Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - Uma proposta em avaliação no Ministério de Minas e Energia que prevê um leilão neste ano para contratar térmicas a gás natural nas regiões Sudeste, Sul e Nordeste enfrentou críticas do Ministério da Fazenda e de órgãos técnicos do setor elétrico e poderá ser alvo de novos estudos, segundo documentos vistos pela Reuters.
O leilão foi fortemente defendido pelo ex-ministro Moreira Franco, ainda na administração Michel Temer, e pelo então presidente da estatal Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Reive Barros, nomeado para a secretaria de Energia Elétrica do Ministério de Minas e Energia pelo governo Bolsonaro.
Os defensores da ideia alegam que as usinas poderiam substituir térmicas a óleo, mais caras e poluentes, e dar vazão à produção de gás do pré-sal, além de contribuir para atender à demanda do sistema por potência, como em momentos de pico de consumo ou quando há redução na geração eólica ou solar.
Mas a proposta nunca chegou a ser uma unanimidade entre os especialistas em energia, e agora recebeu duras críticas da Secretaria de Acompanhamento Fiscal, Energia e Loteria do Ministério da Fazenda.
"A implementação da proposta... ensejará impacto tarifário a todos os consumidores de energia elétrica e desperta preocupações sobre aspectos concorrenciais", escreveu a secretaria em contribuição à consulta pública aberta pela pasta de Minas e Energia sobre o projeto de leilão.
Para os técnicos da Fazenda, a ideia de uma licitação por regiões e restrita a térmicas a gás, além de limitar a concorrência, iria contra os esforços nas últimas décadas para que o sistema elétrico se tornasse interligado, o que permite que usinas em uma região enviem energia para atender à demanda em outras localidades.
Eles também questionaram "a real necessidade de contratação" das térmicas, "uma vez que existe sobreoferta de energia elétrica constatada no setor".
O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), órgãos técnicos do setor, também levantaram pontos contrários à licitação, que Moreira Franco queria realizar ainda no primeiro quadrimestre de 2019.
O ONS defendeu que o governo aguarde o avanço de debates sobre uma proposta de reforma da regulamentação do setor elétrico e sobre o chamado Plano Decenal de Energia, que discute critérios para contratação de energia para atender à demanda por potência, antes de decidir sobre o leilão.
Assim como a Fazenda, o ONS também apontou que o sistema elétrico é "fortemente interligado", e argumentou ainda que o formato de contratação proposto pelo governo no leilão seria inadequado para usinas que visam atender à demanda de potência.
Já a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) também questionou o formato proposto, o chamado leilão de reserva, no qual o custo da energia é repassado aos consumidores por meio de encargos.
"A CCEE é contrária à contratação de térmicas via leilão de reserva, no formato apresentado", escreveu a instituição na consulta pública.
"Haveria tempo hábil para uma discussão mais aprofundada sobre o tema, permitindo eventualmente solução alternativa", afirmou a CCEE.
Procurado, o Ministério de Minas e Energia não comentou de imediato sobre a proposta de leilão e os posicionamentos apresentados na consulta pública.
MAIS ESTUDOS?
Após analisar as contribuições da consulta pública, técnicos do Ministério de Minas e Energia recomendaram maiores e mais amplas discussões técnicas sobre o leilão antes de uma tomada de decisão.
"A proposta de aprofundar os estudos atende parcialmente a este grande bloco de contribuições contrárias... ao permitir o desenho de uma modelagem tecnicamente mais robusta e a identificação de forma mais clara acerca da necessidade de potência e os riscos de, eventualmente, não se efetuar tal contratação", escreveram, em nota técnica.
Como a proposta era de que as usinas contratadas na licitação entrassem em operação em 2023, haveria tempo para aprofundar os debates, acrescentaram.
(Por Luciano Costa)