estimada em 40,2 milhões de toneladas para 2023, com exportações de 20 milhões e consumo interno de 18,1 milhões.
No caso da Caramuru, Sousa disse que a empresa costuma trabalhar com muitos contratos de longo prazo no fornecimento de farelo. Segundo ele, nesta época do ano passado, os preços subiram muito em função da guerra na Ucrânia que impulsionou todas as commodities e os compradores chegaram a arrefecer.
Agora, ele contou que os fluxos de contratos estão mais ativos, em parte, por um retorno destes compradores e também pela relação com o cenário de baixa oferta na Argentina.
"Se a gente tivesse condição de ampliar o esmagamento, faríamos."
"Outro indicador que a gente pode falar que ainda não ocorreu, mas que vai ocorrer são os embarques de complementos, chamados de 'top off'", afirmou.
Trata-se de carregamentos para exportação iniciados na Argentina, mas que podem não conseguir completar o navio com farelo e venham ao Brasil para complementar a carga antes de seguir para o destino de embarque.
"Então, espera-se que esse 'top off' vá aumentar essa operação esse ano", frisou.